Jacob Rees-Mogg sempre foi ardente defensor da saída do Reino Unido da União Europeia. Tornou-se secretário de Estado das Oportunidades do Brexit e nunca, até esta semana, alguém o ouvira admitir que o corte com os parceiros europeus, a quase todos os níveis, pudesse ter causado qualquer constrangimento à vida do comum britânico. Mas causou.
As filas que se observam há dias para entrar no túnel do canal da Mancha, ligação terrestre das ilhas britânicas à Europa Continental, são produto direto do Brexit, que impôs muito mais verificações a mercadorias e passageiros, inexistentes até à consumação do divórcio.
Numa entrevista à rádio LBC, esta terça-feira, Rees-Mogg foi forçado a comentar duas frases suas, de 2018: “Não haverá quaisquer verificações em Dover” e “os atrasos serão em Calais, não em Dover”. Não parece ser essa a realidade.
O deputado admitiu que sim, “claro” que errou ao dizer o que disse mas continua a culpar Paris pelos atrasos. “O que eu queria dizer é que os únicos atrasos seriam causados pelos franceses se eles decidissem não permitir que os britânicos passassem livremente. E eles decidiram fazer isso”. Tais palavras podem parecer paradoxais na boca de quem justificou o Brexit com a necessidade de os países controlarem quem cruza as suas fronteiras.
“É MAIS DIVERTIDO, PORQUE OS PORTUGUESES QUEREM-NOS”
Insistindo que não estava a defender um boicote às férias dos britânicos em França, Rees-Mogg sugeriu que, em alternativa, os turistas tentassem viajar para Portugal. “É mais divertido, porque os portugueses querem-nos lá e os franceses estão a fazer-se difíceis. Por que razão haveríamos de gastar em França as nossa libras que nos custaram tanto a ganhar se eles não nos querem lá?”
As autoridades francesas operam do lado britânico do canal da Mancha porque foi assim que o controlo de fronteiras ficou estabelecido no Tratado de Tourquet, mas agora não chega aos britânicos mostrarem os passaportes para propósitos de identificação. É preciso também que eles sejam carimbados porque, após o Brexit, os britânicos têm 90 dias de permanência máxima num país da UE, logo, a data de entrada (em França, neste caso) tem de ficar inscrita no passaporte.
A estimativa oficial é que em vez de 48 segundos, o tempo médio de verificação por pessoa antes do Brexit, atravessar a fronteira demore 90 minutos.
As autoridades do porto de Dover emitiram um alerta de emergência no fim de semana de 22 a 24 de julho, depois de alguns passageiros terem reportado 21 horas de espera para acederem ao porto e daí seguir viagem para França. Nessa sexta-feira passaram pelo porto 11 mil carros, no sábado 12 mil, e no domingo 10 mil.
A situação normalizou-se segunda-feira, dia 25, mas os dois lados estão a preparar-se para novo caos em agosto. A autoridades portuárias francesas responderam às críticas dos britânicos dizendo que França não pode ser culpada pelas consequências do Brexit.
O diretor do porto de Dover, Doug Bannister, deu razão aos franceses dizendo, também na LBC, ser “absolutamente verdade” que a culpa dos atrasos se devia aos controlos impostos pelas novas regras que tornam os cidadãos britânicos juridicamente iguais a outros cidadãos de países extracomunitários. O que resulta, é claro, da decisão tomada pelo povo britânico no referendo de 23 de junho de 2016 e dos acordos subsequentes entre o seu Governo e a UE.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL