Há quem acredite que, depois de atribuída, a pensão não pode ser mexida. Na prática, não é assim: existem situações que levam à suspensão do pagamento e à exigência de devolução à Segurança Social de montantes recebidos indevidamente e, nos cenários mais graves (por fraude), a consequências administrativas e até penais.
Um dos casos que mais acontece é o do pensionista que retoma atividade profissional sem informar a Segurança Social, ou que exerce um trabalho incompatível com o tipo de pensão que recebe. Em algumas prestações, a acumulação é proibida; noutras, é possível, mas exige comunicação prévia e respeito por limites. Se isso não acontecer, podem surgir suspensões e pedidos de reposição.
Na pensão de velhice do regime geral, trabalhar depois de se aposentar é, em regra, permitido sem corte automático da pensão. Ainda assim, há exceções previstas na lei: não é acumulável a pensão de velhice resultante da conversão de uma pensão de invalidez absoluta; e, nos regimes de aposentação antecipada por “flexibilização”, há limitações específicas, nomeadamente quando o pensionista regressa a trabalho remunerado numa entidade do mesmo grupo, durante um período determinado.
Quando a acumulação é indevida, a devolução costuma aparecer
Em regimes especiais, como certas pensões da CGA, existem restrições ao exercício de funções públicas remuneradas. Quando essas regras são ignoradas, podem ocorrer suspensões e pedidos de reposição dos valores pagos.
Outro cenário típico é receber, ao mesmo tempo, uma pensão e outra prestação que seja incompatível. Um exemplo recorrente é a sobreposição com subsídio de desemprego, que gera reposição de montantes e correções retroativas.
A Segurança Social considera o subsídio de desemprego incompatível com a pensão de velhice. Quando deteta a sobreposição entre prestações, manda devolver o que foi pago a mais, com acerto dos valores.
Dados incorretos e fraude: aqui, as consequências agravam-se
Declarar informação errada, indicar anos de descontos que não existem ou apresentar rendimentos falsos para cumprir critérios de elegibilidade pode configurar fraude. Se isso for comprovado, além da devolução do que foi indevidamente recebido, podem surgir processos administrativos e até criminais.
Nas pensões por incapacidade/invalidez, as regras são mais apertadas. Voltar a exercer atividade incompatível com o grau de incapacidade declarado, ou omitir rendimentos e trabalho relevantes, permite rever ou cessar a pensão e exigir devoluções; e a ocultação de factos relevantes (como anos de descontos inexistentes ou rendimentos falsos) configura, além da reposição, infração grave.
Também há pagamentos indevidos por erro, como duplicações ou cálculos incorretos. Mesmo quando o lapso não é do beneficiário, a Segurança Social pode pedir a “reposição de prestações indevidas”, admitindo, conforme o caso, planos de pagamento e avaliação de boa-fé; regra geral não há juros de mora, salvo se a dívida entrar em cobrança coerciva.
Residência no estrangeiro e prova de vida: um detalhe que pode suspender tudo
Mudanças de residência para fora do país, sobretudo para fora da UE/EEE, implicam comunicações administrativas. Se essa informação não for comunicada, pode haver suspensão até regularização e, em alguns sistemas, podem existir cobranças retroativas.
Quem vive no estrangeiro continua, em regra, a poder receber a pensão, mas tem de cumprir a prova de vida anual, conforme for notificado. Em 2025, a obrigação aplicou-se desde logo a residentes na Suíça e no Luxemburgo: para quem não entregou a prova até 30 de novembro, o pagamento é suspenso a partir de janeiro de 2026.
Infelizmente, há situações em que familiares continuam a receber prestações depois do falecimento do titular. Quando isso é detetado, os valores são reclamados na totalidade e pode existir responsabilidade por burla; a regra base é simples: qualquer facto que influencie o direito ou o valor da pensão deve ser comunicado de imediato.
O que a Administração costuma fazer e como o pensionista se pode defender
As medidas mais comuns incluem suspensão do pagamento enquanto há averiguações, notificação para devolução de montantes indevidos, aplicação de juros e coimas e, nos casos mais graves, ação penal por fraude. Além do impacto financeiro, há consequências reputacionais e administrativas que podem complicar pedidos futuros.
Se receber uma notificação, tem direito a conhecer os fundamentos, consultar os cálculos e apresentar defesa. Os prazos vêm na notificação e tendem a ser curtos; deixar passar o prazo torna a defesa mais difícil ou mesmo inviável, sobretudo quando existem incompatibilidades complexas (como CGA ou invalidez), onde pode ser prudente apoio jurídico ou contabilístico.
Como reduzir o risco: prevenção, registos e resposta rápida
A forma mais segura de evitar problemas é prevenir: confirmar a situação na Segurança Social Direta, comunicar de imediato o início de atividade (por conta de outrem ou própria), rever prestações ativas e evitar acumulações proibidas. Guardar comprovativos e pedir confirmações por escrito ajuda a proteger uma pensão construída ao longo de décadas.
Se já houver um problema identificado, o caminho passa por contactar de imediato a Segurança Social, pedir o detalhamento do cálculo e tentar negociar um plano de pagamentos. Em muitos casos, quando o pagamento indevido resulta de erro administrativo ou de boa-fé, existem mecanismos de parcelamento ou redução.
Quando a soma reclamada é elevada ou existe suspeita de fraude, pode ser importante recorrer a um advogado de direito da Segurança Social ou a um técnico oficial de contas, que ajudem a estruturar a defesa, pedir perícias médicas quando aplicável e negociar com a Administração. A recomendação final mantém-se: comunicar sempre mudanças de atividade, residência ou qualquer facto relevante, guardar documentação e exigir confirmações por escrito.
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