Muitos portugueses que começaram a trabalhar antes de 2002 podem beneficiar de um mecanismo de cálculo da pensão muitas vezes esquecido. Trata‑se do regime P1/P2, que aplica duas parcelas: a P1, baseada nos 10 melhores de 15 anos até 2001, e a P2, que considera a carreira desde 2002. Em algumas situações, a P1 pode mesmo resultar num aumento do valor final na pensão de reforma.
Até aos anos 70, o sistema de proteção social era composto por múltiplas Caixas de Previdência. A partir dessa década e com a Lei de Bases de 1984, consolidou‑se o sistema público unificado. Alguns regimes profissionais mantiveram regras próprias, hoje enquadradas como regimes especiais.
O que é o P1/P2 e quem está abrangido
Para beneficiários inscritos até 31 de dezembro de 2001, a pensão é calculada somando duas parcelas, ponderadas pelos anos antes e depois de 2002:
P = (P1 × C3 + P2 × C4) / C
C3: anos de carreira com registo de remunerações até 31-12-2001
C4: anos de carreira a partir de 01-01-2002
C: total de anos da carreira com registo de remunerações (contam todos, mesmo que >40, para o peso; mas o cálculo das taxas usa no máximo 40)
Nota histórica: para pensões iniciadas até 31-12-2016 usava‑se a versão anterior da fórmula com C1/C2 (corte em 2006/2007). Desde 01-01-2017 usa‑se C3/C4 (corte em 2001/2002).
Como se calcula o P1 (os “10 melhores dos últimos 15”)
Remuneração de Referência do P1 (RR‑P1): RR‑P1 = R / 140, onde R é a soma das remunerações dos 10 anos com salários mais altos dentro dos últimos 15 anos da carreira até ao mês de início da pensão, já revalorizados (atualizados por portaria). Divide‑se por 140 por se contarem 14 meses × 10 anos.
Taxa global do P1: No P1 a taxa anual é 2% por ano, com mínimo 30% e máximo 80% (aplicada aos anos com registo de remunerações, no máximo 40).
Fórmula: P1 = RR‑P1 × Taxa Global P1.
Teto do P1: existe um limite superior: P1 não pode exceder 12 × IAS (com exceções previstas quando P2 ≥ P1 ou quando ambos > 12 × IAS, casos em que o limite não se aplica ou a pensão passa a ser calculada pelas regras do artigo 32.º).
Como se calcula o P2 (carreira completa, até 40 anos)
Remuneração de Referência do P2 (RR): RR = TR / (n × 14), onde TR é o total de remunerações anuais revalorizadas de toda a carreira, e n o número de anos com registo (máx. 40 para o cálculo).
Taxa global do P2 (regra regressiva 2,3%–2,0%)
Aplica‑se a tabela por escalões de IAS: quanto maior a RR, menor a taxa marginal (varia entre 2,3% e 2,0%, até 40 anos).
Fórmula: para ≥21 anos com registo, usam‑se os escalões do artigo 32.º; para ≤20 anos, usa‑se 2% × N.
Porque é que o P1/P2 pode ser vantajoso
O P1 olha para os 10 melhores anos dos últimos 15 (já revalorizados), o que pode elevar a RR‑P1 se tiver anos recentes ou antigos com remunerações altas. Depois, o resultado é proporcionado pelos anos até 2001 através de C3/C.
O P2 usa a carreira completa (até 40 anos) e uma taxa regressiva por escalões de IAS, que tende a suavizar valores quando a RR é elevada.
Revalorização das remunerações: conta todos os anos
Antes de calcular RR‑P1 e RR (P2), as remunerações de cada ano são atualizadas por coeficientes de revalorização publicados anualmente. Em 2025, esses coeficientes constam da Portaria n.º 83/2025/1 (com efeitos a 1 de janeiro de 2025).
Fator de sustentabilidade e outras regras
Depois de apurado o valor estatutário (P pela fórmula P1/P2), pode aplicar‑se o fator de sustentabilidade se a pensão for iniciada em regime de antecipação e o regime não estiver isento. A aplicação é no fim, ao montante estatutário.
Exemplo orientador (sem números absolutos)
Perfil: 38 anos de carreira; iniciou descontos antes de 2002; pensão em 2025.
Passos:
Atualizam‑se as remunerações ano a ano (coeficientes de revalorização).
P1: escolhem‑se os 10 melhores anos dentro dos últimos 15; calcula‑se RR‑P1 e aplica‑se a taxa global (2% × anos, min 30%, máx 80%).
P2: calcula‑se RR com toda a carreira (máx. 40 anos) e aplica‑se a tabela de 2,3%–2,0% em função dos escalões de IAS.
Combina‑se: P = (P1 × C3 + P2 × C4) / C (C3 = anos até 2001; C4 = anos desde 2002; C = total). Verifica‑se o teto dos 12 IAS para P1 e, se houver antecipação, o fator de sustentabilidade.
O que fazer para confirmar se beneficia
Consulte a carreira contributiva e simule a pensão no Simulador de Pensões da Segurança Social Direta. Se iniciou descontos antes de 2002, a simulação já contempla o P1/P2.
Se notar lacunas ou remunerações em falta, peça correção antes de submeter o pedido de pensão, porque a revalorização e as médias dependem desses registos.
Regimes especiais com contagens específicas
Para certas profissões, como profissionais da pesca, trabalhadores de minas ou inscritos marítimos, existem regras próprias de contabilização do tempo e acesso à reforma (por exemplo, contagem específica de dias de serviço na pesca e condições de acesso em idade inferior). Estas regras são setoriais e baseiam‑se em diplomas próprios.
Carreiras longas e idade pessoal
Independentemente do ano de início da carreira, a lei permite reduzir a idade de acesso através da idade pessoal: menos 4 meses por cada ano acima de 40 anos de descontos, sem poder baixar dos 60 anos. Não é uma “regra antiga”, mas sim a regra geral em vigor.
Os interessados devem consultar a carreira contributiva e, se existirem lacunas, pedir correção através da Segurança Social Direta ou junto do Centro Distrital. Nos casos abrangidos por regimes especiais, podem ser necessários registos setoriais específicos (por exemplo, pesca).
O que se pode traduzir em um aumento na pensão de reforma é o regime P1/P2 para quem iniciou descontos antes de 2002, e as regras especiais aplicáveis a determinadas profissões. Confirmar e regularizar os registos antigos pode fazer a diferença no valor final.
















