Passados 40 anos desde a adesão de Portugal e Espanha à então CEE, hoje União Europeia (UE), este é um momento oportuno para refletir sobre o estado atual da integração europeia e os desafios que se avizinham.
Criada após a 2ª Guerra Mundial, a UE teve como missão fundadora a prevenção de outro conflito devastador no espaço geográfico europeu. Ao longo dos seus 67 anos de existência, esse objetivo tem sido cumprido. A par da paz, destacam-se os ganhos em qualidade de vida, liberdade, diversidade cultural e resiliência económica no espaço comunitário. Ainda assim, é inegável a crescente inércia e atrofia estratégica por parte dos líderes europeus – uma crítica que pode, aliás, ser alargada ao conjunto da liderança ocidental.
Atualmente, a UE enfrenta uma panóplia de ameaças que colocam em risco a sua coesão e projeto comum. Entre elas, a mais premente é a ameaça russa. Esta não começou em 2022, com a invasão em larga escala da Ucrânia, mas sim em momentos anteriores: em 1999, com a ofensiva na Chechénia; em 2008, com a invasão da Geórgia; e em 2014, com a anexação ilegal da Crimeia e o início da guerra no Donbass. Desde há muito que Vladimir Putin tem vindo a contestar a ordem internacional estabelecida após a Guerra Fria. No seu discurso na Conferência de Segurança de Munique, em 2007, criticou abertamente a expansão da NATO para Leste e a ordem unipolar liderada pelos Estados Unidos. Esta visão revisionista, profundamente enraizada, foi moldada também pela sua experiência como agente do KGB em Dresden, na antiga RDA, durante a década de 1980, e pela humilhação que sentiu com o colapso da União Soviética. O Ocidente, contudo, preferiu ignorar os sinais, priorizando o acesso à energia russa a baixo custo — um dos piores erros estratégicos da UE desde a sua fundação
Em 2014, perante a violação do direito internacional, a resposta europeia limitou-se a aplicar sanções financeiras. Esse gesto tímido acabou por abrir caminho à escalada atual. A visão de Putin — marcada pelo ressentimento imperial — continua a alimentar a sua ambição de subjugar a Ucrânia. Neste contexto, não vislumbro uma paz duradoura a curto prazo, muito pelo contrário. Mesmo que se chegue a um acordo, dificilmente será eficaz: Putin não aceita outro desfecho que não a rendição de Kyiv, e o povo ucraniano não está disposto a ceder.
Mais importante do que aumentar os orçamentos de defesa, é essencial investir em capacidades certas. Não basta injetar milhares de milhões — é preciso planeamento estratégico, cooperação efetiva entre Estados-membros e aliados, e sobretudo, coragem política para redistribuir recursos, assumindo que outros setores terão de ceder lugar à prioridade da segurança. Mesmo assim, já vamos tarde. A construção de uma capacidade de defesa europeia robusta e interoperável levará anos, mas é um imperativo existencial.
Sem defesa, não há prosperidade. Não há paz social. Não há Europa. Apesar de tudo, continuo a acreditar na resiliência das instituições europeias. Ainda que devagar, o caminho está a ser feito — e, com lucidez e determinação, poderá ser cumprido.
Sobre o autor do artigo: António Valentim Domingos é licenciado em Ciência Política e Relações Internacionais e tem pós-graduação em Direito Internacional Humanitário e Direitos Humanos em situações de conflito; em Direito da Defesa Nacional; e em Direito da Proteção Civil. Frequentou um programa avançado em gestão de crises. Começou o seu percurso profissional no Estado-Maior General das Forças Armadas. Atualmente é consultor de Public Affairs numa agência de comunicação.

“40 Visões da Europa”
A 12 de junho de 1985, Espanha e Portugal assinaram o Tratado de Adesão às então Comunidades Europeias (Comunidade Económica Europeia, Comunidade Europeia da Energia Atómica e Comunidade Europeia do Carvão e do Aço). Este foi o terceiro alargamento.
O Europe Direct Algarve, a CCDR Algarve, a Eurocidade do Guadiana e outros parceiros transfronteiriços associaram-se para assinalar a data. A rubrica «40 Visões da Europa» vai dar voz a 40 pessoas (líderes políticos e associativos, jovens, cidadãos ,..)
Entre 4 de maio e 12 de junho (data da assinatura dos 40 anos do Tratado de Adesão) todos os dias um artigo . Mais informação sobre a campanha na página conjunta (4) Facebook
Leia também: 40 visões da Europa: Maio, Europa e Eu! | Por Bruno Alves

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