É na mesa da Páscoa que muitos doces tradicionais voltam a ganhar protagonismo. Em todo o país, o folar, os ovos de chocolate e os doces conventuais ganham espaço entre famílias reunidas e receitas passadas de geração em geração. No Algarve, não é diferente — a tradição gastronómica nesta época é rica e faz parte da identidade de muitas comunidades locais.
No coração da tradição pascal algarvia, há um doce que se destaca tanto pelo sabor como pela história. Associado à Semana Santa e profundamente enraizado na identidade local, este bolo foi eleito uma das 7 Maravilhas Doces de Portugal — um reconhecimento que veio consagrar o seu valor cultural e gastronómico. Ainda assim, continua a ser um segredo pouco conhecido fora da região.
Páscoa e tradição: a doçaria que une gerações
A Páscoa, para além do seu significado religioso, é também um momento de celebração em torno da mesa.
Em todo o país, multiplicam-se os doces típicos da época, que variam consoante as tradições regionais.
No Algarve, o folar ocupa um lugar de destaque, com versões doces e salgadas. Contudo, em Olhão, foi uma receita muito particular que ganhou destaque nacional: o folar de Olhão.
Trata-se de um bolo em espiral, com camadas alternadas de massa fofa e uma calda à base de açúcar e canela, cozido lentamente até caramelizar.
O resultado final é um folar húmido, denso e intensamente aromático, cuja preparação exige tempo, paciência e conhecimento transmitido entre gerações.
Um doce singular com origem familiar
O folar de Olhão tem raízes familiares e populares, sendo tradicionalmente preparado em casa durante a Semana Santa.
A sua origem exata é incerta, mas é consensual que terá evoluído a partir de receitas conventuais e caseiras adaptadas à realidade dos ingredientes disponíveis na região.
De acordo com o portal 7 Maravilhas de Portugal, o doce típico da Páscoa foi um dos vencedores da edição dedicada às “Maravilhas Doces”, em 2019, na categoria de doces de forno.
Segundo a Câmara Municipal de Olhão, o reconhecimento nacional trouxe nova visibilidade ao folar, que passou a integrar roteiros gastronómicos e feiras de produtos locais, reforçando o seu valor enquanto património imaterial.
Como citado pelo município em comunicado, “o folar de Olhão é símbolo da identidade da cidade e do saber-fazer tradicional algarvio”.
Reconhecimento nacional entre as 7 Maravilhas
A eleição do folar de Olhão, doce típico da Páscoa, como uma das 7 Maravilhas Doces de Portugal foi feita através de um processo competitivo, com votações do público e análise por parte de um júri técnico.
Entre centenas de candidaturas, o doce algarvio destacou-se não apenas pelo sabor, mas pela autenticidade e preservação do modo tradicional de confeção.
Segundo o site oficial do concurso 7maravilhas.pt, o folar foi descrito como “um exemplo da riqueza da doçaria regional portuguesa, onde a simplicidade dos ingredientes é elevada a excelência pela técnica artesanal”.
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O folar hoje: tradição que resiste
Apesar do reconhecimento, o folar de Olhão mantém-se fiel à sua origem. Ainda é comum encontrar este doce à venda em padarias e pastelarias locais, sobretudo no período da Páscoa.
Mas a receita continua a viver, acima de tudo, na intimidade das cozinhas familiares, onde o saber é passado de mães para filhas, de avós para netos.
Como nota a investigadora Paula Carvalho, citada pela publicação Algarve Informativo, “a perpetuação do folar de Olhão depende da capacidade da comunidade local em manter viva a sua confeção artesanal, mesmo em tempos de modernização alimentar”.
Receita tradicional e características do folar de folhas
O folar de Olhão, um dos doces da Páscoa algarvios mais conceituados, é reconhecido pela sua estrutura folhada em camadas e sabor aromático.
A receita base inclui farinha de trigo, fermento de padeiro, água e sal, enriquecidos com açúcar e gorduras (manteiga e/ou banha), além de ingredientes aromáticos típicos da região como sumo de laranja e uma dose de aguardente (frequentemente aguardente de medronho).
Ao contrário de outros folares portugueses, a massa deste bolo não leva ovos, resultando numa consistência única; em vez disso, leva especiarias como canela e raspas de limão para realçar o sabor. Depois de levedar, a massa é dividida e estendida em círculos achatados.
A montagem tradicional é feita dentro de um tacho ou forma cilíndrica untada: intercalam-se camadas de massa com generosas porções de manteiga, açúcar e canela polvilhada, repetindo o processo até encher a forma com cinco a oito camadas sobreposta.
Durante a cozedura em forno, o açúcar e a canela fundem-se com a manteiga, criando uma calda de caramelo que se entranha nas folhas de massa.
O resultado é um bolo de exterior dourado e ligeiramente pegajoso, com folhas caramelizadas que se separam facilmente.
O caramelo formado endurece apenas o suficiente para dar uma cobertura brilhante, sem perder a maciez interna – graças à calda, o interior do folar mantém-se húmido e fofo por vários dias após a confeção.
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