Entender a cultura portuguesa é conhecer e estudar as dinâmicas sociais que a influenciaram, encontro da História Cultural Sociologia da Cultura e das Artes.
Após a queda do Império Romano no século V, os bárbaros cristianizados administraram a parte ocidental a Europa, o que estará na origem da ideia ou conceito de “Ocidente”. O Imperio Romano do Oriente manteve-se cerca de mil anos tendo Constantinopla como centro político e religioso, as duas europas…
Os godos tomaram Roma, os gauleses de origem celta criaram a Gália, os visigodos avançaram sobre a Hispânia e estabeleceram uma monarquia electiva.
Durante o período visigótico permaneceram na Península formas de expressão litúrgica, que os concílios procuraram unificar e institucionalizar no “rito hispânico”, sobretudo apos a conversão de Recaredo e do concilio de Toledo de 589 d.C.
Em relação às origens medievais da música portuguesa, os documentos mais antigos versam música sacra transcrita no “scriptorium” dos conventos, não se conhecem, pelo escasso domínio da escrita na época, registos das expressões musicais com origens anteriores que certamente as populações romanizadas praticaram.
Para contornar interferências feudais, os conventos formaram entre si redes internacionais com direcção própria e autonomia, exerceram influência na vida religiosa e cultural através do ensino, do livro e das artes, em particular da música sacra.
Cluny, abadia beneditina francesa erigida no século X, manteve influência litúrgica a ocidente, a regra obrigava o canto de salmos, impulsionaram o canto gregoriano. Em Portugal da abadia de Alcobaça, cisterciense de orientação beneditina, saíram fórmulas rituais litúrgicas e expressões musicais rituais, nomeadamente o canto polifónico.
Nos salões reais e da aristocracia surgiram poesias musicadas por trovadores, as “cantigas de amor, de amigo e de escárnio e maldizer”, que podem ser estudadas em três Códices guardados, o Cancioneiro da Ajuda, do século XIII e anteriores, o da Biblioteca Nacional e o da Vaticana ambos com origem no século XV, transcritos no século seguinte.
A cultura popular ou plebeia expressava-se através dos jograis e segréis, estes poetas-músicos surgiam nas festas e feiras, nas cidades, vilas e aldeias, também eram convidados para actuar nos salões da realeza e casas aristocráticas. A bibliografia refere que D. Sancho I convidava para ocasiões festivas jograis famosos na época, nos manuscritos aparecem nomes, como os de Acompaniado e Bonamis e outros.
Numa época de intensa concorrência teológica e de práticas religiosas, não apenas entre monoteísmos, também entre as hierarquias e ordens da cristandade, a descoberta do túmulo de Santiago transformou a localidade do norte peninsular no grande centro de peregrinação medieval onde a polifonia foi uma das atracções.
No final do século XIV D. Fernando e a dinastia de Avis convidaram compositores e músicos estrangeiros, que reforçaram a divulgação das polifonias francesa e inglesa.
Foi então criada a Capela Real, D. Duarte define a sua organização, as funções foram distribuídas pelo Capelão-Mor, Mestre de Capela, Tenor e Mestre dos Moços.
A par da música polifónica, os cortejos reais eram acompanhados de fanfarras militares, música instrumental era tocada na corte, em bailes e arraiais.
Na Idade Média a música exerceu influência na vida quotidiana eclesiástica, palaciana, cortesã e comunitária. Nos séculos seguintes movimentos de ideias e estéticas emergem, o renascimento, maneirismo, barroco joanino, lírica italiana, nacionalismo romântico, modernismos, …
A musicologia recupera hoje do seu atraso, a música é um campo fértil para a investigação das origens e influências culturais, muçulmana, hebraica e outras, de expressões reconhecidas pela UNESCO, como fado, cante alentejano, …
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
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