Depois de longos meses com os aviões no chão e de avanços e recuos no confinamento dos passageiros devido à pandemia, as companhias aéreas mundiais vivem um novo pesadelo: a falta de trabalhadores, greves e os atrasos e cancelamentos de voos. Uma nova crise na aviação, que levantava voo este verão após dois anos de luta pela sobrevivência.
O caos nos aeroportos parece ter apanhado de surpresa as companhias aéreas, que, tudo aponta, terão dado um passo maior do que a perna nas ofertas de voos para o verão. E há um novo gigantesco problema a caminho: as indemnizações aos passageiros. A ponta do icebergue dessa dura realidade são os milhares de malas perdidas por vários aeroportos do mundo. Em Lisboa havia cerca de oito mil por entregar aos passageiros na passada terça-feira, um número confirmado ao Expresso por André Teives, presidente do Sindicato dos Técnicos de Handling de Aeroportos. São malas que, na sua maioria, resultam de atrasos e cancelamentos de voos com origem em outros aeroportos, ou seja, de aviões que chegam a Lisboa cheios de passageiros (muitos repescados de vários voos que não se fizeram) mas sem malas. Vai ser uma fatura pesada para as companhias, admitem fontes do sector. Além da indemnização por extravio das malas de porão — que poderá chegar até €1300 por unidade —, as companhias poderão ter de pagar também alojamento e alimentação. Nem todos os passageiros irão reclamar, mas a convicção dos profissionais do sector é de que os tribunais vão dar razão aos que reclamarem.
A questão das malas, a acumularem-se no terminal 1, vai levantar também problemas de espaço e logística, e já há trabalhadores da Groundforce a dar nota disso nas redes sociais. “Sendo o handling o principal responsável pela fluidez dos fluxos de passageiros e aeronaves, o aeroporto de Lisboa não tem condições para o nível de tráfego que tem há muitos anos. Não há espaço, não há organização, não há pessoal nas mais variadas valências operacionais”, sublinha André Teives. A ANA — Aeroportos de Portugal, por sua vez, afirma que “tem apoiado as companhias aéreas e respetivos handlers a encontrar soluções para o armazenamento temporário de bagagem, devido ao facto de muitos passageiros chegarem a Lisboa sem a respetiva bagagem”.
O último fim de semana foi dramático no Aeroporto Humberto Delgado em termos de cancelamentos e atrasos. Uma situação que se agravou depois de um incidente com um jato privado, na sexta-feira, que levou ao encerramento da pista durante quase duas horas e obrigou 25 voos a divergirem para outros aeroportos. A TAP não divulga números, mas a maioria dos voos cancelados era da transportadora portuguesa, dona de cerca de metade dos slots (faixas horárias para aterrar e levantar voo) do aeroporto da capital. A transportadora viu-se também penalizada pela retenção de aeronaves em aeroportos internacionais — fontes sindicais apontavam para 15 aviões —, muitas delas também paralisadas por greves e cancelamentos.
Falta de trabalhadores compromete o verão
As companhias aéreas lançaram ofertas semelhantes às de 2019, após duras reestruturações, sem garantir que conseguiam atrair os trabalhadores.
Aindústria da aviação está a enfrentar um gravíssimo problema de falta de mão de obra, e o assunto é tão sério que arrisca comprometer o verão deste ano. Durante a pandemia, as companhias despediram milhares de trabalhadores e não estão a conseguir atraí-los de novo, sobretudo nas áreas em que os salários são mais baixos.
A questão tornou-se visível, com a onda de cancelamentos de voos que assolou o sector nas últimas semanas. E põe a nu falhas de planeamento da operação de verão de uma grande parte das companhias mundiais. Problema a que se junta uma procura dos passageiros acima das expectativas e que só estava prevista para 2023.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL