Tão longa e diversa que é a história da minha vida!
Nasci no meio dos tomilhos, o que muita gente nem sabe o que é… essa pequena flor que nasce no meio do mato, junto aos rosmaninhos, onde as abelhas vão sugar mel, que para além de ser eficaz noutros fins, é bastante usado para fazer chá, milagroso quer para a dor de dentes, quer para tratar aftas! O quarto onde eu dormia com as minhas quatro irmãs, tinha aroma a tomilhos e era iluminado pela luz de um farol a quilómetros de distância.
De manhã, percorria o longo caminho até à escola, eu e tantos colegas de todas as classes. Eramos felizes! Estudávamos, aprendíamos e brincávamos muito: ao baile da roda, à cabra-cega, à boneca, ao lencinho queimado… e no regresso, fazíamos mais cinco quilómetros para regressar a casa… se as crianças de hoje soubessem como era bom brincar sem brinquedos! A alegria estava em nós, dentro de nós…
Eram tempos difíceis, não havia nada, ou melhor, havia falta de muita coisa.
Casei em 1948 com o amor da minha vida. Ele tinha carta de podador de amendoeiras e de oliveiras (tirada no Posto Agrário de Tavira), e trabalhava nessa arte, no entanto não tinha transporte para se deslocar. Os ganhos eram muito poucos, não havia consumismo, primava o instinto de sobrevivência aliado à gratidão por tudo o que se alcançava. E como é que naquela altura, arranjaríamos dinheiro para comprar, por exemplo, uma bicicleta? A sorte é que morávamos no campo e toda a gente criava galinhas. Foi quando eu tive uma boa ideia: “se temos um vizinho que tem uma bicicleta a pedal à venda por 250$00, então eu vendo umas galinhas e tu marido vais comprar a bicicleta ao vizinho”. Ele ficou todo contente porque assim já tinha transporte para ir trabalhar. De podador a guarda-fios, ele sempre trabalhou muito, por este país fora… e eu? Sempre ao seu lado, com os nossos dois filhos, fiz de tudo: trabalhei no campo, fui cabeleireira, tive uma mercearia e uma pastelaria… fomos cúmplices companheiros, toda a vida!
Hoje em dia, as pessoas queixam-se das dificuldades da vida, sem saberem como eram as coisas naquele tempo: não haviam empregos, não havia dinheiro, não havia nada… eram tempos mesmo muito difíceis… mas eramos felizes!
Agora que há tudo, as pessoas até “gozam”, até se fez moda das calças rotas. Naquele tempo quem tinha um buraco na roupa ia pôr um remendo… hoje tentam remendar a vida e não conseguem…
Ainda bem que tudo mudou para melhor.
Caçadores de Histórias
É uma história de amor e de resilência vividos em tempos difíceis, em cumplicidade com a alegria de viver. Maria Pinto tem 93 anos de idade e persiste, como que um ritual se tratasse, em escrever “estórias” no seu diário que a mantém lúcida e ativa. HDF
Se tiver histórias de vida, do quotidiano, suas ou de pessoas que conheça, atreva-se. Este espaço é seu.
Escreva e envie-nos os seus textos para: jornalpostal@gmail.com