Ao longo dos séculos, muitas cidades desempenharam papéis inesperados na história de Portugal. Algumas foram palco de batalhas decisivas, outras serviram de abrigo a figuras importantes, e há até outras que acabaram por assumir temporariamente o papel de capital de Portugal. Uma dessas cidades, pouco lembrada nesse contexto, situa-se em pleno Oceano Atlântico e teve um papel determinante em dois momentos críticos da nossa história.
Mais do que Lisboa: outras capitais portuguesas
A primeira cidade a assumir o título de capital foi Guimarães, berço da nacionalidade. Seguiram-se Coimbra, Lisboa, o Rio de Janeiro e, por duas vezes, Angra do Heroísmo. Esta última destacou-se durante dois períodos históricos decisivos: o domínio filipino e a Guerra Civil entre absolutistas e liberais.
Apesar de hoje ser apenas uma cidade açoriana, o seu passado revela bem mais do que aparenta.
Um porto que ligava continentes
Angra do Heroísmo começou a ganhar importância logo no século XV, graças ao seu porto natural, que se tornou ponto obrigatório de escala para as rotas comerciais entre a Europa e as colónias portuguesas em África, na Índia e no Brasil, refere a VortexMag.
Essa relevância manteve-se até ao século XIX, altura em que surgiram os barcos a vapor e novas rotas de navegação.
Elevada a vila em 1471, Angra foi a primeira cidade europeia do Atlântico, título atribuído em 1584, no auge dos Descobrimentos Portugueses. O dinamismo cultural e comercial que a cidade vivia refletia-se numa sociedade em plena transição da Idade Média para a Idade Moderna.
Sempre ligada ao Império
A ligação de Angra ao império português foi constante, acolhendo expedições, apoiando monarcas e tornando-se um ponto estratégico na defesa da independência e da organização política do país. Durante o século XVIII, foi capital da Província dos Açores e sede do Governo-Geral, posição que manteve até 1832.
Reconstrução após o terramoto e a UNESCO
De acordo com a mesma fonte, o terramoto de 1 de janeiro de 1980 abalou profundamente Angra do Heroísmo, obrigando a obras de reconstrução e proteção do seu património. Três anos depois, a 7 de dezembro de 1983, a sua zona central foi classificada pela UNESCO como Património Mundial da Humanidade, tornando-se a primeira cidade portuguesa a receber tal distinção.
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Darwin, Garrett e os Açores
A cidade também desempenhou um papel simbólico e político importante ao longo do século XIX. Recebeu, por exemplo, Almeida Garrett durante a Guerra Peninsular e, em 1836, acolheu Charles Darwin, que aqui desembarcou a bordo do navio “HMS Beagle”. Inicialmente desvalorizou a biodiversidade da ilha, mas viria a reconhecer a importância da sua flora, pedindo amostras a cientistas britânicos, refere a fonte supracitada.
Primeira vez como capital de Portugal
Angra do Heroísmo foi capital de Portugal pela primeira vez entre 5 de agosto de 1580 e 5 de agosto de 1582, durante o curto governo de D. António, Prior do Crato. A cidade manteve-se leal à coroa portuguesa, resistindo ao domínio de Filipe II de Espanha. Em reconhecimento, foi-lhe atribuído o título de “Sempre leal cidade” por D. João IV, após a restauração da independência em 1640.
Segunda vez, em pleno século XIX
Durante o século XIX, Angra voltou a estar no centro da política nacional. A 15 de março de 1830, foi novamente proclamada capital do Reino de Portugal. Foi a partir daqui que D. Pedro IV organizou a expedição militar que desembarcaria no Mindelo, dando início à vitória liberal na guerra civil.
Em Angra, D. Pedro promulgou leis fundamentais para o liberalismo português, como a abolição de impostos feudais, a reorganização do exército e a reforma do ensino, diz ainda a VortexMag. A cidade tornou-se um verdadeiro bastião do movimento liberal e da causa constitucionalista.
Distinção pela rainha
Como forma de agradecimento, a rainha D. Maria II distinguiu Angra do Heroísmo com o título de “mui nobre, leal e sempre constante cidade”, e atribuiu-lhe a insígnia da Ordem Militar da Torre e Espada. Foi também em Angra que, em 1831, se realizou a primeira eleição camarária do país, após a reforma administrativa imposta pelo regime constitucional.
Um passado com peso no presente
Angra do Heroísmo é, por isso, uma cidade com um passado que vai muito além do seu presente insular. Com dois momentos como capital de Portugal e um legado ligado à liberdade e à independência, continua a ser um marco incontornável da história nacional.
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