Em 2017, um processo de concessão de cidadania por naturalização foi travado por decisão da população de uma vila do centro da Europa, depois de os residentes considerarem que a candidata não demonstrava afinidade com os costumes locais. Apesar de estar fixada na região desde tenra idade, as suas posições públicas sobre práticas culturais geraram resistência à sua integração formal como cidadã, impedindo a atribuição da cidadania.
Nancy Holten, com 42 anos, viu o seu pedido de cidadania ser rejeitado pela segunda vez. A decisão foi tomada ao abrigo de um sistema que permite à população local pronunciar-se sobre os candidatos à nacionalidade, tendo resultado num parecer desfavorável.
As suas acções foram particularmente criticadas pelos habitantes da vila de Gipf-Oberfrick, no cantão de Argóvia, na Suíça. Algumas intervenções públicas foram interpretadas como contrárias ao espírito comunitário e desrespeitosas das tradições locais.
Comunidades locais têm palavra decisiva na Suíça
Ao contrário de outros países, onde a naturalização depende apenas de decisões administrativas a nível nacional, na Suíça o processo decorre em três etapas: a nível federal, cantonal e comunal, sendo esta última muitas vezes determinante. Mesmo cumprindo os requisitos legais, como tempo de residência, proficiência linguística ou integração cívica, o candidato à cidadania pode ver o seu pedido recusado se a comunidade onde vive não o considerar suficientemente integrado.
Cada município suíço tem autonomia para definir os seus próprios critérios de naturalização, dentro dos limites da lei cantonal e federal. Em muitas localidades, cabe a um comité municipal (ou até a um painel de residentes) avaliar o grau de envolvimento do candidato na vida comunitária. Esta estrutura reflecte a tradição suíça de democracia directa, onde os cidadãos têm um papel activo em decisões locais.
Este modelo levanta, no entanto, críticas e preocupações com decisões potencialmente subjectivas, que podem basear-se em factores pessoais e não apenas em critérios objectivos. Casos como o de Nancy Holten tornaram-se mediáticos precisamente por expor os limites desta abordagem.
Campanhas de defesa animal motivaram desconforto na comunidade
A requerente tornou-se conhecida por campanhas relacionadas com o bem-estar animal. Entre as práticas que contestou encontram-se o uso de chocalhos nas vacas, o toque dos sinos das igrejas e eventos com animais em celebrações locais. De acordo com Nancy, os sinos utilizados no gado são demasiado pesados e emitem ruído excessivo, o que considera prejudicial para os animais.
Comunidade invoca falta de integração cultural
Tanja Suter, o então representante da secção local do Partido Popular Suíço, afirmou à imprensa local que a rejeição não se deveu ao conteúdo das causas defendidas, mas à forma como Nancy se expressava publicamente. “Há também cidadãos suíços que defendem os animais, mas para merecer o passaporte é preciso demonstrar boa vontade. Não queremos dar-lhe este presente se ela nos aborrece e não respeita as nossas tradições”, declarou.
Acrescentou ainda que a requerente se destacou negativamente pelo tom das suas declarações e pela visibilidade que deu às suas críticas na comunicação social.
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Administração local refere exposição mediática
A administração da freguesia indicou que a decisão teve por base, sobretudo, a projeção pública das opiniões da candidata, mais do que as causas que defende.
Recorde-se que o processo de cidadania na Suíça exige, além de residência prolongada, uma avaliação positiva da integração local por parte da comunidade.
O caso foi amplamente noticiado na altura e voltou a circular nos meios de comunicação europeus algum tempo depois, reacendendo o debate sobre os critérios de integração e o papel das comunidades locais na concessão de cidadania.
“Esta é verdadeiramente a minha casa”, afirmou Nancy Holten
Em entrevista ao jornal The Local, Nancy Holten afirmou que se sentia profundamente ligada ao país onde cresceu. “Esta é verdadeiramente a minha casa. Cresci aqui e sinto-me muito ligada a este lugar”, declarou.
Quanto às críticas que motivaram a rejeição, esclareceu: “Muitas pessoas acham que estou a atacar as suas tradições. Mas não era essa a intenção. O que me motivou foi o bem-estar dos animais.”
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