Com a chegada das férias da Páscoa e a expetativa de mais um verão com multidões, cresce novamente o descontentamento em várias regiões de Espanha face ao turismo de massas. Os residentes acusam as autoridades de não fazerem o suficiente para limitar os efeitos negativos do excesso de turistas, e organizam-se para protestos em várias ilhas e cidades, nomeadamente Tenerife. Saiba agora mais neste artigo.
Recorde de visitantes em 2024
No verão passado, Espanha recebeu mais de 90 milhões de visitantes estrangeiros — um número recorde. E, segundo previsões da consultora Braintrust, este valor poderá ultrapassar os 115 milhões até 2040. Para muitos espanhóis, este aumento está a transformar a vida local de forma preocupante.
Preocupações dos habitantes
Habitantes de várias zonas denunciam que o turismo em excesso está a sobrecarregar os serviços públicos, a provocar poluição, a tornar a habitação inacessível e a alterar profundamente os bairros tradicionais. A resposta do governo é considerada lenta e insuficiente, segundo a Euronews.
Em Maiorca, foi realizada uma manifestação para 5 de abril com o lema “Acabemos com o negócio da habitação”. Os organizadores acusam hoteleiros, políticos e investidores de serem os principais responsáveis pela crise de habitação e pelo colapso do ecossistema. “Imploramos aos turistas que não venham. São a fonte dos nossos problemas”, escreveram numa carta aberta.
Também nas Canárias, a tensão está a crescer. Os trabalhadores da hotelaria ameaçam entrar em greve durante a Páscoa, exigindo melhores salários. Os sindicatos CCOO e UGT pedem um aumento de 7,75% ou um pagamento único, para compensar a subida do custo de vida. De acordo com dados oficiais, mais de 33% da população das Canárias vive em risco de pobreza ou exclusão social — uma das taxas mais altas do país.
Situação habitacional crítica
A situação habitacional está particularmente crítica. Em Tenerife, há pessoas a viver em carros ou em grutas, sem conseguir pagar rendas. No ano passado, alguns residentes fizeram até greves de fome contra novos hotéis previstos para a ilha.
“Não temos nada contra os turistas individuais, mas a indústria está a crescer de forma descontrolada, usando tantos recursos que a ilha já não consegue suportar”, afirmou Ivan Cerdena Molina, um dos líderes dos protestos em Tenerife. Para ele, plataformas como Airbnb ou Booking.com são “um cancro que está a consumir a ilha pouco a pouco”.
Outras regiões como Barcelona, Madrid e Sevilha também enfrentam problemas semelhantes. Em Barcelona, a câmara municipal planeia eliminar todas as licenças de alojamento turístico até 2028, mantendo o número atual limitado a cerca de 10 mil unidades.
Recomendamos: As ‘Maldivas portuguesas’: espanhóis estão rendidos ao parque de campismo desta ilha algarvia
O governo anunciou novas medidas
O governo espanhol anunciou recentemente novas medidas, incluindo um imposto de 100% sobre imóveis comprados por cidadãos de fora da União Europeia. No entanto, os críticos consideram estas ações insuficientes. Em protesto, ativistas em Tenerife vandalizaram dezenas de carros de aluguer e ameaçam agora manifestações nos aeroportos.
A indignação generalizada levou à criação de redes de ativismo entre países do sul da Europa. No próximo mês, grupos de Espanha, Portugal, Itália e França vão reunir-se em Barcelona para discutir formas de travar o turismo descontrolado e proteger as comunidades locais.
Uma dessas organizações é o movimento Menys Turisme, Més Vida, com base em Maiorca. O grupo promete intensificar os protestos no verão de 2025 e insiste que o turismo excessivo contribui para a expulsão dos residentes, a subida do custo de vida e a destruição ambiental.
O fenómeno não é novo
Este não é um fenómeno novo. Já em 2014 houve manifestações em várias ilhas contra a exploração de petróleo nas costas de Lanzarote e Fuerteventura. Agora, com o agravamento da crise habitacional, as vozes contra o turismo de massas voltam a ouvir-se com mais força.
Em Málaga, no início de abril, dezenas de milhares de pessoas saíram à rua numa manifestação histórica, exigindo um novo modelo turístico e mais regulação sobre os alojamentos de curta duração. O autarca da cidade, após dias de silêncio, veio reconhecer que a situação exige medidas firmes e urgentes.
A luta turismo vs sustentabilidade
Enquanto isso, a opinião pública começa a mudar. Embora o turismo seja essencial para a economia espanhola, cresce a consciência de que o atual modelo pode ser insustentável, se não forem adotadas soluções que também protejam os habitantes e o ambiente.
Carta aberta contra os turistas em Maiorca
“Maiorca não é o paraíso que vos estão a vender”, lê-se no título da carta aberta. Avança o Correio da Manhã que esta carta trata-se de uma denúncia sobre os problemas decorrentes do aumento do turismo nesta ilha, com impacto no ecossistema, na deterioração dos serviços públicos, na gentrificação e no aumento do custo de vida.
Habitantes estão “fartos” dos turistas
Agora que se aproxima a época alta e a chegada de muitos turistas a Palma de Maiorca, estas sete organizações ambientalistas dizem que “a população local está farta e já não somos hospitaleiros, porque estão a destruir a terra que amamos; e muitos moradores têm de emigrar porque a ilha tornou-se inabitável”.
Leia também: Conheça o arroz muito consumido em Portugal que é o mais contaminado por agrotóxicos