Num contexto em que cada vez mais países procuram modernizar os seus sistemas de pagamento e reduzir o impacto ambiental associado ao uso de numerário, algumas moedas começam a perder espaço no dia-a-dia dos cidadãos. Entre elas, as de 1 e 2 cêntimos têm vindo a ser alvo de debate em várias nações europeias, com opiniões divididas quanto à sua utilidade e necessidade de manutenção em circulação. Mas há um país da União Europeia (UE) que vai acabar com as moedas ‘pretas’.
A decisão da Lituânia
A Lituânia decidiu avançar com a eliminação gradual das moedas ‘pretas’, de 1 e 2 cêntimos, a partir de maio. A medida foi aprovada pelo parlamento lituano em março e faz parte de um plano mais alargado para simplificar os pagamentos em dinheiro e melhorar a eficiência do sistema monetário.
Além da vertente prática, o objetivo passa também por reduzir o impacto ambiental associado à produção e à distribuição das moedas ‘pretas’, que, na maioria dos casos, acabam por se acumular nas carteiras ou gavetas, sem retorno ao mercado. A medida incide apenas sobre transações em numerário. Nestes casos, o total da compra será arredondado para o múltiplo de 5 ou 10 cêntimos mais próximo, de forma a dispensar o uso das moedas mais pequenas.
Um problema que vai além do bolso
De acordo com o Banco da Lituânia, estima-se que, anualmente, cerca de um terço de um milhão de euros em moedas de 1 e 2 cêntimos se percam, ficando fora de circulação. Essas moedas tornam-se, assim, economicamente inúteis e logisticamente dispendiosas, refere a Executive Digest.
Ao mesmo tempo, o banco central reconhece que, apesar de o seu valor ser reduzido, estas moedas ainda são necessárias para dar troco em muitos pontos de venda. No entanto, a sua manutenção representa um custo significativo, tanto em termos financeiros como ambientais. As autoridades esperam que a mudança ajude a racionalizar o sistema monetário e torne as transações mais práticas para comerciantes e consumidores.
Os desafios do arredondamento
Rimantas Mažulis, responsável pela empresa Strong Point, especializada em soluções de pagamento e gestão de caixas, alerta para os desafios que a medida poderá trazer no curto prazo. Segundo Mažulis, a aplicação do arredondamento não será simples em todos os contextos, especialmente quando se tratam de vendas com descontos, promoções ou pagamentos em prestações.
A complexidade da alteração exigirá ajustes nos sistemas de faturação e registo de pagamentos, o que poderá representar custos adicionais para os comerciantes.
Ajustes e expectativas
Apesar dos desafios iniciais, Mažulis considera que os benefícios da medida serão evidentes a médio e longo prazo. A redução do tempo necessário para efetuar pagamentos e a menor dependência de moedas ‘pequenas ‘pretas’ trarão vantagens operacionais e maior simplicidade nos processos de venda.
“Apesar dos desafios iniciais, a mudança permitirá simplificar os processos de pagamento e reduzir a quantidade de moedas pequenas em circulação, o que, em última análise, beneficia tanto comerciantes como consumidores”, sublinha.
As alterações deverão refletir-se também na contabilidade das empresas, que passarão a lidar com menos trocos, simplificando o fecho de caixa diário.
Uma tendência que se espalha pela Europa
A Lituânia não está sozinha nesta iniciativa. Sete países da zona euro já tomaram decisões semelhantes, eliminando gradualmente a emissão das moedas ‘pretas’, mais concretamente de 1 e 2 cêntimos e adotando o arredondamento em transações em dinheiro.
Entre esses países estão os Países Baixos, Bélgica, Finlândia, Irlanda, Itália, Eslováquia e Estónia. Nestes casos, o valor final das compras em dinheiro é automaticamente arredondado, dispensando o uso das moedas mais pequenas.
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Apoio generalizado mas com exceções
Uma pesquisa recente da Comissão Europeia revelou que 61% dos cidadãos da União Europeia estão a favor da eliminação das moedas de 1 e 2 cêntimos. Este número revela uma tendência crescente para aceitar soluções que simplifiquem os pagamentos. Contudo, essa aceitação não é uniforme em toda a Europa. Nos países do sul, a resistência à medida é mais acentuada, e a discussão está longe de ser consensual.
Os países mais reticentes
Em Espanha, por exemplo, apenas metade da população se mostra favorável à eliminação das moedas pequenas. A tradição e o hábito de utilizar numerário em transações diárias continuam a pesar na opinião pública.
Na Grécia e em Chipre, a oposição é ainda mais significativa. Nestes países, a maioria dos cidadãos não concorda com a retirada das moedas de 1 e 2 cêntimos, considerando-as ainda úteis para pagamentos exatos. Esta divisão evidencia que a mudança, embora desejada por alguns, terá de ser gerida com sensibilidade e comunicação clara.
Fora da zona euro: outras experiências
Fora do espaço da moeda única, há já vários países que adotaram o sistema de arredondamento com sucesso. Suécia, Noruega, Dinamarca, Canadá e Austrália são alguns exemplos de nações onde as moedas de valor muito reduzido deixaram de circular. Nesses países, as transações em numerário foram ajustadas sem grandes perturbações, provando que é possível adaptar os hábitos de consumo e simplificar o sistema monetário.
O caso italiano
Em Itália, a eliminação das moedas de 1 e 2 cêntimos teve início em 2018. A experiência mostrou que a implementação do arredondamento pode ser eficaz, mas os responsáveis alertam para a necessidade de um acordo europeu mais amplo.
A ausência de uma política comum pode gerar confusão, especialmente junto de turistas, que, ao viajarem entre países com práticas diferentes, se deparam com realidades contraditórias.
Caminho para o futuro?
A discussão sobre a utilidade destas moedas está longe de ser nova. Muitos economistas e entidades bancárias já defenderam que os custos de produção superam o seu valor real, tanto em termos financeiros como ambientais.
As moedas de cobre exigem matérias-primas, energia e logística para serem colocadas em circulação, contribuindo assim para uma pegada ecológica significativa. A eliminação destas moedas poderá ser mais do que uma medida económica: pode representar também um passo em direção a uma economia mais sustentável e adaptada às novas realidades de consumo.
Uma mudança inevitável?
Com cada vez mais transações feitas por cartão ou por meios digitais, o uso de dinheiro físico está a diminuir em muitos países. Neste cenário, manter moedas de valor tão baixo pode parecer um anacronismo. Ainda assim, há quem defenda que a existência de moedas pequenas garante precisão nos pagamentos e evita arredondamentos que, em larga escala, podem ser desfavoráveis aos consumidores.
Por agora, a Lituânia dá o passo seguinte. Resta saber se os restantes países europeus seguirão o mesmo caminho ou se continuarão a resistir à mudança. Seja como for, a discussão está lançada e o futuro das moedas de cêntimos será, sem dúvida, um dos temas a acompanhar nos próximos anos.
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