As pensões são um direito conquistado, mas também implicam deveres e condições específicas que muitos beneficiários desconhecem. Entre elas, está a obrigação de manter residência continuada em território nacional. Quando essa regra é quebrada, as consequências podem ser severas, como demonstra um recente caso julgado na Catalunha, que envolveu um reformado que perdeu o direito à pensão.
O Tribunal Superior de Justiça da Catalunha confirmou a decisão da Segurança Social que determinou a suspensão da pensão não contributiva de reforma de um homem refomado que esteve fora de Espanha mais de 90 dias sem comunicar a ausência. Além de perder o direito à pensão, o beneficiário terá de devolver 10.361,52 euros recebidos indevidamente. Segundo a sentença, a lei estabelece que ausências prolongadas do território nacional, superiores a 90 dias por ano, fazem perder o direito à pensão não contributiva de velhice, salvo motivo devidamente justificado, de acordo com o jornal digital espanhol Noticias Trabajo.
Este caso teve início quando o Departamento de Ação Social e Família da Generalitat da Catalunha recebeu uma comunicação da Polícia Nacional. O documento dava conta de que um titular de pensão não contributiva poderia estar ausente do país há vários meses, como é caso deste reformado. Ao analisar o passaporte, a administração confirmou que o mesmo, de nacionalidade marroquina, tinha permanecido fora de Espanha durante mais de 90 dias, principalmente em viagens ao seu país de origem, Marrocos.
Residência continuada é uma exigência legal
Perante esta verificação, a Segurança Social aplicou o disposto no artigo 10.º, n.º 2 do Real Decreto 357/1991, que regula as prestações não contributivas. Esta norma prevê que a residência continuada se considera interrompida quando as ausências do território espanhol ultrapassam 90 dias num mesmo ano natural. Deste modo, o organismo procedeu à suspensão da pensão e exigiu a devolução de 10.361,52 euros por pagamentos indevidos.
Recurso não convenceu o tribunal
O reformado apresentou uma reclamação, alegando que não devia perder o direito à pensão, de acordo com a fonte anteriormente citada. No entanto, a sua contestação foi rejeitada, com o argumento de que as ausências superiores a 90 dias quebram a continuidade da residência exigida por lei.
Insatisfeito, decidiu recorrer aos tribunais. Ainda assim, o Tribunal Superior de Justiça da Catalunha manteve a decisão da administração, salientando que “não foi alegado qualquer motivo que justifique as ausências do território nacional durante um período superior a noventa dias”.
109 dias fora de Espanha
A prova apresentada revelou que o reformado esteve ausente durante 109 dias entre dezembro de 2017 e agosto de 2018, ou seja, 19 dias acima do limite permitido para manter a pensão. O tribunal considerou assim correta a atuação da Generalitat ao extinguir a pensão e ordenar a restituição dos montantes recebidos de forma indevida.
Dever de comunicação e exceções
A sentença sublinha ainda que o problema não foi apenas a duração da ausência, mas também a falta de comunicação às autoridades, refere a mesma fonte. A administração recorda que é sempre obrigatório informar a Segurança Social de qualquer deslocação prolongada. Em situações de força maior, como motivos de saúde, cuidados familiares ou emergências, a ausência pode ser justificada, desde que comunicada e devidamente comprovada.
Este tipo de restrição é válido apenas para as pensões não contributivas, atribuídas a pessoas com baixos rendimentos e sem historial de descontos suficientes para aceder a uma pensão contributiva, refere o Noticias Trabajo. Quem recebe uma pensão contributiva de reforma não é afetado por esta limitação, já que o direito decorre das contribuições feitas ao longo da vida laboral.
Um caso que serve de exemplo
A decisão do Tribunal Superior de Justiça da Catalunha mantém-se bastante atual, uma vez que funciona como aviso a todos os beneficiários de prestações não contributivas. Estar ausente do país mais de 90 dias por ano sem comunicar à Segurança Social pode significar não só a perda do direito à pensão, como também a obrigação de devolver todas as quantias recebidas durante o período de ausência, como é caso deste reformado.
E se acontecesse em Portugal?
Em Portugal, uma situação semelhante seria avaliada com base no tipo de prestação recebida. Nas pensões não contributivas, como a pensão social de velhice, e nas prestações complementares, como o Complemento Solidário para Idosos (CSI), existe uma exigência de residência efetiva em território nacional, bem como a obrigação de comunicar qualquer ausência prolongada. Estes benefícios destinam-se a quem vive em Portugal e tem baixos rendimentos, pelo que a residência contínua é um dos principais requisitos para manter o direito às prestações.
No caso da pensão social de velhice, regulada pelo Decreto-Lei n.º 464/80, a lei portuguesa não define um limite de dias concreto de ausência, como acontece em Espanha com o prazo de 90 dias. Contudo, a perda da condição de residente ou a impossibilidade de comprovar residência efetiva pode levar à suspensão ou extinção da pensão. O objetivo é garantir que o apoio é concedido apenas a quem vive de forma permanente no país e não a quem passa longos períodos no estrangeiro.
Caso do Complemento Solidário para Idosos (CSI)
Já no caso do (CSI), a regra é mais clara. O Decreto-Regulamentar n.º 3/2006, alterado pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2017, exige que o beneficiário resida em Portugal durante pelo menos 270 dias por ano civil. Na prática, isto significa que ausências superiores a cerca de 95 dias podem conduzir à suspensão do pagamento e, em casos de incumprimento prolongado, à extinção do direito. Esta norma visa assegurar que o apoio é prestado apenas a quem tem efetiva ligação ao território nacional.
Dever de comunicação à Segurança Social
Além do requisito de residência, os beneficiários têm o dever de comunicar à Segurança Social qualquer alteração que possa afetar a atribuição ou manutenção do benefício, como uma mudança de residência ou uma ausência prolongada. Se o beneficiário não cumprir esta obrigação, a Segurança Social pode exigir a devolução das quantias recebidas indevidamente e, em certos casos, aplicar coimas por falsas declarações ou omissões.
O procedimento habitual, caso se detete uma ausência longa, passa por uma verificação administrativa, seguida da audição do beneficiário, que pode apresentar justificações ou provas de residência. Dependendo do resultado, a Segurança Social decide entre manter o pagamento, suspender temporariamente até nova prova de residência, ou extinguir o direito à prestação. Se houver pagamentos indevidos, é iniciado um processo de restituição de valores.
Nas pensões contributivas, a situação é diferente. Quem recebe uma pensão resultante dos seus descontos pode residir no estrangeiro sem perder o direito à prestação, desde que cumpra as regras de prova de vida e mantenha o contacto com a Segurança Social. Assim, se o caso espanhol tivesse ocorrido em Portugal, as consequências seriam semelhantes apenas para pensões não contributivas ou complementos sociais, onde a residência efetiva e o cumprimento do limite de 270 dias em território nacional são determinantes para a manutenção do benefício.
















