O “grande nível de comunicação e interoperabilidade” verificado na comunidade nefrológica é, para Anabela Rodrigues, a chave que explica o percurso de sucesso na proteção dos doentes renais crónicos durante a crise sanitária. Pela particular fragilidade que caracteriza este grupo, foi necessário criar planos de contingência nas clínicas de diálise, alterar a organização do transporte para os centros e, sobretudo, colocar estes doentes na lista prioritária para a vacinação contra a covid-19. “Foi um percurso penoso, mas muito construtivo”, diz.
A presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento da Diálise (CNAD) – que participou no debate “Pandemia covid-19 e diálise”, promovido hoje pela Anadial com o apoio do Expresso e integrado no ciclo “Repensar a Saúde” – acredita, por isso, que os resultados alcançados devem ser motivo de orgulho para o país. E que resultados foram conquistados? Ana Galvão, especialista em nefrologia, apresentou números sobre a incidência da infeção por covid-19 e da letalidade da doença entre doentes em hemodiálise, que considera “relativamente baixos”. A comparação faz-se com países como Espanha: enquanto Portugal registou uma letalidade de 12,5%, a nação vizinha chegou aos 23%. “Acho que o facto de termos agido muito precocemente preveniu e atenuou muito o efeito da covid-19 nos doentes renais”, analisa.
Embora os participantes no debate concordem que o desempenho português foi, neste campo, positivo, alertam para desafios que ainda persistem, como a recuperação do número de transplantes renais realizados em 2020 – foram reduzidos em 23,5% em relação a 2019. “Era normal que isso acontecesse, uma vez que as unidades de cuidados intensivos acabaram por estar dedicadas ao tratamento de doentes com covid e houve uma redução no número de dadores”, acrescenta a médica do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra (CHUC). No entanto, reforça, “estamos no bom caminho”.
Conheça as principais conclusões do debate que juntou Anabela Rodrigues (CNAD), Ana Galvão (CHUC), Fernando Macário (Diaverum) e Pedro Simas (virologista):
Ensinamentos para o futuro
- ♦ Além da capacidade de comunicação entre serviços e instituições, assim como da partilha de dados atualizados diariamente, os especialistas destacam a continuidade dos tratamentos renais como um dos maiores sucessos nesta crise pandémica. Na abertura do evento, o presidente da Anadial, Jaime Tavares, disse considerar que “o sector demonstrou uma resiliência extraordinária”.
- ♦ Fernando Macário, responsável clínico da Diaverum, defende que é necessário repensar a estrutura organizacional dos cuidados médicos para que, numa eventual pandemia futura, seja possível manter o atendimento em todas as áreas da saúde. “O doente em diálise não morre da doença renal, morre por causa de outro tipo de complicações cardiovasculares e infeções respiratórias. É preciso garantir que esse acompanhamento pode ser feito”, diz.
- ♦ A melhoria de cuidados médicos, acredita Anabela Rodrigues, deve passar, no futuro, por uma crescente individualização dos tratamentos e alargá-los o mais possível ao domicílio dos doentes. “Estou segura de que estamos capazes, todos juntos, de dar esse passo”, afirma.
Terceira dose da vacinação
- ♦ Por integrarem os grupos de risco, os doentes renais crónicos poderão ser chamados a tomar a terceira dose da vacina contra a covid-19, de forma a reforçar a imunidade. “Acho prudente que se dê uma terceira dose, especialmente a pessoas acima dos 70 anos, e que se faça isso em paralelo com a vacina da gripe”, apela o virologista Pedro Simas.
- ♦ “No primeiro país que fez a terceira dose a todos os doentes em diálise, que foi a França, pudemos observar um aumento de parte da imunidade”, contextualiza Fernando Macário, que diz não ter a certeza sobre se este é o caminho a seguir, embora reconheça: “Pela lógica, pode proteger alguns doentes excecionalmente mais vulneráveis”.
As declarações dos protagonistas do debate “Pandemia covid-19 e diálise”, promovido pela Anadial com o apoio do Expresso
“Ainda antes do estado de pandemia já os centros de hemodiálise estavam a elaborar planos de contingência”, conta Ana Galvão, nefrologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC)
“Lidámos bem com a crise nas unidades de hemodiálise”, assegura Anabela Rodrigues, presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento da Diálise (CNAD)
“Foram feitos todos os esforços”, refere Aníbal Ferreira, Presidente da Sociedade Portuguesa de Nefrologia
“A quebra global foi de 24%” esclarece Fernando Macário, chief medical officer da Diaverum
“Temos a expectativa de já este ano, ou no próximo, atingirmos os números de 2019”, refere Jaime Tavares, presidente da Anadial
“Só nos últimos três meses tivemos metade dos casos que tivemos ao longo da pandemia” lembra Paulo Morgado, presidente da ARS Algarve
“A terapia de substituição renal é muito bem feita e está muito bem organizada em Portugal”, diz Pedro Simas, virologista e investigador do Instituto de Medicina Molecular (IMM)
“Os níveis de resposta aos nossos doentes foram muito bem conseguidos”, assegura Rui Alves, presidente do Encontro Renal
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