De 6 a 9, eis como os comentadores do Expresso avaliam os dois candidatos a primeiro-ministro nas eleições de 30 de janeiro. Veja os comentários e confira quem dá vitória a quem
Clara Ferreira Alves
António Costa 7 – Rui Rio 9
António Costa sacou da manga todos os truques de experiência feita e tentou sem sucesso apanhar Rio em contradições e maléficas intenções. O problema é que Rio não lhe deu vulnerabilidades e, problema maior, Rui Rio não é da clássica direita que o PS tenta e sabe atacar com gosto. Tanto na Segurança Social como na questão do SNS deixar de ser tendencialmente gratuito no programa do PSD, Costa não venceu a sinceridade com que Rio traçou o diagnóstico e apontou as curas do programa social-democrata para os males de dois sistemas em crise inegável. Podemos não acreditar nessas curas, ou no grupo de pessoas que as executarão, os ocultos “ministeriáveis” de Rio, mas os argumentos do chefe do PSD foram bem esgrimidos. E com vigor.
Costa quis colar Rio a um programa de direita que não existe nem é muito distinto do PS pós-geringonça com Costa a primeiro-ministro. Rio não tem bravatas ideológicas, Costa teve-as em 2015 por causa das necessidades de poder e de ter de agradar e ceder ao BE e ao PCP.
Dito isto, estes dois têm tudo para se entenderem e só a soberba de António Costa lhe permite dizer ou eu ou o dilúvio. O país sou eu? Não é, e estes debates têm provado que já não é. Seguirá um caminho perigoso se entregar o país ao vazio de uma demissão sua por motivos narcisistas e pessoais. O exemplo Medina, eu ganhei primeiro votem depois em mim, deveria estar presente nas cabeças socialistas.
A direita reconstitui-se e reconstitui-se civilizadamente, sem extremismos e sem derivas ultras à Chicago boys ou populismos e aventuras. Isso devemos a Rui Rio. Centrou o debate ao centro. Não tem sido fácil. Nem sempre tem acertado, mas tem melhorado. A esquerda do PS dirigido por Costa é centrista e, também, civilizada. Repete-se: estes dois têm tudo para se entenderem e o país ganhará com o diálogo. PS e PAN não são o futuro nem o que querem os eleitores.
Rui Rio aguentou os embates e os truques de António Costa e conseguiu responder taco a taco e com convicção em todas as questões. Jogou limpo e jogou bem, tendo vencido o debate. Não recorreu a truques nem aos exemplos de passados fracassos governativos e de ministros perigosos e incómodos, e mostrou a faceta da sua personalidade que é o maior trunfo, a convicção destituída de cinismo ou de untuosidade. Atacou bem a estagnação de anos de governo socialista e entrou bem no debate com a questão das alianças e negociações pós-eleitorais, onde demonstrou que Costa é evasivo e está disposto a deixar o país ingovernável se não ganhar as eleições. Uma posição pouco patriótica. A recriação de uma nova maioria de esquerda com outros protagonistas, como Rio alertou, apanhou Costa no vazio da onda de auto-jubilação do seu discurso.
A melhor argumento de Rui Rio foi a demonstração de que os resultados dos supostos triunfos de Costa estão à vista, mediocridade produtiva, emigração da chamada “geração mais qualificada de sempre”, baixos salários, estatização opressiva da economia, péssimos serviços públicos apesar do aumento de funcionários, e o pensamento mágico do Orçamento de 2022. Mais a tradicional cauda da Europa.
No caso da TAP, Costa foi frouxo e Rio ganhou com um exemplo demagógico e singularizado que não deveria ter sido suficiente. Costa não conseguiu responder nem defender o ataque.
No fim, fora do debate, Costa tentou recuperar da derrota, mas chamar perigoso a Rui Rio não cola. E citar Cavaco também não. Costa perdeu esta noite. Perdeu votos? Talvez. A soberba é um pecado mortal. E escolher maus ministros é outro. O povo tem memória.
Daniel Oliveira
António Costa 7 – Rui Rio 6
Rui Rio tem a tese de que as eleições não se ganham, perdem-se. Por isso fez-se de morto em todos os debates anteriores. Só que quando se está a 9% ou 10% de um adversário a rondar os 40% essa estratégia deixa de funcionar. Até porque a dinâmica a vitória é a única forma de abater essa diferença. Hoje não esteve morto.
A política de alianças e governabilidade foi o momento de vitória clara de Rio. Aproveitou a falta de clareza de Costa, que fecha as portas à esquerda e ao PSD. Uma autosuficiência evidente quando Costa exibe o Orçamento de Estado de 2022, como se ele fosse independente dos dos resultados das eleições. E quando resolve tudo com um absurdo apelo ao voto no PAN, que também se ofereceu para entendimentos com o PSD. O taticismo absoluto de Costa é que o trama.
Mas quando se chega às políticas é que Rio é mesmo claro. E só quem nao tem noção do país em que vive é que o imagina a marcar muitos pontos, apesar de alguns desenvoltura discursiva que lhe tinha faltado até aqui – também acharam que tinha vencido há dois anos.
Rui Rio continua a acreditar que o aumento do Salário Mínimo Nacional é responsável pela redução do salário médio. As pessoas que tiveram este aumento ouviram-no. Promete concentrar o alívio fiscal no IRC, As pessoas que pagam IRS, que carregam todo o fardo fiscal, ouviram. Costa esteve bem, aliás, a recordar o histórico do PSD em promessas fiscais e a desmontar a aldrabices da carga fiscal, que inclui o aumento dos descontos da segurança social por boas razões.
Quando se chegou à saúde, percebeu-se que nem Rio nem Costa têm resposta para a falta de médicos de família. Mas o momento mais forte foi ficar claro que a proposta de revisão constitucional do PSD quer acabar com o SNS tendencialmente gratuito para a classe média. Não há outra leitura para o que ali está escrito. E a classe média ouviu. Costa insiste, no entanto, em manter-se em negação em relação ao estado atual do SNS. E os seus utentes também ouviram.
António Costa não foi especialmente eficaz a defender o seu legado, mas foi, em temas muito caros às pessoas, eficaz a demonstrar os perigos de um PSD que não está ao centro, como jura. Ou seja, dirigiu-se à maioria sociológica de esquerda. Basta Costa tirar Rio do centro para vencer. Porque o seu legado no governo é conhecido e dá-lhe maioria.
Henrique Monteiro
Rui Rio 6 – António Costa 5
Numa análise rápida, Rui Rio falou para o futuro a médio prazo e Costa limitou-se a defender a sua ação no passado. Para Costa, o país está claramente no bom caminho; para Rio, ao contrário, o país vai numa direção errada. Naturalmente, a perceção das pessoas parece estar mais próxima do que diz Rio.
O primeiro ministro ainda em funções é um especialista em debates e confrontos políticos, seria pois estranho que se deixasse vencer de modo fácil.
Mas Rio pareceu bem preparado sobretudo nos temas que dizem mais respeito à economia e às finanças bem como aqueles que remeteram para a Saúde. Costa foi um pouco demagogo em matéria de Justiça, embora em outros aspetos do debate tenha conseguido equilibrar bastante a prestação.
Mas há um ponto fundamental: este debate não foi decisivo nem será decisivo na escolha dos portugueses, não só porque nenhum candidato esmagou o outro ou o venceu por KO, mas porque nestes mais de 15 dias que faltam para as eleições e com a pandemia a dominar o panorama mediático e social, muita coisa pode acontecer, muito pode ainda mudar.
O facto de dar a vitória a Rio é pura e simplesmente porque nos pedem que digamos quem ganhou o frente a frente.
Paulo Baldaia
Rui Rio 8 – António Costa 6
O debate serviu os propósitos de Rui Rio que precisava de mostrar que tinha uma alternativa verdadeiramente diferenciadora, a começar pelo modelo económico e passando pelos serviços públicos. António Costa esteve muito preso ao orçamento que foi rejeitado no Parlamento, conseguiu estar melhor na Justiça mas foi bastante menos eficaz que o líder do PSD na maioria dos temas que tiveram a debater. Já depois do debate ter terminado, o líder do PS sentiu necessidade de controlar os danos, disponibilizando-se para uma longa conferência de imprensa.
Rio procurou assustar o eleitorado do centro com a possibilidade de o país acabar por ter um governo liderado por Pedro Nuno Santos, com uma viragem ainda mais à esquerda e Costa fez o mesmo com a alteração constitucional que o PSD quer fazer na Saúde, que pode levar a que a classe média passe a pagar mais pelo SNS. Rio foi também muito eficaz no final ao falar da solução para a TAP, como companhia de bandeira, que cobra menos a espanhóis do que a portugueses para chegar a São Francisco.
Até parece que o ar mais displicente de Rio nos últimos debates foi estratégico para chegar a este debate e surpreeender pela assertividade.
Luis Aguiar-Conraria
António Costa 7 – Rui Rio 7
Um bom debate ao centro, com ambos os contendores a defender políticas centristas, que deu empate. Fica bastante claro que o que verdadeiramente distingue um partido do outro é a sua política de alianças. As alianças do PSD puxam-no para a direita e as do PS para a esquerda.
Em primeiro, um elogio. Neste momento, é bastante claro o que cada partido fará em cada um dos cenários possíveis de composição da A.R. Parabéns aos jornalistas que conseguiram tornar clara a questão das alianças. Apenas falta perceber se Rui Rio considera a hipótese de ter o PAN numa solução governativa.
De resto, uma discussão viva, tensa aqui ou ali, mas cordial. Na minha opinião, Costa esteve melhor na questão da Justiça. Rui Rio dar a garantia que não partidarizá os Conselhos Superiores não serve de nada. Mesme que acreditemos, nada nos garante que os políticos seguintes não o farão. Para se reduzir a independência da Justiça tem de se explicar muito melhor. Na questão da TAP, Rio não esteve formalmente bem — a questão do bilhete é uma mistificação –, mas a verdade é que o seu desabafo é o de muitos portugueses. Terá ganhado em emoção.
Na saúde, Costa esteve bem ao acusar o PSD de abrir a porta para que a classe média pagasse pela saúde. Rio bem ao lembrar que mais de 4 milhões de portugueses já pagam, dado que têm algum tipo de seguro de saúde.
Sobre o salário mínimo versus salário médio, tal como sobre se se deve baixar primeiro o IRC ou o IRS, cada um convenceu os que já estavam convencidos.
Uma nota final para os jornalistas. O debate estava vivo e os candidatos iam respondendo um ao outro, mas a verdade é que, regra geral, estavam a responder às perguntas que lhes eram feitas. Sendo assim, não se justificavam tantas interrupções.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL