Na manhã de domingo, 26 de outubro, a Alemanha acordou com uma imagem que há décadas não se via tão cedo: neve a cair em várias regiões, até aos 700 metros de altitude. As temperaturas desceram para valores próximos de zero, os campos amanheceram gelados e o vapor do hálito denunciava o frio fora de época. O episódio, em pleno outono, despertou a curiosidade dos meteorologistas e levantou uma questão inevitável: estaremos perante um sinal de que o inverno de 2025-2026 será excecionalmente rigoroso?
De acordo com o site especializado em meteorologia, Meteored, a chegada antecipada da neve pode alterar o equilíbrio térmico da atmosfera. Quando o solo arrefece e o primeiro manto branco se instala, a energia dissipa-se mais depressa e formam-se camadas de ar seco e frio que tendem a persistir. Estes fenómenos costumam marcar o início de um ciclo de arrefecimento prolongado e, em certos casos, antecedem invernos severos.
As engrenagens do frio
Por trás deste episódio invulgar há um conjunto de fatores que pode ajudar a explicar o fenómeno. O vórtice polar, situado sobre o Ártico, mostra sinais de fraqueza mais cedo do que o habitual. Quando esse sistema se desorganiza, o ar gélido do norte desloca-se com maior facilidade para a Europa Central.
Em simultâneo, a cobertura de neve na Eurásia está a expandir-se a um ritmo invulgarmente rápido. Esta superfície gelada atua como um enorme espelho térmico, refletindo radiação e intensificando o frio. Tal alteração pode influenciar os sistemas de pressão e modificar o percurso das massas de ar que chegam ao continente.
As circulações tropicais também desempenham um papel relevante. Segundo a mesma fonte, a atual fase fraca de La Niña tende a favorecer o transporte de ar frio para oeste e sul criando um padrão atmosférico que no passado antecedeu vários invernos particularmente frios.
Portugal corre riscos?
A influência Atlântica e a posição geográfica conferem ao clima português uma resiliência relativamente maior face a eventos prolongados de frio ártico. Isso significa que, mesmo que a Europa Central experimente um período gelado mais persistente, o país dificilmente terá uma réplica idêntica em termos de extensão e duração.
Contudo existem exceções regionais. O interior do Norte e Centro e as áreas de serra como a Serra da Estrela podem registar episódios de neve e geadas mais intensas quando massas de ar frio atingem a Península Ibérica. Nessas zonas a ocorrência de neve em cotas médias e geadas generalizadas é uma possibilidade real durante ondas de frio severas.
Em termos práticos para a maioria da população continental o risco imediato de um inverno prolongado e extremo é menor do que para a Europa Central mas não é nulo. A variabilidade sazonal e a possibilidade de episódios temporários de frio exigem vigilância sobretudo em setores como transportes e agricultura.
Frio precoce não garante inverno extremo
Ainda assim, os especialistas alertam que um início precoce não significa por si só um inverno de recordes. Uma queda de neve isolada pode resultar apenas de uma combinação pontual de condições atmosféricas. A chave está na capacidade da atmosfera manter esta configuração durante as próximas semanas.
Se o vórtice polar continuar enfraquecido, se a cobertura de neve na Eurásia aumentar e se as zonas de alta pressão sobre o norte da Europa se consolidarem, a probabilidade de um inverno prolongado e frio cresce consideravelmente. Caso contrário, o cenário poderá alternar entre curtos períodos de gelo e fases de descongelação, um comportamento típico de anos de transição.
Modelos apontam para geadas prolongadas
As previsões a longo prazo começam, contudo, a desenhar uma tendência. Na Europa Central, as projeções indicam anomalias negativas de temperatura especialmente na viragem do ano. Isto significa maior probabilidade de geadas persistentes e de nevões regulares.
Os modelos atmosféricos sugerem ainda um bloqueio dos ventos de oeste geralmente mais suaves. Se um anticiclone se instalar sobre a Escandinávia ou a Rússia poderá impor-se um fluxo de ar seco e gélido proveniente de leste a configuração clássica de um inverno rigoroso.
Um prenúncio gelado
Para que se confirme um inverno verdadeiramente marcante será necessário que vários fatores coincidam: o enfraquecimento contínuo do vórtice polar, a persistência da neve na Eurásia, bloqueios nas circulações atlânticas e humidade suficiente para gerar precipitação em forma de neve. Quando essas condições se conjugam instalam-se noites e dias consecutivamente gelados com mantos de neve que resistem semanas nas planícies.
Segundo a Meteored, o episódio de 26 de outubro poderá ter sido o primeiro aviso de que a atmosfera começou a mudar de comportamento, entrando lentamente em modo de congelação. Já o Instituto Português do Mar e da Atmosfera antecipa, para já, temperaturas acima do normal nas próximas semanas em Portugal continental, o que afasta por enquanto o risco de uma vaga de frio prolongada.
Ainda é cedo para falar num inverno do século, mas os sinais, como o vórtice polar enfraquecido, a neve precoce e as zonas de alta pressão mais estáveis, sugerem que a estação fria poderá ser mais intensa do que o habitual.















