Num mundo cada vez mais marcado por pequenas atitudes que geram grandes debates, até os gestos mais simples podem transformar-se em fenómenos virais e provocar discussões acesas sobre costumes e expectativas sociais. A forma como valorizamos o trabalho dos outros, em especial no setor dos serviços, continua a ser um tema sensível e muitas vezes polémico, principalmente quando envolve dinheiro e perceções de respeito. Neste caso, uma gorjeta deixada num restaurante espanhol fez furor nas redes sociais.
O episódio que está a agitar as redes sociais em Espanha começou num restaurante, quando um cliente, depois de pagar uma conta de 173,90 euros, decidiu deixar apenas dez cêntimos de gorjeta. Junto com a moeda, escreveu ainda no talão a mensagem: “Tudo muito bom, muito bom serviço, fique com o troco”.
A imagem do recibo, partilhada pelo perfil Soy Camarero, rapidamente se tornou viral e desencadeou milhares de reações sobre o que significa, ou não, deixar gorjeta.
O criador de conteúdo, conhecido por divulgar histórias do mundo da restauração, explicou que recebeu a fotografia diretamente e manteve o texto original, de acordo com o site especializado em economia e negócios Executive Digest. Apesar da repercussão, fez questão de contextualizar: “Antes de mais nada, é uma publicação que me foi enviada com este mesmo texto. Penso que a gorjeta é opcional e, independentemente do valor, é sempre bem-vinda.”
Uma gorjeta que valeu uma discussão nacional
A diferença entre os quase 174 euros pagos e os dez cêntimos deixados, correspondentes a menos de 0,1% do total, não passou despercebida aos utilizadores da rede X (antigo Twitter). Muitos classificaram o gesto como ofensivo e desrespeitoso, argumentando que uma gratificação tão simbólica, acompanhada de elogios ao serviço, mais parece uma ironia.
Outros, porém, defenderam que a gorjeta não deve ser encarada como uma obrigação, sobretudo num contexto económico marcado pela inflação e pelo aumento generalizado dos preços.
“Em Espanha não se dá gorjeta. Que te pague o teu empregador, porque o meu salário é tão miserável como o teu”, escreveu um internauta. Outro comentário bastante partilhado reforçou a mesma ideia, de acordo com a mesma fonte: “Para deixar isso, mais vale não deixar nada. Já se fala em tornar a gorjeta obrigatória, o que seria um erro, porque os preços já estão suficientemente altos.”

Um hábito que está a mudar
O caso trouxe à superfície uma questão mais ampla: a forma como os espanhóis lidam com as gorjetas. Durante décadas, o costume era deixar pequenas quantias em dinheiro como sinal de apreço pelo serviço.
No entanto, a popularização dos pagamentos com cartão, especialmente após a pandemia, reduziu drasticamente a frequência com que isso acontece. Para muitos consumidores, a gorjeta passou a ser vista como uma escolha pessoal e não como um dever social.
Insatisfação com os salários
Além disso, o debate reflete também a insatisfação crescente com os salários no setor da restauração. Muitos trabalhadores argumentam que depender de gorjetas para completar o rendimento mensal é injusto e que a responsabilidade de garantir um salário digno deve recair sobre os empregadores, refere a fonte anteriormente citada.
Polémicas que não param de surgir
Este caso não é isolado. Poucos dias antes, outro episódio já tinha provocado indignação nas redes sociais. O influenciador Cenando con Pablo denunciou que, num restaurante localizado no Estádio Santiago Bernabéu, em Madrid, a propina sugerida de 8% aparecia no talão com o mesmo destaque gráfico do preço final da refeição.
“Isto é muito feio, sinceramente. É uma artimanha, porque está no mesmo tamanho de letra que o valor total. Vou ser mal-educado porque, assim como digo palavrões quando algo me agrada, também o faço quando algo me incomoda: isto é uma porcaria. Não se pode fazer isto. Tenho sérias dúvidas de que todas as mesas sejam informadas sobre essa propina sugerida”, criticou o colaborador do El HuffPost, citado pela mesma fonte.
Entre a gratidão e a obrigação
A polémica em torno dos dez cêntimos revela uma divisão de opiniões cada vez mais clara. De um lado, quem vê na gorjeta um sinal de respeito e reconhecimento pelo serviço prestado no restaurante. Do outro, quem acredita que a sua ausência, ou um valor simbólico, não deve ser motivo de julgamento, já que o pagamento da conta cobre o que foi consumido, de acordo com a Executive Digest.
Enquanto isso, restaurantes e clientes continuam a navegar por este terreno delicado, onde a linha entre cortesia e obrigação se torna cada vez mais ténue. Uma coisa é certa: em tempos de redes sociais, até os gestos mais pequenos podem transformar-se em grandes debates.
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