O Montado é um sistema produtivo. Combina árvores que produzem cortiça e lenha, com pastagem onde se produzem animais”, realça André Oliveira, investigador do MED da Universidade de Évora.
“Por ter um uso extensivo das pastagens, pela diversidade de vegetação, e pela presença de pequenas manchas de mato junto a pedras e ribeiros, o Montado é também refúgio de uma intensa vida animal silvestre. Alguns destes animais são os répteis, pouco atraentes, mas muito importantes no equilíbrio do ecossistema”, continua a explicar André Oliveira que integra a equipa do Projeto LIFE Scrubsnet.
O investigador recorda que, “quando pensamos em anfíbios e répteis, pensamos em animais repugnantes, que poderiam muito bem desaparecer do planeta. Esta associação é sustentada por diversas histórias, criadas ao longo dos tempos, e que infelizmente têm levado à perseguição e morte destes animais”.
Para desmistificar este investigador lança o desafio convidando a descobrir “a verdade por detrás destas crenças e redescubra a beleza e importância dos anfíbios e répteis” recorrendo a cinco aspetos que considera serem fundamentais, a saber:
1. As salamandras que nascem do fogo…
Antigamente as pessoas acreditavam que as salamandras-de-pintas-amarelas nasciam do fogo, porque viam os animais a saírem das fogueiras.
O que acontece é que os troncos caídos e madeira morta costumam reter mais humidade, onde as salamandras gostam de se refugiar, para se protegerem das temperaturas baixas. Quando essa madeira é colocada a arder, os animais fogem do calor e saem da fogueira.
As salamandras, tal como os restantes anfíbios, nascem e crescem na ou próximo da água, enquanto larvas e girinos, e são conhecidos como animais de vida dupla (aquática e terrestre).
2. Os sapos urinam para os olhos para nos cegar?
No Alentejo, é comum dizer-se que não se deve tocar ou aproximar de um sapo porque este pode lançar líquido diretamente para os olhos.
Os anfíbios, de uma maneira geral, acumulam água em bolsas no interior do corpo, como reserva para o tempo mais seco.
A água não é apenas importante para a sua reprodução, como também para completarem a respiração através da pele. Porém, na presença de um possível predador, os sapos libertam parte da água acumulada no seu corpo para aliviar peso e conseguirem fugir mais facilmente. Não têm intenção de nos atingir, apenas de se protegerem.
3. Se o licranço visse e a víbora ouvisse, não havia ninguém que lhes resistisse!
Esta é uma frase comum, quando se fala de répteis. O licranço, a cobra-cega do Alentejo, é um lagarto sem patas que vive a maior parte da vida em galerias subterrâneas, alimentando-se de formigas e minhocas. Tem fraca visão, porque tem escamas a cobrir os olhos e porque vive na escuridão, mas consegue distinguir luz e sombra. Não deita qualquer tipo de substância tóxica, apenas uma mordida “forte”, típica dos lagartos.
Já a víbora, tal como todas as serpentes, tem uma audição fraca, sendo uma das características que as distingue dos lagartos, a ausência de tímpanos. Embora consiga detetar vibrações no solo usando o corpo, não é através da audição que conseguem encontrar as suas presas. Fá-lo pela captação pela sua língua bifurcada, dos odores deixados por outros animais.
4. Todos os lagartos e cobras são peçonhentos e venenosos?
Ao contrário dos anfíbios, a generalidade dos répteis não produz qualquer tipo de substância tóxica na pele. As osgas, por exemplo, são conhecidas como das espécies mais venenosas em Portugal, o que não é verdade.
Não constituem qualquer problema para o ser humano, antes pelo contrário, pois controlam as populações de insectos que podem ser prejudiciais, por transmitirem doenças.
No nosso país, existem apenas quatro espécies de serpentes com veneno: víbora-cornuda, víbora de Seoane, cobra-rateira e cobra-de-capuz. São raras as entradas no hospital por mordidas de serpentes venenosas, inferiores até ao número de casos de ataques por cães.
Mesmo as víboras, cujo veneno pode ser mais forte, não constituem um perigo elevado para o ser humano, apenas é preciso mais cuidado com crianças e idosos, que têm um sistema imunitário mais frágil.
5. Seres fantásticos que devemos proteger
Os anfíbios e répteis são dos grupos mais ameaçados do planeta e o nosso país não é excepção. Desde a destruição dos seus habitats, passando pela poluição das águas com pesticidas e outros produtos químicos, a mortalidade por atropelamento, mas também a perseguição popular devido aos mitos a eles associados.
Mas são animais que desempenham um papel muito importante nos nossos ecossistemas: ajudam a controlar as populações das suas presas, que podem trazer prejuízos para a agricultura ou saúde pública; e servem de alimento a um vasto conjunto de outros animais, contribuindo para a manutenção da diversidade no ecossistema.