Debate entre pólos políticos, opondo a líder do BE e o presidente do CDS. Houve tempo para alguns argumentos surpresa, mas com um momento decisivo. Veja as notas, siga os comentários
Eunice Lourenço
Catarina Martins 5 – Francisco Rodrigues dos Santos 5
À hora a que bares e discotecas voltavam a abrir em todo o país, Catarina Martins e Francisco Rodrigues dos Santos começaram o penúltimo debate a dois desta maratona. Notoriamente, não lhe apetecia estar ali, fosse porque estarem cansados de debates, fosse por não terem nada para ouvir um do outro.
Como é natural divergiram em tudo, das privatizações à saúde, da TAP aos vistos gold, dos impostos às políticas de rendimentos. Ambos são líderes aguerridos, com olhos como luzeiros e esperava um debate mais animado. Espero que, no fim, tenham ido beber um copo para descontrair.
Filipe Garcia
Catarina Martins 6 – Francisco Rodrigues dos Santos 5
Francisco Rodrigues dos Santos é dados a excessos. Por mais que se controle, por mais que a postura nos debates tenha sido refreada, o líder do CDS acaba, quase sempre, fora pé. Hoje, frente a Catarina Martins, começou a comparar as privatizações da Geringonça às do PREC e acabou a acusar o Bloco de Esquerda de querer “uma espécie de Guia de Michelin de salas de chuto”. Catarina Martins, a valer-se do quilómetros que já tem a mais em debates e campanhas políticas, respondeu com violência – “tática André Ventura” – mas nunca perdeu a compostura.
Com dois modelos económicos e sociais antagónicos, entre Bloco e CDS não haverá roubo de eleitorado, mas, mesmo num debate morno, ainda se viram uns bons golpes. Quando Rodrigues dos Santos lembrou o momento em que Catarina Martins citou Papa Francisco para, com outra citação, defender o apoio às empresas. Ou quando, contra as privatizações, a bloquista lembrou a conquista de Lisboa pela direita com a oferta de transportes públicos gratuitos no topo das promessas eleitorais. O maior momento de desconforto, chegaria logo depois. Quando o assunto chegou aos Vistos Gold, Catarina Martins lembrou que até a CES defende o seu fim. Rodrigues dos Santos, derrapou, falou de investimento estrangeiro e acabou sem dizer se é contra ou a favor. Para esse despiste o motivo poderá ser outro – atacar os Vistos Gold colocaria ainda mais longe da campanha do CDS o seu ideólogo, Paulo Portas.
Vítor Matos
Chicão 5 – Catarina 6
A chave de leitura do debate estava guardada para o fim. Foi quando, delicadamente, com o seu ar seráfico, garroteada por um extraordinário autocontrolo, Catarina Martins acusou Francisco Rodrigues dos Santos de cobardia, ao registar que o líder do CDS perante a coordenadora do BE “não levantou” as questões que levanta em campanha. Chicão ainda lhe atirou um “Papa Francisco… Louçã”, e Catarina ignorou. Falou em “guia Michelin” para salas de chuto, e de crianças de 10 anos em iniciativas para legalizar a canábis. Não resultou, ao ir por ali a bloquista fê-lo parecer um garoto. “Está a fazer de Ventura?”, perguntou-lhe. E não engrenou na provocação. E aqui Chicão perdeu.
Até ali tinha sido um confronto civilizado sobre duas visões diferentes, sobretudo sobre economia, com a líder do BE a tentar justificar as “desprivatizações” e o popular a procurar convencer-nos de que a nossa vida seria melhor com transportes privados. Mas o mundo de diferenças entre ambos acima de tudo cultural. Já se percebeu que o líder do CDS estuda a atitude a ter em relação a cada adversário e não deixa de ser interessante assinalar o “respeitinho” com que compareceu perante Catarina Martins. As diferenças entre ambos sobre os caminho dos país não são surpreendentes e talvez por isso não se desgastaram em excesso. Mas, apesar das posições claramente de esquerda, Catarina não citou nenhum livro vermelho nos debates e Francisco cita aí pela terceira vez Ronald Reagan. “Um esquadrão de cavalaria à desfilada” na cabeça dele não esbarra em frases de mais ninguém?
João Silvestre
Catarina Martins 6 – Francisco Rodrigues dos Santos 5
Catarina Martins e Francisco Rodrigues dos Santos são como água e azeite. Discordam em praticamente tudo: na imigração, nos vistos gold, na fiscalidade (em geral) ou no papel do Estado na economia. Com alguns raros pontos de contacto, como o fim do adicional do ISP que foi criado quando o petróleo estava barato e, como frequentemente acontece nos impostos, nunca mais desapareceu. Ambos falaram para os seus eleitorados – e foram eficazes nisso – e tentaram desacreditar as propostas do adversário. Rodrigues dos Santos esteve bem ao tentar colar o Bloco a extrema esquerda com o seu modelo “que não resultou em lado nenhum”, embora, no limite, possa estar a ajudar a convencer eleitores a votar PS. António Costa agradece. Foi mais certeiro na preocupação com a necessidade de fazer a economia crescer. E, tirando o “guia Michelin das salas de chuto” mesmo no final, manteve-se moderado e longe de temas mais a direita a que recorreu noutros debates. O que pode ajudar a desviar para o CDS potenciais votantes no PSD. António Costa agradece novamente. Catarina Martins esteve melhor nos vistos gold, na TAP (onde defendeu a lógica da intervenção mas levantou dúvidas sobre plano e até recordou a SATA) e na venda da EDP ao Estado chinês. Não conseguiu defender devidamente as opções fiscais do Bloco e não esclareceu onde terminaria – nem com que consequências – a onda de “desprivatizações” que prevê no seu programa. Não foi dos melhores nem dos mais animados debates destas legislativas.
David Dinis
Catarina Martins 6 – Francisco Rodrigues dos Santos 5
O primeiro tiro bem dado foi de Catarina Martins, recuperando o brinde de Paulo Portas à compra de empresas portuguesas pelo Estado chinês. Depois Chicão, pondo em espelho a abertura do Bloco à imigração, mas a crítica cerrada a quem investe em Portugal (pena é que tenha feito ricochete, pela reserva do CDS na lei da imigração). Mas Catarina voltou à carga, para mostrar a Chicão como criticar o dinheiro posto na TAP esbarra com o que apoio do Governo dos Açores (onde o CDS tem vice-presidência) à SATA – pena é que não tenha conseguido explicar que solução teria para a TAP.
Este teria tudo para não ser um debate com história. Mas o líder do CDS decidiu acabá-lo com uma tirada de mau gosto sobre um suposto “Guia Michelin para a criação de salas de chuto” que viu no programa do Bloco e que acha que leva a um disparo no consumo de drogas. Teve a resposta merecida. E assim se desfez o empate.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL