Um tempo terá havido em que na Assembleia da República, particularmente nos seus primórdios, os debates que nela ocorriam tinham base ideológica, assentes nos princípios que cada partido fazia seus e, a partir deles, se defendiam caminhos a percorrer pelo país, reformas nele a operar, debates com personagens, nos diversos quadrantes partidários, cultos, possuidores de saberes múltiplos, autênticos príncipes da oratória.
Hoje, contudo, olha-se para a Assembleia da República e o que nos é dado observar não podia ser mais confrangedor, já que, excluindo exceções que só confirmarão a regra, o debate rico e, ainda, que vivo, como outrora, também, não deixaria de ter lugar, vem sendo, contudo, substituído pela pobreza dos argumentos, com o pequeno comentário grosseiro ou mesmo insultuoso pelo meio, em discussões, não sobre os grandes desígnios nacionais, mas à volta de sucessivos «casos e casinhos» (agora será o da «pen») e se assiste à criação de comissões de inquérito a propósito de tudo e de nada, como se a Assembleia da República fosse uma simples esquadra de polícia.
Olha-se para muitos dos deputados e pergunta-se o que fazem, exatamente, no hemiciclo, já que não se lhes conhece uma intervenção parlamentar digna desse nome
Olha-se para muitos dos deputados e pergunta-se o que fazem, exatamente, no hemiciclo, já que não se lhes conhece uma intervenção parlamentar digna desse nome, uma ideia, por pequena que seja, inovadora para o país, quanto muito, a par do carregarem num botão em hora de votação e em obediência a superiores decisões partidárias, «notabilizam-se» pelas bocas que no hemiciclo passam o tempo a mandar uns aos outros!
Entretanto, como se chegou até aqui?
Talvez, como já o escrevemos noutra ocasião, porque, se um tempo, igualmente, terá havido em que não entrava para um partido quem queria, mas sim quem podia, pelo seu currículo cívico, pela sua verdadeira identificação com os princípios do mesmo e disponibilidade para servir, desinteressadamente, a causa pública, hoje, vá se lá saber porquê, quiçá para se mostrar quanto o partido é grande, se encontra implantado no terreno, «tudo o que vier à rede é peixe», nele entrando, por conseguinte, qualquer um que lhe bata à porta, seja simples aventureiro, oportunista ou, até (pergunte-se a um André Ventura), doente psiquiátrico! E como gente honesta e capaz não se sentirá bem em tal companhia, a que acrescerá o facto de nos dias que vão correndo recear assumir qualquer público papel, não se vá dar o caso de se ver vítima duma qualquer cabala de baixa política, com julgamento na praça pública e toda a sua vida devassada a servir de alimento a audiências televisivas e tiragens de jornais, os partidos veem-se a ir a jogo, ao contrário do passado, cada vez com menos craques!
NOTAS MARGINAIS:
– Acaba de se comemorar os 80 anos de libertação do campo de concentração e extermínio de Auschwitz, libertação feita, deverá, igualmente, assinalar-se, já agora, que certa russofobia militante isso ocultará, pela 322ª Divisão do Exército Vermelho (da ex-URSS), maioritariamente composta por russos!
– O holandês Mark Rutte, novel Secretário-Geral da NATO do Tio Sam, veio, enquanto seu capataz, ao nosso país, sempre de sorriso nos lábios, como sedutoramente deve ser, sugerir – que não impor, pois somos um país soberano, atenção – que aumentássemos a despesa com armamento, já que os russos andarão com olho nos nossos Pastéis de Belém, sugestão que o nosso primeiro-ministro, com igual sorriso, aceitou, prometendo, para já, elevá-la para 2% do PIB, mais cedo do que era previsível.
Na sequência, logo se fizeram ouvir as vozes contestatárias do costume, denunciando essa aceitação, já que o dinheiro que se vier a gastar em armas passará a faltar na saúde, educação ou habitação.
Só que tais contestatários se esqueceram que podemos gastar mais dinheiro, sim senhor, em armamento, sem que ele, contudo, passe a faltar nas ditas áreas do nosso estado social, bastando para isso deixarmos de andar a gastar dinheiro em copos e mulheres, nomeadamente no Bairro Vermelho de Amesterdão!
– «Hernâni Dias cai e torna-se a primeira baixa do governo» – jornal Público.
Naturalmente, como queriam que o pobre, tendo dado uma queda, continuasse a trabalhar?
– OpenAi dos EUA: 10 anos a ser concebida, envolvendo 4 500 empregados e um custo de 4,5 mil milhões de dólares:
DeepSeak da China: menos de 2 anos a ser concebida, envolvendo 200 empregados e um custo de menos de 10 milhões de dólares!
Olha os «comunas» chineses, quem diria?
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