Uma funcionária do supermercado Aldi em Barcelona viu o seu despedimento considerado ilegal após ser acusada de aplicar descontos indevidos em produtos de carne fresca e de alegadamente ter levado um casaco sem pagar. A decisão do Tribunal Superior de Justiça da Catalunha colocou em causa a justificação da empresa para rescindir o contrato de uma colaboradora com mais de dez anos de serviço.
O início do conflito
De acordo com o Noticias Trabajo, um jornal digital espanhol, a trabalhadora desempenhava funções de adjunta a responsável de loja desde 2009. Em setembro de 2020, foi acusada de colocar manualmente etiquetas de desconto de 30 por cento em bandejas de peito de frango fileteado e num frango panado que não se encontravam próximos da data de validade. A empresa alegou ainda que a funcionária teria retirado um casaco no valor de 11,99 euros sem o pagar, depois de o ter separado dias antes.
Na carta de despedimento, a cadeia referiu também um antecedente disciplinar datado de 2019, quando a trabalhadora tinha sido suspensa durante sete dias por motivos semelhantes. A quebra de confiança foi apresentada como argumento central para justificar a rescisão imediata do contrato.
O veredito em primeira instância
O caso chegou ao Juízo do Trabalho número 7 de Barcelona, que considerou o despedimento improcedente. Segundo a mesma fonte, ficou provado que a funcionária colocou etiquetas de desconto apenas no dia 24 de setembro de 2020, não existindo evidências de que tal prática tivesse ocorrido noutras datas. Também não se demonstrou que o casaco tivesse sido retirado da loja sem pagamento.
O tribunal destacou que a empresa não apresentou provas diretas e inequívocas, como exige a legislação laboral espanhola. Reconheceu que o comportamento da trabalhadora poderia constituir uma infração, mas considerou que não tinha gravidade suficiente para justificar a perda do emprego. Na decisão foi ainda tida em conta a antiguidade da funcionária e o valor reduzido envolvido, apenas 2,67 euros.
O recurso da empresa
O Aldi recorreu ao Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, argumentando que se havia perdido a confiança essencial para manter o vínculo laboral, invocando princípios de boa-fé contratual e alegado abuso de confiança. O recurso foi rejeitado e a decisão de primeira instância confirmada.
O tribunal superior reiterou que não ficou provado que a funcionária tivesse manipulado descontos noutras datas além de 24 de setembro, nem que tivesse retirado o casaco da loja sem pagar. O acórdão reconhece uma conduta incorreta, mas conclui que não atingiu a gravidade necessária para justificar a sanção máxima prevista no regime laboral espanhol.
Segundo o Noticias Trabajo, o valor irrisório do prejuízo e os mais de dez anos de percurso profissional da trabalhadora permitiam apenas uma penalização disciplinar mais leve, nunca a perda do emprego.
Casos semelhantes em Portugal
Em Portugal, despedimentos motivados pela alegada aplicação indevida de descontos por trabalhadores já ocorreram, mas cada caso é analisado pelos tribunais tendo em conta as circunstâncias concretas. A legislação laboral portuguesa exige prova clara e inequívoca do comportamento culposo para que se justifique a rescisão do contrato por justa causa.
O Tribunal da Relação do Porto, por exemplo, decidiu em 2015 que descontos aplicados indevidamente pelo trabalhador não constituem, por si só, motivo suficiente para despedimento, salvo em situações expressamente previstas na lei. A decisão destacou que qualquer penalização deve respeitar o devido processo disciplinar e a proporcionalidade das medidas.
O Código do Trabalho reforça que apenas condutas graves e culposas que violem os deveres contratuais podem justificar a sanção máxima. Assim, a simples aplicação incorreta de descontos, sobretudo de valores reduzidos, pode dar origem a penalizações mais leves ou compensações financeiras, mas raramente legitima a perda do emprego sem avaliação completa do contexto.
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