Mais um ciclo autárquico se inicia e o que parece é que nada será como dantes. Também aqui, tudo indica, o bipartidarismo acabará. Haverá um novo equilíbrio de forças. As negociações não serão fáceis e a força dos extremismos poderá ser decisiva. Este cenário abrirá, certamente, um período de enorme instabilidade nos executivos, podendo levar mesmo ao bloqueio das decisões municipais. A generalização desta situação será altamente penalizante para a região.
A dúvida destas eleições é saber se os eleitores irão acorrer às urnas para sancionar o trabalho dos autarcas ou para sinalizar o seu protesto sobre as novas perceções sociais. Diz-se que nas eleições autárquicas contam as pessoas, a proximidade daqueles que exercem funções nos executivos, em particular, os Presidentes de Câmara. Pressupõe-se que conta a experiência e a motivação das equipas para o trabalho e a sua relação com o local em que se movem.
Estão identificados os grandes problemas: habitação, educação, apoio aos idosos, mobilidade e tratamento do espaço público. Mas não basta. É preciso uma visão de futuro. Como construir cidades para o século XXI, com novas centralidades e novos polos de atração de investimento, baseados na ciência, na tecnologia e na cultura. Este é o desígnio do novo ciclo autárquico.
Ou não? Sabemos que há novas perceções sociais que entraram no domínio da discussão pública e política: a imigração e a segurança. O que é que no fim determinará o voto? Os problemas das pessoas, isto é, a sua satisfação perante o estado atual e as propostas futuras acerca das questões estruturantes ou as novas perceções sociais.
Sejamos claros: o Algarve precisa de imigrantes sem os quais a sua economia afunda. Podemos mesmo afirmar que somos a região mais dependente dos imigrantes. Turismo, agricultura e construção civil são os setores em que mais se recorre a mão-de-obra estrangeira. Mas sejamos ainda mais claros. A região é fortemente dependente de estrangeiros, dos que vêm para trabalhar e dos que vêm para nos visitar. E, já agora, dos que vêm para investir. Qualquer discurso ou, pior ainda, qualquer ação contra estrangeiros, terá uma leitura bem penalizadora para a região. O que estará em causa é a nossa capacidade de acolhimento e integração. Para o trabalho, para o investimento e para a visitação estrangeira. Isso sim, deveria ser motivo de discussão entre candidaturas. E de escolhas dos eleitores.
Sobre a segurança todos sabemos que há focos localizados que têm de ser vigiados, decorrentes, no essencial, dos excessos provocados pelo turismo de massas. O reforço da prevenção é absolutamente crucial e tem de ter visibilidade e operacionalidade. Mas sejamos também claros sobre isto. O Algarve é uma região segura. Dizem-nos todos os estudos e relatórios oficiais. E dizem mais. Não há nenhuma relação entre mão-de-obra estrangeira e insegurança. Tudo o resto é procurar esgrimir os fantasmas do medo e do sobressalto. E isso não é bom para uma região turística.
As pessoas escolherão. E, certamente, o seu voto é que conta. E deve ser lido na sua plenitude. De qualquer modo, o que se espera é que perante os resultados o espaço dos partidos moderados esteja à altura dos desafios. E que não se esqueçam que o espaço onde a democracia se expressa com maior responsabilização pessoal é o autárquico. E, por isso, é onde a democracia está mais em causa. Deles se espera conciliação e negociação para ultrapassar os bloqueios às decisões que façam a diferença para cada um dos concelhos. Tem sido assim até agora. Deverá ser assim, por maioria de razão, a partir de agora.
Precisamos de uma região para o século XXI, que resolva o problema das pessoas, qualquer que seja a sua origem ou credo, e que seja capaz de gerar uma economia mais justa, dinâmica e inovadora. Precisamos de esperança e não de medo. Só a esperança faz as sociedades avançarem. Só a esperança dá força à democracia.
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