Em Espanha, cresce o descontentamento entre milhares de pensionistas que, apesar de terem trabalhado mais de quatro décadas, estão a ver a sua pensão ser reduzida por causa dos chamados coeficientes redutores, segundo o jornal digital Noticias Trabajo. O caso está a gerar debate público e levanta uma questão que também preocupa muitos portugueses: até que ponto as carreiras longas são devidamente compensadas na hora da reforma?
Nos últimos anos, a sustentabilidade dos sistemas públicos de pensões tem sido um dos temas mais discutidos em vários países europeus. Em Espanha, economistas como Gonzalo Bernardos alertam para o risco de haver “pouca gente a descontar” no futuro, o que poderá comprometer o equilíbrio da Segurança Social.
A estas preocupações soma-se uma medida que afeta já muitos reformados: a aplicação de cortes automáticos nas pensões de quem se reforma antecipadamente, mesmo após décadas de descontos.
O Ministério da Inclusión, Seguridad Social y Migraciones aplica os chamados “coeficientes redutores” às reformas antecipadas, o que significa que o valor da pensão é reduzida em percentagem. Na prática, trabalhadores que começaram a laborar muito jovens, alguns ainda na adolescência, acabam penalizados, mesmo tendo cumprido longas carreiras contributivas.
Quando trabalhar mais tempo não significa receber mais
Um dos casos que mais tem dado que falar é o de Cándida Jiménez, reformada espanhola com praticamente 45 anos de descontos, que viu a sua pensão reduzida em 13% por se ter aposentado aos 63 anos, de forma involuntária, devido a problemas de saúde. “Mas não até aos 65, é para sempre, uma cadeia perpétua”, afirmou num vídeo divulgado pela associação ASJUBI40, que representa milhares de pessoas na mesma situação.
A associação, que luta pela eliminação destes coeficientes, denuncia que o sistema está a criar desigualdades graves. “As classes passivas podem reformar-se aos 60 anos com apenas 35 anos de descontos e recebem 100%”, recorda Cándida, sublinhando o contraste com os trabalhadores do regime geral.
Segundo dados divulgados pela ASJUBI40, mais de 860 mil pensionistas em Espanha sofrem reduções semelhantes. Muitos iniciaram a vida laboral em fábricas, oficinas ou na agricultura, em condições exigentes, e agora veem o valor da reforma reduzido de forma permanente, refere a mesma fonte.
Um debate que também ecoa em Portugal
Embora o sistema português de pensões seja diferente, a questão da penalização das reformas antecipadas também tem sido motivo de contestação. Em Portugal, a Segurança Social aplica fatores de redução para quem se aposenta antes da idade legal, atualmente fixada nos 66 anos e 7 meses em 2025, mesmo quando o trabalhador cumpre décadas de descontos.
Nos últimos anos, o Governo português introduziu exceções para as chamadas “carreiras muito longas”, permitindo a reforma sem penalizações a quem tenha pelo menos 46 anos de descontos ou que tenha começado a trabalhar antes dos 18 anos. Ainda assim, muitos reformados reclamam que os critérios continuam restritivos e que nem todos os trabalhadores com longas carreiras são abrangidos.
O debate sobre justiça contributiva e envelhecimento ativo aproxima-se, assim, do que se vive em Espanha, onde as associações de pensionistas continuam a exigir a eliminação dos coeficientes redutores aplicados a reformas antecipadas por motivo de desemprego ou incapacidade.
Reformados sentem-se injustiçados
A situação descrita por Cándida Jiménez tornou-se símbolo de uma geração que entrou no mercado de trabalho muito cedo e que agora enfrenta penalizações que considera injustas. “Trabalhar toda a vida para depois ser penalizado. É uma injustiça descomunal”, afirmou a reformada, exigindo ao Governo espanhol “a eliminação imediata dos coeficientes redutores tão injustos”.
De acordo com a mesma fonte, o movimento ASJUBI40 tem usado as redes sociais e o YouTube para partilhar testemunhos e pressionar o Executivo a rever a lei. O grupo argumenta que trabalhar 40 ou mais anos deveria bastar para garantir o direito a uma reforma completa, independentemente da idade de saída.
Em Portugal, sindicatos e associações de reformados já expressaram posições semelhantes. A Confederação Nacional de Reformados e Pensionistas tem defendido o fim das penalizações para quem contribuiu durante décadas e se reforma antes da idade legal por motivos de saúde ou desemprego prolongado.
Longas carreiras, penalizações permanentes
Na prática, a aplicação de coeficientes redutores traduz-se em cortes vitalícios. No caso de Cándida, por exemplo, o desconto de 13% mantém-se até ao fim da vida, significando que recebe apenas 87% do valor que lhe seria devido. É uma situação que, segundo os reformados espanhóis, contradiz o princípio de “trabalhar mais para receber mais”.
Uma luta que pode inspirar mudanças
A ASJUBI40 promete continuar a luta junto do Governo espanhol e do Parlamento Europeu. A associação tem defendido que os trabalhadores com mais de 40 anos de descontos deveriam ter direito à pensão completa, independentemente da idade em que se reformam, segundo aponta o Noticias Trabajo.
Em Portugal, esta discussão poderá ganhar novo fôlego nos próximos anos, à medida que aumenta o número de pessoas com carreiras de 45 ou mais anos. Para muitos, o exemplo espanhol serve de alerta sobre a necessidade de evitar situações em que décadas de trabalho resultam numa pensão reduzida e de garantir uma reforma justa para quem contribuiu durante toda a vida.
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