A Plataforma “Mais Algarve” realizou no passado dia 15 de junho, no Centro Autárquico de Quarteira, um debate sobre a construção de uma dessalinadora no Algarve
Após as exposições iniciais de Claudia Sil, Investigadora no CCMAR, Universidade do Algarve e representante das ONG de ambiente no Conselho Regional da CCDR do Algarve; e de Nídia Braz, coordenadora na Universidade do Algarve, presidente da CIVIS, em representação da Plataforma Água Sustentável-PAS; cerca de 40 pessoas participaram no debate organizado pela Plataforma “Mais Algarve”.
“Os estudos que fundamentam e suportam as políticas e o planeamento, nomeadamente o Plano de Gestão de Região Hidrográfica – PGRH (3º ciclo-2022-2027), o Plano Intermunicipal de Adaptação às Alterações Climáticas – PIAAC e o Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve – PREHA, ou não referem a dessalinização ou a referem como a última das medidas a considerar estudar após as restantes se revelem eventualmente insuficientes”, refere a plataforma em comunicdo.
“Acresce que na síntese das questões significativas relativas à gestão da água (QSiGA) identificadas para a revisão do PGRH (3º ciclo-2022-2027), a questão da dessalinização não surge sequer”, acrescenta.
Na generalidade estes estudos apontam para medidas de adaptação propostas abrangem: diminuir as perdas de água nos sistemas urbanos de abastecimento e infraestruturas de rega agrícola; reduzir as necessidades de água nos espaços verdes urbanos; implementar técnicas de retenção de água que promovam a recarga artificial dos aquíferos e o autoabastecimento; reutilizar águas dos efluentes das ETAR e reavaliar a viabilidade de novas barragens e promover a sua construção.
Em particular o PIAAC considera “reavaliar a viabilidade de uma central de dessalinização e promover a sua construção”, apenas caso o cenário climático se venha a revelar “mais severo e continue aumentando a área agrícola irrigada, embora considere que contribui negativamente para o setor da Energia, para o setor da Biodiversidade e das Zonas Costeiras e Mar”.
“É com o PRR que surge a proposta concreta e a sua orçamentação, à revelia dos estudos prospetivos que suportam as tomadas de decisão. A dessalinização caiu de rompante. Por haver o PRR surge uma proposta que não estava prevista nos planos estruturantes para a região. Uma coisa espúria!”, afirma “Mais Algarve”
“Os estudos apontam para que a perda de água no abastecimento urbano atinja os 25 a 30%, correspondendo a valores em torno dos 30hm3 e nos sistemas de rega o valor é semelhante. Também é de considerar que a restrição da rega de espaços verdes, públicos e privados (não incluindo os golfes), corresponde a uma poupança de 8,8 hm3 (2019)”, prossegur.
“Os efluentes das 17 ETAR com elevado potencial pela dimensão, proximidade de potenciais utilizadores relevantes de Água para Reutilização (ApR), com níveis de tratamento adequado potenciam o fornecimento de 20hm3, mas segundo outros pode ascender a 40 hm3. Acresce que os efluentes das ETAR lançados nos meios naturais poluem rios, freáticos e mesmo praias como é o caso da ETAR de Vilamoura”, pode ler-se no comunicado.
Estes valores mostram “a irrelevância do investimento na Dessalinizadora de 54M€, segundo o PRR, que na prática, considerando os custos complementares como a abdução para a ETA e outros, chegarão a mais 20 ou 30 M€, para produzir 16 hm3, previstos no projeto, embora num debate promovido pela PAS tenha sido afirmado pelos participantes da APA e AdA que a produção seria de apenas 8 hm3“.
“A dessalinização transformou o golfo de Oman num deserto marinho. A Andaluzia, não obstante o recurso à dessalinização, está a transformar-se num deserto, em resultado de uma falta de água determinada por uma política agrícola insustentável”, lembra.
A captura da água na zona do Parque Natural Marinho da Pedra do Valado, que constitui “uma das zonas mais ricas em termos de biodiversidade a nível nacional e o maior recife costeiro do Algarve, com valores naturais ímpares no contexto da costa portuguesa. Em particular a zona conhecida por Rocha Baixinha, frente à praia com o mesmo nome ou também conhecida por “praia dos tomates”, constitui uma zona de pesca em que a captura de água e a descarga de salmoura afetará o plâncton e a criação piscícola, além de introduzir limitações à pesca”.
A Plataforma “Mais Algarve” considera que a “praia da Falésia é uma zona de turismo muito apreciada que serve todo um conjunto de hotéis se verá muito prejudicada pelas obras de instalação das condutas de oferta e provocarão instabilidade na falésia”.
A zona em que se implantarão as estruturas da dessalinizadora, a Várzea de Quarteira, 2possui dos melhores solos do Algarve e do país, pelo que integra a Rede Agrícola Nacional – RAN. Ainda, esta zona tem várias empresas de alojamento e lazer turístico que serão fortemente desvalorizadas e levantam desde já a reação negativa dos proprietários”.
No Algarve, 16 empresas agrícolas condicionam “a política da água e pressionam para construir a dessalinizadora destinada a compensar o seu excessivo consumo, o que obrigaria a que o abastecimento urbano fosse feito com uma água mais cara enquanto para a agricultura a água é quase ou mesmo de graça”.
As alternativas existem nos documentos resultantes de estudos diferentes, mas largamente coincidentes, mas as decisões sobre “as prioridades aparecem determinadas por alguma outra entidade, à revelia e o Eng. Carmona Rodrigues, divulgador e propangandista, tanto da dessalinizadora, como da captação no Guadiana, acaba promovido a Presidente das Águas de Portugal”.
O aumento exponencial da área de cultura intensiva regada tem provocado “o desequilíbrio, à revelia do que preconizava a Estratégia de Desenvolvimento Regional (Algarve 2030 – CCDR) que explicitamente considera premente repensar as opções estratégicas baseadas no crescente recurso ao regadio. Outra coisa espúria”.
Na sequência do debate, apreciou-se a estrutura de consumos, constatando-se que “a referência a que a agricultura consome cerca de 60% da água disponível, resulta enganadora pois grande parte da água provém de furos não monitorizados que fornecem água grátis”.
“Esta orgia de água está a esgotar os aquíferos, sendo que o de Querença-Silves há anos que não brota água nas Fontes de Estômbar e agora, já com intrusão salina, os furos sai água salgada. E neste contexto, que a ApA autoriza a Águas do Algarve-AdA a captar 12hm3 a partir deste aquífero”, refere a Plataforma “Mais Algarve”.
“A ausência de monitorização e um falso entendimento sobre a propriedade da água subterrânea, que alimentada pelas autoridades, leva a que o agronegócio internacional esteja a pôr em risco a agricultura de base regional de mais de 12 mil explorações agrícolas familiares, 6% da população da região”, afirma.
Embora as alterações climáticas venham introduzindo mudanças nas temperaturas e nos regimes pluviais, e pese o regime de alternância entre anos secos e muito húmidos, “a precipitação média no Algarve não tem sofrido variações significativas; a única mudança real é antropogénica: uma agricultura insustentável, que apenas gera menos de 1% do VAB, e um turismo exagerado, que, apesar de tudo, contribui para cerca de 55% do VAB (alojamento, restauração e imobiliário)”.
Para a Plataforma “Mais Algarve”, resultou claro que “o investimento na dessalinização, não só não tem fundamentação, como não se entende que forças nos bastidores a promovem e que interesses a suportam”, .
“Ficou evidente a sua inutilidade e insustentabilidade face a outras alternativas. Foi denunciada a opção por uma tecnologia já obsoleta e a insuficiente garantia de mitigação dos aspetos negativos”, conclui.
A Plataforma Mais Algarve é um grupo autónomo de aderentes, ex-aderentes do Bloco de Esquerda e outros ativistas de esquerda com a vontade militante de renovar e redinamizar a atividade política na região.
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