Estamos a viver um momento histórico para as freguesias de Conceição, Cabanas de Tavira, Luz de Tavira e Santo Estevão, do Município de Tavira, entre algumas outras do nosso Algarve e do nosso país em que, ao fim de longos doze anos de agregação forçada, os respetivos fregueses voltaram a votar na sua Freguesia e não na União de Freguesias a que os obrigaram a pertencer.
Hoje mesmo (28/10/2025), tomaram posse os novos eleitos para as renascidas Freguesias de Conceição e Cabanas de Tavira, cerimónias a que tive o gosto e a honra de assistir.
Esta realidade representa motivo de grande contentamento e alegria para os cidadãos destas Freguesias que nos são tão próximas e, particularmente para Cabanas, terra onde não conheço ninguém que não desejasse com entusiasmo a, recentemente ocorrida, desanexação.

Ex-secretária da freguesia de Conceição e ex-presidente da freguesia de Cabanas de Tavira
As Freguesias são, por vocação, autarquias de proximidade, de vizinhança, onde o Presidente da Freguesia vive no seio da comunidade e, logo que sai à rua, convive com os seus fregueses e toma conhecimento das suas carências, bem como dos problemas da terra.
Cabanas integrou a Freguesia de Conceição até 1997, data em que o executivo da Freguesia de Conceição, a que eu pertencia, arregaçou mangas e construiu um projeto tendo em vista a desanexação de Cabanas, o qual seguiu os trâmites legais e, em cerca de meio ano, constituiu-se a Freguesia de Cabanas de Tavira, a qual funcionou, de forma autónoma durante felizes dezasseis anos. Tivemos, nesse investimento a prestimosa ajuda do Presidente da Câmara de então, Jacinto Rodrigues e também do saudoso Jorge Valente, então Deputado à Assembleia da República.
Em 2013, a pretexto das imposições da troika, Cabanas de Tavira viria a ser de novo anexada à Conceição, tal como Santo Estevão fora anexada à Luz de Tavira, contra a vontade das populações e também dos seus autarcas.
Em boa hora, em 2021 o governo de António Costa, através da Lei nº 39/2021, abriu a possibilidade de as Freguesias agregadas poderem, de novo, constituir-se e organizar-se como freguesias autónomas. A partir dessa data nasceu, designadamente na comunidade cabanense, a esperança de voltarmos a ter a nossa Freguesia.
Porém, nas conversas informais que, a esse respeito, fui mantendo com as pessoas do meio político – sobretudo com os meus camaradas do Partido Socialista -, o que me respondiam é que nas reuniões políticas e em sede da Câmara Municipal, o que se dizia era que “a anexação não andava para trás, que já não havia volta a dar, que não valia a pena tentar”. A isso, eu respondia: “- como é possível, se a lei existe e permite-o?”
Percebi claramente que, no contexto do meu partido político, não encontrava apoios, para prosseguirmos com o processo. Recorremos então ao grupo do PSD na Assembleia de Freguesia para apresentação de uma Proposta em sessão desse órgão autárquico, no sentido de iniciar o processo de desanexação. Antes da referida sessão da AF, fiz contactos com alguns dos deputados de Freguesia do grupo do PS, para os tentar sensibilizar para – decorrente do forte desejo das populações -, a importância do voto favorável à Proposta que ia ser apresentada. Recebi apenas respostas evasivas. A Proposta foi aprovada com os votos favoráveis dos deputados do PSD e a abstenção dos deputados PS.
Reunimos, então, um grupo de ex e atuais autarcas de ambas as Freguesias e prosseguimos com o Projeto, de acordo com a lei. Dele fizemos entrega na União de Freguesias, o qual viria a ser aprovado por unanimidade em sessão da Assembleia de Freguesia realizada a 21 de novembro de 2022 e por maioria – com a abstenção do deputado do Chega e de um dos deputados do PS, em sessão da Assembleia Municipal realizada a 19 de dezembro de 2022.
Perto de um ano após o envio para a Assembleia da República, o grupo de trabalho das freguesias, constituído no âmbito da Comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local, solicitou-nos – tal como o fez em relação à esmagadora maioria dos projetos apresentados –, que reformulássemos o capítulo referente à Viabilidade Económica e Financeira, projetando a exequibilidade orçamental para as freguesias a criar, no mínimo a dois anos.
Esse era um capítulo muito técnico que extravasava as nossas competências, para a elaboração do qual havíamos anteriormente recorrido a um cabanense geograficamente distante, o gestor João Mestre, que nos ajudou nessa tarefa. Faltando-nos coragem para voltar a socorrer da generosidade do João Mestre, empresário sempre muito ocupado, restava-nos solicitar à nossa Câmara Municipal que nos apoiasse, com recurso aos seus técnicos. Foi o que fizemos, através de ofício dirigido ao senhor Presidente da Assembleia Municipal, ofício cuja resposta não recebemos. Restava-nos voltar a apelar ao dr. João Mestre, o que fizemos, recebendo de novo o contributo da sua competência, num esforço de subtração ao tempo do seu trabalho.
Este acréscimo ao projeto tinha que seguir para a AR, através da Assembleia Municipal de Tavira, até 19/12/2023, pelo que a 17 de dezembro fizemos entrega do mesmo na AMT.
Cerca de dez meses depois, por informação que nos chegou através do então deputado da AR, dr. Dinis Faísca, soubemos que os Projetos das Freguesias de Tavira a desanexar, não se encontravam na AR. Na sequência dessa informação, solicitei ao senhor Presidente da AMT comprovativo dos CTT, relativo ao envio do Projeto Conceição-Cabanas, ao que o Senhor Presidente me informou não possuir esse necessário comprovativo.
Entretanto, por contacto estabelecido a 17/10/2024, com o senhor deputado Jorge Botelho, dizia-me ele que talvez o projeto estivesse em algum dos armários da AR, o que não nos tranquilizou. No dia seguinte, telefonou-me de novo, dizendo-me que o Projeto já se encontrava na AR. Todavia, haviam passado dez meses após a data em que deveria ter chegado, não esperávamos que a AR considerasse ainda os Projetos de Tavira, Conceição – Cabanas de Tavira e Luz de Tavira – Santo Estevão.
Seguiram-se dois meses em que pensámos que todo o nosso esforço tinha sido em vão e que não conseguiríamos satisfazer o sonho legítimo das populações. Finalmente, em dezembro de 2024, chegou-nos, mais uma vez através do deputado Dinis Faísca, a feliz notícia de que o nosso Projeto fora aprovado pela Comissão Técnica, em reunião de 4/12/2024, e em 17/12 a notícia igualmente feliz de fora também aprovado em Comissão do Poder Local e Coesão Territorial da AR. Precisamente um mês depois, a 17/01/2025, as Propostas de Desanexação das Freguesias foram aprovadas na AR, apenas com o voto contra da IL e abstenção do Chega.
Seguiu-se a 13/02/2025 o veto do Senhor Presidente da República, justificando sobretudo a escassez de tempo para a formalização da criação das freguesias até às eleições autárquicas de 12 de outubro.
A 28 de fevereiro aconteceu a nova votação na AR e as propostas voltam a ser aprovadas, ainda que de novo com o voto contra da IL a que se junta o Chega.
Assim renascem, de novo, as Freguesias de Conceição e de Cabanas de Tavira. Desta feita, um “parto” bem mais difícil, como se percebe pela resenha histórica que aqui registo. Um processo que nasce e decorre sem o apoio das nossas autarquias – a Junta de Freguesia e a Câmara Municipal -, que brota da vontade da população, a qual segue com o seu sonho contra “ventos e marés”.
Que os órgãos autárquicos hoje instalados em ambas as Freguesias, democraticamente eleitos, obtenham muito sucesso nos seus empreendimentos e contribuam sobremaneira para o desenvolvimento destes encantadores territórios, concorrendo assim, também, para a felicidade das suas gentes, objetivo primeiro e último da nobre missão de autarca.
Viva Conceição, viva Cabanas de Tavira!
Leia também: Conceição e Cabanas de Tavira são, de novo, freguesias autónomas | Por Maria José Mestre
















