Uma revisão de estudos revela que jovens NEET têm mais probabilidade de sofrer de ansiedade, tristeza e isolamento. A investigação sugere que o apoio de família, amigos e programas de formação podem fazer diferença no bem-estar e futuro destes jovens.
Jovens que não estudam, não trabalham nem frequentam qualquer tipo de formação entre os 15 e 29 anos são normalmente designados através do acrónimo NEET (do inglês Not in Education, Employment or Training). O seu afastamento do emprego e da educação está associado a uma série de consequências negativas nas áreas social, económica e de saúde mental.
De acordo com dados do Eurofound, a não incorporação destes e destas jovens no mercado de trabalho tem ainda um custo substancial para a economia europeia. Portanto, é importante desenvolver medidas e serviços mais adequados para apoiar este segmento da população, promovendo o seu desenvolvimento e integração social e económica.

Doutorado em Psicologia Básica pela Universidade do Minho
Comunicação de Ciência no CIS-Iscte
Numa revisão da literatura, cientistas da Universidade do Porto e do Iscte-Instituto Universitário de Lisboa identificaram e categorizaram as evidências científicas existentes sobre as características psicológicas de jovens NEET. Foram analisados 10 estudos que contemplaram, no seu conjunto, quase 20 mil jovens NEET.
De uma forma geral, a literatura que se debruça sobre estes jovens não se tem focado no estudo das suas características psicológicas e, quando o faz, parece dar mais atenção ao estudo das suas dificuldades em detrimento de características mais positivas, como a resiliência.
“A nossa revisão de literatura partiu de um universo de mais de mil artigos científicos, mas apenas dez se centravam nas características psicológicas destes jovens”, explica o investigador Francisco Simões, do Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-Iscte) e coautor deste trabalho.
“Sem entender as características desta população, torna-se muito difícil desenvolver estratégias que a envolvam e que deem resposta às suas necessidades”, esclarece.
Os resultados da análise demonstram que ser-se NEET está globalmente associado a estados negativos de saúde mental. Por exemplo, as pessoas jovens com perturbações psicológicas têm mais probabilidade de estar numa situação de desemprego e não estudar ou ter formação. Jovens NEET têm mais probabilidade de fumar e consumir drogas, o que é mais evidente no sexo masculino. Para além disso, a experiência de ser jovem na condição NEET está frequentemente associada a emoções negativas, incluindo tristeza, ansiedade, tensão, medo e desconforto. De um ponto de vista mais positivo, “foi também identificada a importância do suporte social, que estava associado a elevados níveis de autoestima e uma melhor saúde mental nestes jovens.”, afirma Francisco Simões.
Bem-estar de jovens NEET no Sul da Europa
Estes dados vão ao encontro de dados anteriores observados em Portugal, Espanha e Itália, publicados em 2024 no âmbito do projeto europeu “Track-IN: Public employment services tracking effectiveness in supporting rural NEETs”, liderado pelo investigador Francisco Simões. Este estudo avaliou como fatores individuais e sociais influenciam a satisfação de vida de jovens NEET, através do modelo bioecológico de Bronfenbrenner, que inclui diferentes níveis contextuais, desde o sistema individual, aos micro-, meso-, eso- e macrosistemas. A equipa de investigação questionou jovens NEET inscritos em Serviços Públicos de Emprego acerca da sua autoeficácia (nível individual), do suporte social de família e amigos (microsistema), dos serviços e recursos próximos, nomeadamente os Serviços Públicos de Emprego (meso- e esosistemas), acerca das disposições culturais, crenças, valores e formas de governação (macrosistema).
Os resultados do estudo indicam que perceções de apoio social e autoeficácia mais elevadas foram associadas positivamente a uma maior satisfação com a vida. Adicionalmente, o apoio social da família, amigos e pessoas importantes desempenha um papel fundamental na compensação das limitações no apoio institucional, melhorando assim o bem-estar. “Os dados deste projeto, e deste estudo em particular, sublinham a importância de trabalhar em conjunto com as estruturas de suporte social e com as instituições de emprego mais próximas de jovens NEET, para promovermos o seu bem-estar e aumentarmos a sua autoeficácia”, explica Leonor Correia Bettencourt, investigadora associada do CIS-Iscte.
A equipa de investigação alerta, contudo, para a necessidade de realizar mais investigação para compreender a heterogeneidade de jovens NEET, de forma a desenvolver intervenções que tenham em conta o contexto específico de cada país, mas também dentro de cada região.
Jovens NEET de meios rurais enfrentam dificuldades acrescidas
As dificuldades sentidas por jovens NEET parecem ser agravadas para quem se encontra em meios rurais, onde as oportunidades de emprego ou de formação adequada ao contexto se tornam escassas. Em Portugal, uma dessas regiões é a Região Autónoma dos Açores.
Nestes contextos, trabalhar com as instituições de ensino e formação profissionais (EFP) torna-se fulcral. Nesse sentido, um outro estudo realizado no Iscte analisou as políticas de EFP nos Açores, usando uma abordagem participativa. Através de sessões que envolveram formadores, formandos, representantes institucionais, jovens desempregados e empresários, a equipa de investigação identificou três principais prioridades para restruturar estas políticas, propostas pelos participantes. Primeiro, é necessário desenvolver formas de disseminar uma imagem mais positiva do ensino profissional, valorizando-o; em segundo, todas as partes envolvidas (e.g., escolas públicas e privadas) devem coordenar-se horizontalmente através de uma comunicação eficaz que permita a criação de planos de formação articulados; e, finalmente, é importante uma coordenação vertical que permita a atualização de currículos, de modelos de financiamento e investimentos no capital humano.
Em comparação com 2020, o número de jovens NEET nos Açores diminui significativamente. Ainda assim, as políticas públicas de EFP precisam acompanhar as mudanças do mercado de trabalho no contexto europeu. O projeto OVER-SEES: VET Excellence Leadership for the Twin Transition in European Islands pretende fazer isso mesmo. Financiado no âmbito do programa Erasmus+ da Comissão Europeia “Centros de Excelência Vocacional” (CoVE), o projeto pretende atuar em conjunto com jovens, instituições de EFP, empresas e governos de quatro regiões insulares europeias para capacitar jovens, criar oferta no ensino profissional alinhada com as prioridades regionais, incentivar cooperação empresarial e criar estruturas de gestão integradas para fortalecer o ecossistema de EFP regional.
Uma carreira dedicada à promoção de iniciativas centradas na juventude em toda a Europa
Francisco Simões tem investigado a população de jovens NEET em meios rurais, tendo coordenado uma rede internacional de investigadores e investigadoras: a Rural NEET Youth Network, financiada pela COST Association (ref. CA18213). Esta rede constitui agora o Observatório Europeu da Juventude Rural (European Rural Youth Observatory), composta por representantes de diversos setores, incluindo do meio académico, da indústria e de organizações privadas sem fins lucrativos, cujo objetivo é impulsionar a juventude rural em toda a Europa. Em 2024, a rede liderada por Francisco Simões foi novamente financiada pela COST Association com uma COST Innovators Grant para desenvolver um conjunto de ferramentas de previsão estratégica. Este recente projeto, Future Youth Information for Rural Areas, envolve 14 países europeus e pretende gerar conhecimento e ferramentas para antecipar e responder às necessidades e aspirações da juventude rural.
Para além disso, em janeiro de 2024, o investigador do CIS-Iscte integrou a Pool of European Youth Researchers (PEYR), um grupo de especialistas que contribui para o desenvolvimento de políticas europeias para a juventude. Também no ano passado, foi nomeado coordenador de um estudo do Conselho da Europa em colaboração com a União Europeia que pretende fazer uma análise transnacional das políticas e dos serviços voltados para os jovens que vivem em áreas rurais. Este estudo será publicado em 2025 pela Youth Partnership, um think-tank do Conselho da Europa e da Comissão Europeia para as questões da juventude. Mais recentemente, Francisco Simões assegurou um financiamento de 4 milhões de euros para o projeto OVER-SEES que, para além dos Açores, envolve a Região Oeste na Irlanda, as Ilhas do Egeu na Grécia, e Sicília em Itália.
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