Em cada ciclo eleitoral, a segurança pública regressa como um dos temas centrais da agenda política.
Multiplicam-se as promessas de mais polícias nas ruas, de mais viaturas e de mais tecnologia. Mas, curiosamente, um ator que vive de perto as preocupações dos cidadãos permanece quase sempre fora do debate: os municípios.
Será a segurança, apenas uma questão exclusiva das polícias e dos governos de Portugal? Ou, pelo contrário, não será ela também construída e, em grande medida, condicionada pelas políticas locais, pelo urbanismo, pela iluminação, pela proximidade entre autarquias e comunidades?
Quando se fala de segurança, fala-se tanto de crime real como de perceção de insegurança. E, esta última, não depende apenas da ação policial, mas do modo como as pessoas vivem o seu bairro, a sua rua, o espaço público. Uma praça abandonada, uma rua mal iluminada ou um parque sem manutenção, podem transmitir mais medo do que as estatísticas criminais justificam. Razão pela qual reduzir o debate à dimensão policial é curto e muitas vezes enganador.
A segurança pública é também social, urbana e comunitária. E é, precisamente aqui, que os municípios têm um papel insubstituível.
O poder local está na primeira linha de contacto com os cidadãos.
São as câmaras e as juntas de freguesia que recebem queixas sobre iluminação, sobre ocupação do espaço público, sobre ruído, sobre conflitos de vizinhança.
São os municípios que planeiam a mobilidade urbana, as zonas verdes, os equipamentos desportivos e culturais. Tudo isto influencia diretamente a sensação de segurança. Além disso, vários municípios já dispõem de polícias municipais que, embora com competências limitadas, podem muito bem reforçar a vigilância do espaço público, apoiar as forças de segurança e promover campanhas de sensibilização.
Mas o contributo municipal não se esgota na fiscalização. A capacidade de promover “prevenção social”; isto é; programas para jovens, apoio escolar, iniciativas de integração cultural e atividades de lazer, é talvez o maior trunfo do poder local. Prevenir situações de risco é sempre mais eficaz do que remediar.
A realidade mostra-nos que os municípios, apesar de viverem de perto as preocupações dos cidadãos, continuam de fora do centro de decisão, reduzidos a figurantes numa matéria que lhes passa diariamente pelas mãos e, terem à mão, os instrumentos adequados para agir…
Em Portugal, como já foi assinalado, as matérias relacionadas com a segurança são consideradas como uma questão de responsabilidade soberana do Estado ou como um assunto de reserva exclusiva das polícias.
Esta noção encontra-se de tal maneira enraizada entre nós que subestimamos a importância estratégica do poder local na redefinição do conceito evolutivo da segurança pública.
Ainda hoje, é frequente ouvir dizer que os municípios pouco ou nada podem fazer, porque não têm controlo sobre as forças de segurança e que a constituição reserva ao Estado a responsabilidade exclusiva de garantir a segurança dos cidadãos.
O futuro leva-nos a procurar uma visão holística da segurança, alinhada com a realidade da vivência no espaço público. Um conceito moderno destas matérias deve incorporar, para além das polícias e do sistema judicial, os municípios, os departamentos públicos e privados que na fileira são prestadores de serviços essenciais à comunidade, uma vez que a eficácia policial depende muito de outras variáveis estranhas à própria polícia.
Os desafios que se colocam, atualmente, em termos de segurança pública para dar resposta aos anseios da população, ultrapassam necessariamente a esfera de competência das polícias, requerendo políticas públicas que introduzam soluções inovativas que acrescentem valor e abram caminho a novos atores nesta área.
Há ainda a ter em conta, que grande parte dos problemas que alimentam o sentimento de insegurança, reportam-se a incivilidades praticadas, principalmente por gangues juvenis, factos não enquadrados como atos criminosos propriamente ditos, mas caso não sejam devidamente trabalhados e tratados a tempo, por outras instituições que não as polícias, irão seguramente terminar em práticas delituosas.
A criminalidade que ocorre no espaço público – assaltos, furtos, violações e distúrbios – não se deve simplesmente à perícia e astúcia dos criminosos, à falta de policiamento ou ao uso de táticas antiquadas pelas forças de segurança; é também o resultado do abandono dos poderes públicos e da sua insipiente interação com a sociedade civil, sobretudo no que se refere à administração da coisa pública.
Em termos conclusivos, cumpre evidenciar que a segurança é um direito fundamental da cidadania. Todavia, não é um bem garantido apenas, a partir do topo da hierarquia política, nem sequer, com a presença das forças de segurança nas ruas das nossas vilas e cidades. É algo que se constrói, dia-a-dia, no espaço público, na proximidade das populações e com políticas locais.
Ignorar o papel dos municípios, é desperdiçar um dos instrumentos mais eficazes de prevenção e promoção de confiança.
Por isso, em vez de um debate centrado apenas em números e promessas de ocasião, é tempo de colocar as autarquias no centro de reflexão da temática da segurança, porque, em última análise, a segurança começa à nossa porta.
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