Nos 50 anos do 25 de Abril, o Postal do Algarve publica o primeiro de três cadernos especiais, da autoria do professor de História Idalécio Soares, sob o título genérico de O ALGARVE E O 25 DE ABRIL.
Idalécio Soares, investigador de História Local e Regional, é também autor dos livros Vítimas da Ditadura no Algarve, Três casos, três histórias subtraídas ao esquecimento (2017, Sul, Sol e Sal) e Por Dentro da Crise Olhão e o Algarve no final da Primeira República (2021, Sul, Sol e Sal).
1 – “A MADRUGADA QUE EU ESPERAVA”
Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitámos a substância do tempo.
Sophia de Mello Breyner Andresen
CARLOS ALBINO: UM CIVIL NA REVOLUÇÃO
Muitos foram os algarvios que, estando a viver em Lisboa ou ocasionalmente ali de passagem, foram surpreendidos pelos acontecimentos dos dias 25 de Abril e seguintes e neles acabaram por participar com maior ou menor intensidade. Na sua esmagadora maioria cidadãos anónimos, cujas memórias se perderam já com o fim das suas vidas ou hoje de difícil rastreio, alguns houve, no entanto, para quem esses acontecimentos não foram uma surpresa, além de neles terem tido um papel interveniente e mesmo decisivo. Estão neste caso quatro deles: um civil e três militares.
Jornalista de profissão, crítico e poeta, à altura radicado em Lisboa, onde trabalhava, Carlos Albino foi o civil algarvio com o papel mais interveniente no 25 de Abril. Originário de uma família antifascista de Loulé, onde nasceu, redator do jornal oposicionista República e produtor do programa Limite da Rádio Renascença, foi, pois, sem surpresa, recrutado por Álvaro Guerra, colega de redação do jornal da Rua da Misericórdia, onde trabalhava, para a Operação Viragem Histórica. Se o República, dirigido pelo jornalista Raul Rego, era a mais antiga voz da velha oposição republicana, o Limite, um programa radiofónico transmitido entre a meia-noite e as duas horas da madrugada, preferencialmente escutado pelas camadas mais jovens da população mais despertas a estas horas, distinguia-se pela frescura da música que passava – sobretudo os novos cantautores, malqueridos pela ditadura – e alguns poemas intencionalmente herméticos, para fintar a censura, menos dada às artes da decifração.
Em ligação com os militares do Movimento das Forças Armadas (MFA), através do comandante Almada Contreiras (que lhe tinha sido apresentado por outro oficial, seu amigo, o major Melo Antunes), Álvaro Guerra foi, por sua vez, quem poucos dias antes comunicou a Carlos Albino o nome da canção – Venham mais Cinco, de José Afonso – que aqueles tinham escolhido como sinal radiofónico para dar início às operações no dia 25 de Abril. Carlos Albino lembrou que a canção estava proibida pela censura interna da Rádio Renascença, o que obrigou à escolha, pelos militares, de uma alternativa: Grândola, Vila Morena. Gravada em 1971, em França, no álbum Cantigas do Maio, em jeito de homenagem à Sociedade Fraternidade desta localidade alentejana, Grândola, que falava de fraternidade e tinha como uma das suas estrofes O Povo é quem mais ordena, não estava, no entanto, proibida pelas duas censuras, a interna, da rádio, e a do Estado, que vigorava para todo o país.
Obtida a concordância dos militares, era preciso ultrapassar alguns escolhos à sua concretização, desde logo evitar possíveis desconfianças por parte dos censores, quer internos, quer externos, que pudessem deitar tudo a perder. Daí a decisão de gravar previamente a sequência, de cerca de dez minutos, que iria para o ar no início da madrugada do dia 25: primeiro a quadra Grândola Vila Morena/Terra da Fraternidade/O Povo é quem mais ordena/Dentro de ti ó Cidade, lida pelo locutor do programa Leite de Vasconcelos, depois a canção e, por fim, dois poemas de Carlos Albino, escritos algumas horas antes (o primeiro, intitulado Revolução Solar, o poeta quere-o «um cão farejando coisas novas», o segundo, Geografia, canta o sol que «suave se levanta no horizonte como um cavalo cheio de canções» / «um rio de luz que nenhum ouro faz oscilar na balança»).(1) Para isto tornava-se necessário alargar o segredo a uma terceira pessoa, o técnico e responsável pela sonoplastia do Limite, Manuel Tomás. Curiosamente, Leite de Vasconcelos, o locutor que emprestou a voz à gravação, só posteriormente ficaria a par da totalidade dos factos.
Dia 25 de Abril, 00.20: na presença do censor do Estado, que nesse dia estava de serviço mas desconhecia o que se estava a passar, a sequência previamente gravada é transmitida para todo o país, dando aos militares o sinal definitivo que estes esperavam para poder avançar.
Orgulhoso do feito do seu conterrâneo Carlos Albino, o quinzenário A Voz de Loulé afirmava numa das suas primeiras edições depois da revolução:
«Loulé esteve, desde a primeira hora, com o Movimento das Forças Armadas que libertou o nosso país da tirania fascista. Melhor, ainda antes do Movimento armado eclodir já Loulé lutava, clara e decididamente, para o triunfo da revolução que fez renascer Portugal – graças à ação de um louletano, o conhecido jornalista crítico e poeta Carlos Albino.
Com efeito, Carlos Albino estava perfeitamente ao corrente do que se ia passar, pois que fazendo parte da equipa do programa Limite da Rádio Renascença, que transmitiu a canção de partida para o ataque dos militares revoltosos (Grândola Vila Morena/Terra da Fraternidade), não podia ignorar o combate em que participava e que havia de restituir a liberdade ao nosso martirizado País.
Carlos Albino e os seus companheiros do Limite venceram as malhas tentaculares da PIDE/DGS e deram às Forças Armadas a certeza de que o campo de luta estava desimpedido e o inimigo descuidado.
(…) Sem falsos bairrismos, Loulé pode orgulhar-se, de uma vez mais, ter tido um dos seus filhos a lutarem por uma causa que engrandece – e desta feita tratou-se de derrubar uma ditadura que era uma afronta para o nosso povo, que finalmente pode ser livre.
Obrigado Carlos Albino. (…)»(2)
ROSADO LUZ COM SALGUEIRO MAIA, NO LARGO DO CARMO
Pertencendo embora a ramos diferentes das Forças Armadas, curiosamente, na altura, nenhum deles com tropas sob o seu comando (ainda que por razões diferentes), três oficiais algarvios tiveram um papel de primeiro plano na revolução de 25 de Abril: o capitão de Artilharia António Manuel de Jesus Rosado Luz, do Exército, o primeiro-tenente engenheiro construtor naval Manuel Beirão Martins Guerreiro, da Armada, e o capitão piloto aviador José Inácio Costa Martins, da Força Aérea.
O mais novo dos três, António Rosado Luz nasceu em 1946, em Faro. Nesta cidade, em cujo liceu estudou, duas figuras marcaram-no sobremaneira. O primeiro, Joaquim Magalhães, foi seu professor ao longo de três anos. O segundo, José Afonso, professor na vizinha Escola Comercial e Industrial, que conheceu através de amigos comuns e com quem privou, tornar-se-ia desde então uma referência para si como para muitos outros que, na altura, dele foram alunos.
Para surpresa de muitos dos seus amigos, que conheciam as suas ideias oposicionistas, em 1964, concluído o 7º ano do liceu (atual 11º ano de escolaridade), ingressa na Academia Militar, no curso de Artilharia, que conclui quatro anos depois.
Desde 1968 colocado no Centro de Instrução de Artilharia Antiaérea de Cascais (CIAAC), primeiro de forma intermitente com a Escola Prática de Artilharia (EPA), depois de forma permanente, é, em meados de 1973, mobilizado para a sua primeira comissão de serviço, em Moçambique, que, no entanto, não se chegará a concretizar. Pouco depois desmobilizado, é colocado na Escola Militar de Eletromecânica (EMEL) com o fim de receber formação para operar uma sofisticada e moderna bateria aérea de origem francesa e que se destinava a ser usada em Cabinda, enclave angolano que o Governo português temia que pudesse vir a ser atacado por forças do Zaire (hoje República Democrática do Congo), país a norte de Angola que, na altura, reivindicava a sua posse.
Ao mesmo tempo, frequenta o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF, futuro ISEG), à altura um dos viveiros da contestação estudantil à ditadura (em que se envolve), no qual, depois de uma interrupção de alguns anos, virá a licenciar-se.
Ainda tenente, iniciou a sua participação formal no Movimento dos Capitães na sua primeira reunião, a 9 de setembro de 1973, na Herdade do Monte Sobral, nos arredores de Évora. Por não ter tropas sob o seu comando e pelo seu maior conhecimento do sul do país (além de ser algarvio, tinha uma avó alentejana), caber-lhe-ia, a partir daí e até ao 25 de Abril, a tarefa de assegurar as ligações entre a estrutura dirigente do Movimento, então constituída, e os oficiais das unidades do Alentejo e do Algarve, já engajados na conspiração ou que, não o estando, era preciso atrair para ela. Antes tinha já participado noutras reuniões mais restritas e informais, de contestação, quer ao Congresso dos Combatentes do Ultramar, quer aos decretos governamentais lesivos das carreiras dos oficiais do Quadro Permanente que, desde julho de 1973, agitam o meio castrense e estarão na origem do chamado Movimento dos Capitães.
Como oficial de ligação do Movimento das Forças Armadas, a sua participação na Operação Viragem Histórica começou ao fim da tarde do dia 23 de abril e durou até à manhã do dia 26, uma maratona de quase três dias, em que, praticamente sem dormir, acompanhou e viveu, de forma ativa, quer uma parte importante dos preparativos que antecederam o movimento militar, quer o desenrolar de alguns dos seus momentos mais decisivos.
A 23 de abril, no Parque Eduardo VII, em Lisboa, primeira etapa dessa longa maratona, foi um dos quatro oficiais de ligação (cada um, conforme o combinado, com o jornal do regime A Época debaixo do braço, para evitar suspeitas), a quem coube receber das mãos de Otelo Saraiva de Carvalho os envelopes com as instruções finais que, na data prevista, tão determinantes iriam ser para o sucesso do movimento. Como relatou, mais tarde:
«Cada um de nós iria receber do Otelo dois conjuntos de envelopes. Cada envelope era destinado a uma unidade que tinha missões a cumprir e continha dois documentos militares: o “Anexo de Transmissões” e as “Instruções de Coordenação”. Aqueles documentos, que tinham sido elaborados pelo Tenente-Coronel Garcia dos Santos, eram os últimos Anexos da Ordem de Operações que os nossos Delegados das unidades com missão já haviam recebido pessoalmente dias antes. Estes Anexos são sempre a última parte da Ordem de Operações, pois contêm a matéria mais sensível e secreta que só à última hora pode ser conhecida para não haver quaisquer hipóteses de surpresa. É lá que estão todos os códigos, frequências-rádio, horários e senhas – como a “Grândola”, aquela que se tornou historicamente o mais famoso símbolo do 25 de Abril. Os envelopes estavam em duplicado porque, para maior segurança, cada elemento de ligação tinha nas proximidades, à sua espera, um outro camarada que era o seu “asa”, a quem era destinado o 2º exemplar. A missão do “asa” era percorrer, nessa mesma noite, o mesmo percurso mas por estradas diferentes e com meia hora de desfasamento. (…) A cena da entrega dos “Anexos” no Parque Eduardo VII foi surreal. O Otelo estava calmamente sentado num banco do jardim com uma enorme pasta de papéis e nós deambulávamos por ali, solitários, ostentando todos idêntico “ar distraído”, mas todos com o mesmo cabelinho curto e o mesmo ar indisfarçável de militares, simulando não nos conhecermos mas todos com o mesmo incrível jornal debaixo do braço. Após uma “disfarçada” troca de olhares e à vez, cada um de nós aproximava-se do Otelo, sentava-se ao seu lado “como quem não quer a coisa”, e ele, com o ar mais “natural” do mundo abria pasta e retirava de lá dois enormes conjuntos de envelopes que entregava a cada um de nós. Depois, como aconteceu no meu caso, levantávamo-nos os dois e cada um de nós ia para o seu automóvel, estacionado mais acima. No meu caso, arranquei, estacionei o meu carro ao lado do dele, abrimos ambos os porta-bagagens dos nossos carros e o Otelo transferiu do dele para o meu dois volumosos rádios de telecomunicações militares TR28 Racal. Fechei o meu porta-bagagens, fui à minha vida e o Otelo regressou ao seu banco de jardim para nova cena semelhante.»(3)
Cumprida a missão, depois de uma longa viagem de ida e volta, madrugada adentro, entre Lisboa e o Algarve, ao volante do seu Fiat 128, regressa na manhã seguinte a tempo de, sem levantar suspeitas, «fardado e barbeado», almoçar no refeitório de sempre, na EMEL e assistir nessa tarde, como habitualmente, à aula de Francês do Curso que aí estava a frequentar.
Segunda etapa da maratona iniciada ao fim da tarde de23, a noite decisiva de 24 para 25 foi uma vez mais em grande parte passada ao volante, neste caso entre um dos dois centros auxiliares de ligação (o CAL 1, a funcionar num apartamento clandestino, em Campo de Ourique, de onde, nos intervalos das viagens, comunicava através de um telefone fixo com o Posto de Comando, na Pontinha, sobre o movimento de tropas no terreno e outras ocorrências) e as diversas unidades militares em operações, na área da capital, a que era necessário acudir para resolver problemas ou muito simplesmente recolher ou transmitir informações.
Ao início da tarde do dia 25, o seu trajeto cruza-se com o das tropas que sob o comando do capitão Salgueiro Maia cercam o Quartel da GNR, no Largo do Carmo, onde, desde a manhã, Marcelo Caetano se tinha refugiado. Chegado à Baixa da capital, estaciona o carro nas imediações dos Armazéns do Chiado e, a partir daqui, dirige-se a pé para o Largo do Carmo. Nas horas seguintes, até à rendição de Marcelo Caetano, meio à civil, meio à militar (envergava uma camisola civil e, por cima, uma camisa militar com as divisas de capitão que despia e voltava a vestir, consoante era preciso passar despercebido ou comunicar com os militares em operações no terreno) cumprirá diversas missões, quer de neutralização e aliciamento para o lado dos revoltosos das tropas governamentais que, na zona, se opunham às do MFA, quer de ligação entre as tropas de Salgueiro Maia e o Posto de Comando. Foi, nestas circunstâncias, o oficial a quem coube, mais uma vez ao volante do seu carro, ir à Pontinha buscar a ordem por escrito de Otelo que autorizava Maia a bombardear o Quartel da GNR, desta forma, forçando Marcelo a render-se.
Muito crítico em relação à condução do processo político por Spínola logo a seguir ao 25 de Abril, não esconde até hoje a sua objeção à decisão da Junta de Salvação Nacional de exilar os dois responsáveis máximos da ditadura para o Brasil, sem julgamento, afinal tudo o contrário do que, com toda a «ingenuidade» dos seus 27 anos, assegurara a Marcelo, quando este, após a rendição, já preso, lhe perguntara:
«”E agora, senhor capitão, o que é que me vai acontecer?” Este era um tema para o qual eu (e nenhum de nós) estava preparado. (…) Como não lhe podia de forma alguma revelar que não tínhamos minimamente pensado nisso, disse-lhe aquilo que eu e muitos de nós pensávamos que deveria acontecer. (….) “Senhor Presidente do Conselho, Vossa Excelência irá ser detido e, posteriormente, será naturalmente julgado. Porém, Vossa Excelência, será sempre tratado com o respeito e a dignidade inerentes ao seu cargo. O seu julgamento como principal responsável pelo regime será naturalmente público e será feito de acordo com todas as regras do direito internacionalmente reconhecidas. (…) Mais do que pessoas, aquilo que pretendemos julgar é um sistema político e económico, um “regime” para que ele nunca mais se repita. (…)”
Eramos deveras naïf. Poucos dias depois desta conversa, (…) Spínola e Costa Gomes (…) enviaram para o exílio Américo Tomás e Marcelo Caetano (…), impedindo, conscientemente, com isso, não só o tal “julgamento do regime ditatorial fascista”, como o próprio julgamento de todos os seus torcionários e assassinos, nomeadamente a PIDE.»(4)
A seguir ao 25 de Abril foi delegado do MFA no CIAAC e, depois do golpe fracassado de 11 de março, empossado como comandante do Forte de Almada, uma das unidades da cintura industrial de Lisboa que, no quadro político revolucionário da altura, mais se distinguiu no apoio às populações e melhor corporizou o que então se chamava a aliança Povo-MFA:
«Nós, os militares, éramos chamados a toda a hora para resolver os problemas mais comezinhos ou mais graves do povo, das populações, dos trabalhadores.»(5)
Depois do 25 de novembro é suspenso de funções e proibido de entrar em qualquer unidade militar. Julgado, por fim, em 1980, em Conselho de Disciplina, é ilibado das acusações que pesam sobre si, após o que regressa às fileiras do Exército. Promovido a coronel, em 1999, requere a passagem à reserva, vindo posteriormente a desempenhar diversas funções civis, na área da gestão, no país e no estrangeiro. É detentor da Gã Cruz da Ordem da Liberdade.
MARTINS GUERREIRO: A PARTICIPAÇÃO DA ARMADA
Casado, pai de três filhos, outro destes três militares, Manuel Beirão Martins Guerreiro nasceu em 1940, em S. Brás de Alportel, no sítio da Fonte da Murta, na fronteira deste concelho com o de Faro. Da sua infância e adolescência, em contacto permanente com a natureza e as dificuldades da vida daquele tempo, recorda as brincadeiras «no recreio da escola ou mesmo na estrada», «a liberdade de correr pelos campos», «a descoberta dos ninhos dos pássaros nas árvores», «a apanha dos frutos secos», «a seca dos figos no almeixar», a ida às «fontes e bicas dos Vilarinhos», fruto das limitações então existentes no abastecimento de água ao domicílio, «a falta de eletricidade» ou as inefáveis palmatoadas e chapadinhas dadas ora pelo professor, ora pelo padre na escola primária e na catequese.(6)
Concluído o liceu, em Faro, ingressa em 1959 na Escola Naval, que frequentará até ao ano de 1962, antecâmera da sua primeira e única comissão de serviço, na Guiné, a bordo de uma fragata, e no decurso da qual a guerra teve início nesta colónia.
Entre 1965 e 1969, frequenta em Génova o curso de Engenharia Naval e Mecânica. Este facto, a par de algumas viagens que então fez a outros países europeus, tal como a Itália com regimes democráticos, permitir-lhe-á conhecer novas realidades políticas e sociais, muito diferentes da que, nessa altura, era a portuguesa. Regressado a Portugal, passa, a partir de 1970, a integrar como engenheiro a Direção Geral de Construções Navais. Ao mesmo tempo, participa com outros oficiais em diversas iniciativas destinadas a elevar a consciência social e política do pessoal da Marinha, seja por via legal, no âmbito das atividades do Clube Militar Naval ou dos jantares de curso dos cadetes da Escola Naval, seja mesmo por via clandestina (como foi o caso, em 1970, da criação de uma organização clandestina de oficiais da Armada, de que foi um dos fundadores).
Em fevereiro de 1974, com o Movimento dos Capitães já em curso, participa com o major Ernesto Melo Antunes, do Exército, e o capitão-tenente Carlos Almada Contreiras, da Armada, em várias reuniões preparatórias (algumas delas em sua casa) do que viria a ser, com o contributo de mais militares, o Programa do Movimento das Forças Armadas. Alguns meses antes, em abril de 1973, tinha sido um dos oficiais do futuro MFA que tinham estado presentes no III Congresso da Oposição Democrática, em Aveiro, cujas teses vieram mais tarde a inspirar os três D – democratizar, descolonizar e desenvolver – do programa redigido pelos militares. Mais politizados, como, de resto, a generalidade dos seus camaradas do mesmo ramo, Martins Guerreiro e Almada Contreiras tinham ainda em comum o facto de pertencerem desde 1970 à já referida organização clandestina de oficiais da Armada, de clara oposição ao regime.
Sem missões atribuídas na Ordem de Operações, a Marinha adotou inicialmente uma posição de neutralidade ativa, ou seja, de garantir que nenhuma força sua agiria contra as do MFA (posteriormente uma força de fuzileiros participaria na tomada da PIDE/DGS).
No dia 23, Martins Guerreiro entrega ao comandante da Força de Fuzileiros e futuro membro da Junta de Salvação Nacional Pinheiro de Azevedo (com Rosa Coutinho, um dos dois indicados pela Armada) a Ordem de Operações. Na noite de 24, Vítor Crespo, que integra com Almada Contreiras e Martins Guerreiro a cúpula da direção do MFA na Marinha, passa pela casa deste, em Algés, para ultimar os pormenores da ação deste ramo das Forças Armadas.
Com um mesmo objetivo – coordenar a ação do MFA da Marinha e fazer a ligação às respetivas unidades – os três distribuem-se, nas horas seguintes, por sítios diferentes. Vítor Crespo junta-se a Otelo, Garcia dos Santos, Vítor Alves e outros no Posto de Comando, na Pontinha. Almada Contreiras fica no Centro de Comunicações da Armada, na cave do Ministério da Marinha, de que é o diretor. Entre o seu posto, na Direção Geral de Construções Navais, no edifício do Ministério da Marinha, e a rua, por entre as tropas em movimento, nas imediações do Terreiro do Paço, Martins Guerreiro tem como missão coordenar os «contactos com as diferentes unidades da Marinha no sentido de neutralizar qualquer ação da hierarquia contra o MFA».(7)
Já ao fim da manhã, como tinha ficado decidido fosse qual fosse a evolução dos acontecimentos, coube-lhe entregar no jornal República o programa original do Movimento das Forças Armadas. Assoberbado com as notícias sobre as operações militares em curso, o jornalista Álvaro Guerra, que recebeu o documento, não deu a devida atenção ao assunto e o programa só seria publicado por este jornal no dia seguinte, já depois de duas alterações de monta entretanto impostas por Costa Gomes e Spínola: a continuação da PIDE/DGS nas colónias e o não reconhecimento do direito à autodeterminação dos seus povos.
Quando, finalmente, «cerca das 17.00», saiu «para a rua fardado sem tarefa específica mas com o propósito de tomar pulso à situação no Carmo e no Largo do Chiado», Martins Guerreiro – como recordou muitos anos depois – «quase não conseguia avançar»:
«Demorei mais de uma hora a fazer o trajeto do Ministério da Marinha ao Largo do Chiado, a cada passo era abraçado e beijado pelas muitas pessoas jovens e menos jovens que estavam na rua em euforia, plenas de alegria e liberdade, a explosão de alegria e a sensação de liberdade foram extraordinárias.»(8)
Ao início do dia 26, de regresso ao Ministério, à entrada, querem saber por onde andou:
«Entro e digo-lhes que estão completamente desfasados, o regime anterior já caiu. O tempo é outro, dentro em pouco, se ainda não sabem, saberão quem manda no País e quem compõe a Junta de Salvação Nacional.»(9)
Figura destacada do MFA no período revolucionário, foi, nos meses a seguir ao 25 de Abril, Chefe de Gabinete de dois Chefes de Estado-Maior da Armada, Pinheiro de Azevedo e Felgueira Soares, membro do Conselho da Revolução entre 1975, quando foi criado, e a sua extinção em 1982, na sequência da revisão constitucional desse ano, bem como um dos negociadores, pelos militares, dos dois pactos MFA-Partidos. No 25 de novembro contribuiu para evitar a intervenção da Marinha, conseguindo que esta obedecesse à cadeia de comando representada a nível superior pelo Presidente da República, general Francisco Costa Gomes.
Hoje aposentado, na patente de contra-almirante, é detentor da Grã-Cruz da Ordem da Liberdade. Entre 2016 e 2021 foi diretor de O Referencial, revista da Associação 25 de Abril.
COSTA MARTINS: A OCUPAÇÃO DO AEROPORTO DE LISBOA
O mais velho destes três militares algarvios, José Inácio Costa Martins – o Zeca, como era conhecido entre familiares e amigos – nasceu em 1938, em S. Bartolomeu de Messines, no concelho de Silves.
Aos dezoito anos, na altura com o 6º ano dos Liceus (atual 10º ano de escolaridade) alista-se na Força Aérea como voluntário no cumprimento do serviço militar obrigatório. Concluída a especialidade no Curso de Sargentos Milicianos e obtido o brevet de piloto aviador, completa os estudos liceais e concorre à Academia Militar, na qual, no entanto, só será admitido dois anos depois, em 1959, à terceira tentativa. Já oficial, a que ascendeu com a mais alta classificação do seu curso, é, em 1965, mobilizado para Angola, onde, até 1969, cumpre duas comissões de serviço.
Neto de um republicano e industrial corticeiro, que começara a vida como operário deste setor, começou muito cedo a manifestar simpatia por ideias oposicionistas. Em 1958, apoiou publicamente a candidatura à Presidência da República do general Humberto Delgado. Esse facto, bem como outros relacionados com o seu espírito inconformista ou com as suas ideias oposicionistas, estiveram na origem de algumas querelas que, ao longo do tempo, manteve com a hierarquia militar, nomeadamente em Angola, onde foi punido disciplinarmente por três vezes com prisão. Em 1969, tem o seu primeiro grande braço de ferro com o Estado português – neste caso ainda ditatorial – um entre os três que terá ao longo da vida, e dos quais sairá invariavelmente vencedor. Na linha de práticas semelhantes em que o regime era useiro e vezeiro, é preterido na promoção a capitão, enviado a uma Junta Médica, declarado incapaz para o serviço e passado compulsivamente à reserva. Convicto das razões que lhe assistem, o jovem oficial ameaça recorrer da decisão, conseguindo não só a sua readmissão no ativo nas fileiras da Força Aérea como também ser ressarcido de todos os direitos de que nesse entretanto tinha sido privado.
Em outubro desse ano, durante a campanha para as eleições legislativas, a pedido da Oposição, que pretendia realizar uma ação de esclarecimento eleitoral em S. Bartolomeu de Messines, empresta para esse efeito um armazém propriedade dos pais.
No posto de capitão desde 1969, membro da primeira Comissão Coordenadora do MFA da Força Aérea, constituída a seguir à reunião de Óbidos, nos fins de 1973, foi o oficial deste ramo que desde o início defendeu com mais entusiasmo o derrube da ditadura, o que, mais uma vez, lhe trouxe problemas, quer com as autoridades militares que, conhecedoras do facto, em fevereiro, tentam, sem sucesso, afastá-lo do país (foi o primeiro oficial a sofrer retaliações pelo seu envolvimento no Movimento dos Capitães), quer com muitos dos seus próprios camaradas:
«Costa Martins foi dos oficiais que desde muito cedo defendeu com clareza que os graves problemas com que à época se debatiam as Forças Armadas não se resolveriam apenas com o recurso a soluções corporativas. Ao contrário de outros, considerava que as múltiplas e profundas feridas abertas na instituição militar pelo penoso arrastar da guerra colonial só sarariam com a derrota incondicional da ditadura que asfixiava e empobrecia o país. Sempre o ouvi defender que o derrube do Governo e a democratização do regime eram condição sine qua non para alcançar a paz e, com ela, o prestígio da função militar desgastado por uma guerra sem nexo nem fim à vista.
(…) Muitos dos seus pontos de vista nem sempre foram acolhidos com simpatia pela generalidade dos seus camaradas do ramo. Quando se abordavam certos temas, como por ex. a destituição do Governo, o reconhecimento do direito dos povos das colónias à autodeterminação e independência ou a extinção dos órgãos do aparelho repressivo do regime, o Costa Martins confrontava-se frequentemente com a discordância e, por vezes, até com inusitada hostilidade de alguns dos seus interlocutores.»(10)
Sem surpresa, a Força Aérea foi o ramo das Forças Armadas com menor envolvimento no movimento militar. Nas vésperas do 25 de Abril, para-quedistas e aviadores escusaram-se a participar, garantindo, no entanto, que não agiriam contra as forças do MFA. Deste modo, a participação da Força Aérea não foi, inicialmente, além da de alguns poucos oficiais que, a pedido de Otelo, constituíram o comando que veio a ocupar o Rádio Clube Português (na tarde do dia 25, forças de para-quedistas viriam a aderir ao movimento militar, rendendo outras que desde o início estavam em operações no terreno).
Costa Martins, que tinha participado na organização da força ocupante do Rádio Clube Português mas sem a integrar, teve, por sua vez, duas importantes missões:
– Contactar o locutor João Paulo Dinis, o responsável pela passagem da canção que, às 22.55 do dia 24 de abril, nos Emissores Associados de Lisboa, daria o primeiro sinal para o início das operações militares – E depois de um adeus, de Paulo de Carvalho, semanas antes vencedora do Festival da Canção;
– Acompanhar, em termos de assessoria técnica, a força da Escola Prática de Infantaria (EPI), de Mafra, que tinha à sua responsabilidade a ocupação do Aeroporto de Lisboa.
Na madrugada do dia 25, foi o primeiro a chegar ao Aeroporto, e como as tropas da EPI se tivessem atrasado, dirigiu-se para a sua parte militar e “ocupou” a mesma, sozinho, munido para tanto de «uma pasta de cabedal, uma pistola-metralhadora, umas granadas e um radiozito».(11) Como o próprio relatou anos depois:
«(…) Devia estar lá às três e meia da manhã (…), junto com o capitão [Rui] Rodrigues, que vinha de Mafra. Só que eu cheguei ao aeroporto, faltavam para aí cinco minutos, (…), e resolvi ir primeiro tomar a base aérea que era para não haver confrontos, tiros … O sentinela abriu-me a porta, entrei, fui ao gabinete do oficial de dia e aí tive sorte. Eram dois tenentes que estavam de serviço, um de oficial de dia e outro de prevenção e estavam a dormir os dois, vestidos, encostados, mas a dormir:
– Então vocês de serviço e a dormir?
E eles:
– Não, não. Nós não estávamos a dormir…
Perguntaram-me o que é que havia:
– Nada de especial, só uma revolução. (…) Tenho tudo cercado de tropa, portanto eu não quero aqui tiros, vocês são os responsáveis… (…) Quem manda aqui a partir de agora sou eu.
(…) Mais tarde apareci nos jornais como uma espécie de “rambo”, que tinha ocupado o aeroporto sozinho, mas isso não é verdade. Eu ocupei sozinho a base aérea e estive com ela nos braços durante meia hora…»(12)
Já depois da chegada da força da EPI e da ocupação da parte civil do aeroporto, esta em conjunto com Rui Rodrigues, sobe à Torre de Controlo e daí manda interditar o espaço aéreo português a aviões comerciais e militares, neste caso sem autorização do MFA. No final, caber-lhe-ia ainda uma última missão: preparar a aeronave que, no dia seguinte, transportaria Tomás e Marcelo para o Funchal.
Como se viu, um dos militares com papel destacado nas operações que conduziram à deposição do regime ditatorial, foi também um dos que, durante o período revolucionário, lhe coube desempenhar funções de maior responsabilidade.
Na qualidade de membro da Comissão Coordenadora do MFA, integra a partir de final de maio de 1974 o Conselho de Estado, órgão misto composto por militares e personalidades civis de relevo. Em julho, é empossado como Ministro do Trabalho do II Governo Provisório, presidido por Vasco Gonçalves, cargo em que se manterá até ao fim da vigência do V Governo, em setembro de 1975. A partir de final de março de 1975, passa também a integrar o recém-criado Conselho da Revolução. Afastado deste órgão, na sequência das alterações políticas ocorridas no final do verão desse ano, será também, na ressaca do 25 de novembro, já no posto de major, um dos oficiais que mais sofrerá as consequências do seu engajamento no processo revolucionário. Sujeito a um mandato de captura, é obrigado a exilar-se em Angola, vindo, entretanto, a ser passado compulsivamente à disponibilidade. Preso e torturado neste país, a seguir aos sangrentos acontecimentos de 27 de maio de 1977, viria a ser libertado um ano depois, sem nunca ter sido processado ou julgado.
Regressado a Portugal, os anos seguintes foram por si em grande parte dedicados à reabilitação do seu bom nome, gravemente atingido por duas situações: a acusação de desvio de fundos do Dia de Salário para a Nação, quando era Ministro do Trabalho, e a “expulsão” das fileiras da Força Aérea, na sequência do 25 de Novembro. Mais uma vez em litígio com o Estado português, veria, em ambos os casos depois de longos processos, reconhecida a legitimidade das suas razões. Em 1984, é inocentado no caso do Dia do Salário para a Nação e, em 1991, reintegrado na Força Aérea, no posto de coronel, com todos os direitos de que, entretanto, tinha sido privado. Em 1985 foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade pelo seu contributo para a deposição do regime ditatorial.
Morreu em 2010, em Montemor-o-Novo, em consequência da queda de uma avioneta.
A JUVENTUDE E A REVOLUÇÃO
Quem pesquisar imagens dos dias iniciais da revolução (em fotografia ou filme) não pode deixar de notar a presença de grande número de jovens nas ruas. Nos acontecimentos do dia 25, nas manifestações que se seguiram por todo o país, nas múltiplas iniciativas populares das primeiras semanas, os jovens foram uma presença constante, contribuindo, de forma efusiva, para o ambiente de festa e catarse coletiva que caracterizou a revolução nos seus primeiros tempos. Resultado – é certo – de um maior peso demográfico das camadas jovens no conjunto da população, na altura menos envelhecida do que hoje, o facto não pode, ainda assim, ser dissociado da situação concreta que o país vivia naquela altura e dos dois grandes problemas que, em termos imediatos, até aí mais condicionavam a vida dos portugueses, particularmente dos jovens: a falta de liberdade e, sobretudo, a guerra, que, afetando embora o conjunto da população, era obviamente mais sentida por estes.
Remetidas, de Lisboa, a seguir ao 25 de Abril, por quatro destes jovens, para um amigo comum, na altura a cumprir o serviço militar obrigatório numa das colónias portuguesas em guerra (o autor deste estudo), as cartas, de que, mais adiante, se transcrevem algumas passagens, são um testemunho precioso da forma como cada um deles viveu estes dias. Duas delas foram escritas por estudantes (um, estudante universitário, outra, mais nova, ainda estudante liceal), as outras duas por militares, um dos quais a prestar serviço no Regimento de Engenharia 1, na Pontinha, onde, como se sabe, funcionou o Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas. Três são algarvios. Embora lisboeta, a jovem, pertencente a uma família antifascista, tinha uma ligação forte ao Algarve, onde, desde criança, passava férias com os pais.
Uma mais contida e racional, outras mais emotivas e exuberantes, diferentes entre si, no estilo ou na abordagem dos assuntos, as cartas partilham um sentimento comum de regozijo. Da autoria de um destes jovens, aluno de Económicas, uma das escolas superiores da capital com um historial maior na luta contra a ditadura, a primeira carta de que aqui se trata é, logo desde o seu começo, elucidativa desse sentimento:
«Olá rapaz.
Nem creio que esperes outra coisa: parabéns pela liberdade. Podes dizer que quase te estou a escrever de um mundo diferente. (…) O que aconteceu estava tão longe de qualquer previsão que é difícil aí imaginares bem a extensão da “volta” que a situação deu.»(13)
Iniciada a 30 de abril, a carta, extensa, num total de oito páginas, foi escrita às “prestações”, ao longo de vários dias. Através dela é-nos possível acompanhar alguns dos momentos mais marcantes da revolução, seja no próprio dia 25, seja nos seguintes. O relato, que o seu autor faz de um desses momentos, ao início da tarde do dia 25, fala por si:
«Quando chegámos perto do Camões, estavam dois blindados neste largo. Pensámos que fossem do MFA (…) Estivemos ali um bocado, admirados por vermos alguns GNR junto dos soldados. E mais admirados ficámos quando chegaram alguns “jeeps” com mais. Pensávamos que fossem GNR que tivessem aderido. Sabíamos que o Quartel do Carmo, centro da GNR, estava cercado e que o Marcelo estava lá, e dizia-se que também o Tomás (o que não era verdade). Estávamos a fazer conjeturas sobre o facto de o canhão do tanque estar apontado na nossa direção, quando ouvimos num rádio que as forças da GNR que ali estavam se faziam passar como fazendo parte do movimento, mas que na realidade não eram. Só quando viemos a casa e ouvimos uma gravação do comandante dessas forças a comunicar por rádio é que compreendemos que os blindados eram ainda do governo e não do MFA. Nessa gravação o próprio tipo dizia que a população não os hostilizava porque pensava que pertenciam ao “outro lado”.
Fomos até ao Camões outra vez. Aí a situação estava curiosa. Junto da zona da Trindade, estava uma força do MFA metida entre GNR dos dois lados. Mas como o grosso das forças estava no Carmo, a GNR não tinha grandes hipóteses. Passámos assim junto das duas forças, primeiro junto da GNR, depois junto do MFA, e depois no Largo da Misericórdia mais GNR até ao cimo de S. Pedro de Alcântara. (…)
Depois de comer, vimos a Emissora com tropas dentro. Era tudo sorrisos. Mais abaixo fica a esquadra da PSP. Ninguém junto dela. À janela estava um polícia com cara de aborrecido.»
Outro momento, ao princípio da noite do mesmo dia 25, já depois da rendição de Marcelo Caetano, mereceria do autor da carta uma atenção semelhante:
«Aí vinha uma manifestação, com uma autometralhadora apinhada de gente, mais um jeep também carregado. A manifestação já era das maiores que tinha visto até aí. Só o facto de estar numa manifestação, sem estar com o pé pronto para dar o fora, se viesse a polícia, só isso foi uma sensação de libertação. Chovia, mas que se lixasse a chuva. A manifestação foi até ao Cais de Sodré e aí subiu a Rua do Alecrim até ao Camões. Aí viraram e foram para a Rua António Maria Cardoso, tristemente célebre porque aí ficava a sede da PIDE. Aí a manifestação parou e começaram a gritar contra a PIDE e a atirar pedras contra o edifício. Houve então um movimento de alarme, e houve uma fuga desordenada. Mas alguns ficaram, e a malta de novo começou a chegar-se. Então houve um segundo movimento de fuga, estava eu ainda a pensar em voltar para trás, pensando tratar-se de um alarme falso, quando começo a ouvir uns tiros secos. Arranquei a correr, assim como todos à minha volta. Foi a primeira vez que ouvi uma metralhadora, e não é nada agradável saber que estava no lado mais chato da coisa. Fomos parar perto do Teatro da Trindade e aí olhei para baixo e vi dois corpos sobre a linha do elétrico. Os cães ainda tinham dentes e não ladraram, morderam. E, apesar dos tiros, o pessoal não desistia. Foram chamar as tropas e exigiram o assalto da sede da DGS. Estive lá até às 9 horas da noite, mas embora os tivessem cercado, não tentaram o assalto. No outro dia ainda lá estavam as tropas e ainda não tinham feito o assalto. Os tipos depois renderam-se, mas houve alguns (muitos) que se escaparam por zonas não vigiadas e outros por subterrâneos que davam a outras casas, segundo se dizia.»
Noutra passagem, o autor da carta destaca «a quantidade de pessoas e a agitação que havia nas ruas. Todos queriam saber o que se passava, alguns tinham rádios pequenos. Trocavam-se “bocas”. Todos agitados, na expectativa, ansiosos.» Na Praça do Comércio e zonas próximas, «o povo tinha-se aglomerado junto às Forças Armadas, começando a aplaudir, dando cigarros e flores aos soldados».
«Eram comuns os slogans “Abaixo a guerra colonial”, “O Povo unido jamais será vencido”, “Morte à PIDE”, etc., etc. Os cravos vermelhos tornaram-se os símbolos da revolução a ponto de no estrangeiro se [lhe] chamar a “flower revolution”. O povo acarinhou as Forças Armadas, dava-lhes tudo desde tabaco a mantimentos, flores, etc. Os próprios soldados compartilhavam as rações com os civis. Nunca houve memória de uma revolução feita pelo Exército em que o povo se juntasse assim a eles. Viam-se cravos até nas G3, metidos nos canos. Foram dias em que todo o país, mas especialmente Lisboa, andou na rua a pular de alegria, de emoção. 48 anos de fascismo, a PIDE odiada por todo o país, tudo isso tinha caído (…).»
Na sexta-feira, «houve uma “procissão” a Caxias, foi tanta a gente que a malta do Técnico e similares exigiram um comboio só para eles. Fizeram tanto barulho que anunciaram logo o comboio. Depois, como não “tínhamos” dinheiro, foram todos à borla». O domingo, dia 28, foi outro «ponto alto: o regresso de Mário Soares», logo de manhã. «O comboio chegou com 55 minutos de atraso, era o Sud Express, parece-me. A gare de Santa Apolónia estava apinhada de gente. (…) Mário Soares apareceu, falou as “palavras de ocasião”, apareceram outras figuras também queimadas pelo regime, entre as quais a viúva de Craveiro Lopes». E, mais adiante, o autor da carta prossegue:
«Juntamente com as manifestações “pedestres”, havia as manifestações motorizadas, carros e mais carros a fazerem um chinfrim desgraçado com as buzinas, as pessoas lá de dentro acenando, etc., etc. Uma autêntica loucura. No Rossio resolveram tomar a antiga sede da MP para sede da CDE. Houve uma rusga lá dentro e daí a bocado voavam retratos do Caetano e do Tomás, bandeiras da MP, etc.»
Em termos de participação popular, o dia 1 de Maio, o momento culminante do processo iniciado no dia 25, foi, naturalmente, um daqueles que mais espaço ocupou neste relato:
«De quarta há muito a contar. Era 1 de Maio. O primeiro em que se podiam manifestar livremente. Anteriormente tinha havido apelos sucessivos no sentido de a coisa se fazer ordeiramente e havia uma orientação para a coisa. Mas o que se seguiu ultrapassou todas as expectativas. [Depois] da grande festa da libertação a que o país se tinha entregado, o 1º de Maio foi o dia da “grande procissão” em que o santo era o trabalhador, a cor dominante era o vermelho e por vezes brandia-se a foice e o martelo, num país onde isso, uma semana atrás, podia significar morte. A hora da concentração era às 3 h, mas às duas e meia a malta quase que não conseguia arranjar lugar num metro superlotado. (…)
Chegados à Alameda Afonso Henriques descobrimos que em vez da fonte monumental do Salazar, havia ali era um mar de gente e que até não era do Salazar. Desistimos de encontrar quem quer que fosse naquela multidão. A Alameda e ruas vizinhas estavam apinhadas. Cartazes, dísticos, de sindicatos, do PCP, da CDE, de trotskistas, de tudo um pouco, até anarquistas. O “país despolitizado” saltou para a rua e deu uma lição. De princípio, quando fui para lá, não estava a gostar da coisa, estava a achar tudo demasiado organizado, demasiado fascista. Mas quando comecei a ver o pessoal que lá estava, não havia dúvidas que o povo se tinha deslocado ali em peso. O itinerário era para o Areeiro, depois por umas avenidas até ao estádio da FNAT. A seguir ao Areeiro estava um prédio em construção. Fomos lá para cima e não havia dúvidas que o ponto era bom. Mais tarde, esse prédio foi designado como uma “cascata de gente” ou “montanha viva” ou coisa parecida. Nós estávamos talvez para o 5º ou 6º piso. Não conseguimos ver o princípio da manifestação nem o fim e estivemos lá para cima de 3 horas ou mais. Quantos milhares de pessoas não imagino, mas garanto-te que talvez fossem centenas de milhares. Era incrível, só por si, sem falar no facto de ser “aqui”. Era como que a certeza de que de facto não era sonho a “mudança”. Passavam em grupos, cada grupo com centenas de pessoas. Sindicatos, grupos políticos, grandes políticos exilados (Álvaro Cunhal, por exemplo, do PCP), tudo, tudo. A ladear a manifestação, só povo, gente com fartura. Houve um francês que disse que só tinha visto algo parecido na libertação de Paris, na 2ª Grande Guerra. Acho que foi o espetáculo mais grandioso que vi na minha vida, até hoje. Era mais que o 1º de Maio. Era também uma libertação.
Pode-se dizer que ainda há muito a fazer, que isto foi apenas uma libertação, não tão grande quanto se imagina, pode-se pôr todas as restrições que se queira, mas nada disso pode apagar o que foram aqueles dias. Se algum dia tive a impressão que estava a viver factos que ficavam como importantes na história, estes foram com certeza.»
GUERRA, NÃO “INDEPENDÊNCIA É A SOLUÇÃO”
No final, o relato, nesta parte escrito já em meados de maio, dá conta de algumas das mudanças entretanto ocorridas bem como do novo ambiente que, desde o dia 25 de Abril, se vivia no país:
«Depois do 25 de Abril, do 1 de Maio, a coisa agora está “normal”, só que com uma normalidade de outro género. Desenham-se partidos, outros já estão consolidados, há uns princípios de lutas políticas, embora ainda seja a Junta de Salvação Nacional que domina a coisa. (…) Champalimaud ao ataque. Diz que isto está tudo ótimo e parece que não se atemoriza mesmo nada com uma possível viragem à esquerda. No fundo é um indivíduo inteligente, capaz de fazer o seu jogo em quaisquer circunstâncias. Sabe que de momento o capitalismo não deve ir ao ar e baseia-se nisso para o transformar numa necessidade (de desenvolvimento). Os problemas nas fábricas resolvem-se, como parece que agora já está a resolvê-los. Como não tem a proteção do Estado, agora faz certas concessões que dantes não fazia. (…) Aliás, os trabalhadores só lhe pedem mais um pouco, nunca lhe pedem tudo.
Por toda a parte vêm os empregados pedir a demissão dos administradores. Os CTT, os TLP, a CP, a TAP, jornais, RCP, etc., enfim parece que vai haver uma remodelação da estrutura “tachal” (do tacho). Os sindicatos começam a movimentar-se no sentido de se tornarem uma força no equilíbrio político. (…) Também é possível aparecer uma direita (extrema) a fazer o que antes condenavam à esquerda (…) Há boatos acerca da possibilidade da PIDE se organizar na clandestinidade. Para já houve um assalto a um banco, de que se suspeita ter sido praticado por algum pide.»
Sobre o «Ultramar», «a pedra no sapato» da nova situação política, e a hipótese de «a bandeira verde-rubro» continuar a «fazer sombra sob o calor dos trópicos», agora através de uma federação, como, poucos meses antes, Spínola defendera no seu livro Portugal e O Futuro (o que, a acontecer, implicaria a continuação da guerra), a opinião do autor da carta não era diferente da que na altura era partilhada pela generalidade dos jovens:
«Eu duvido e “a maioria está de acordo”. Independência é a solução. Tudo o resto é adiar. Se a Junta for teimosa, pode pôr tudo o que tem feito em cheque.»
Também extensa e rica em informação, uma outra carta, escrita na mesma altura pela jovem estudante lisboeta atrás referida, pouco difere da anterior no ambiente que descreve, a não ser no tom mais emotivo que emprega:
«Lisboa, 12/5/1974
Amigo e camarada!
Viva a Liberdade!
Viva a Revolução!
Viva Portugal!
Viva a alegria de podermos viver num país onde já se pode lutar pela igualdade, sem nos sentirmos oprimidos pelas garras ferozes de uma prisão!…
Agora estamos a viver num país belo e por isso temos que estar mais unidos do que nunca para lutar pela construção de um futuro firme e seguro. (…)»(14)
E, a seguir, num registo de tipo cronológico, mas não menos emotivo, por vezes até poético, esta jovem prossegue:
«25 de Abril – Estava um dia calmo, ameno, de sol fraco. Perto das 8 horas da manhã, hora em que fui para as aulas, parte das pessoas, assim como eu, não sabiam o que se estava a passar. (…)
Cheguei à escola e estavam a mandar a malta embora. Despedi-me das minhas colegas e vim rapidamente para casa. (…)
Ao chegar a casa, entrei aos gritos: “Começou a Revolução, agora é para a frente, etc. Acordei o meu pai num repente, ele ficou louco de alegria e foi logo arranjar-se para sair.
Entretanto, liguei o rádio, que continuamente avisava a população para recolher ao lar, para se manter calma e também informava (sobre) a finalidade do movimento e o desenrolar dos acontecimentos. (…)
Durante todo o dia, quando um carro militar passava nas ruas, era vivamente aclamado, era uma loucura.
26 de abril – Andei pelo Carmo, pelo Rossio, Praça do Comércio e todas as ruas do centro.
Havia montes de gente na rua, um ambiente agitado, diferente.
A passagem constante dos tanques, dos carros blindados e dos outros transportes militares, a presença dos soldados e marinheiros davam uma nota nova na Lisboa tão conhecida.
O povo alinhava-se aos militares, apoiava-os.
Pessoas, carregadas de cervejas, bolos, sandes, sopas, cigarros para distribuir pela malta libertadora. Era uma maneira do povo contribuir para o movimento.
Cravos brancos, vermelhos, rosa, amarelos, multicores adornavam as figuras simples, mas importantes, dos soldados.
Às cinco horas da tarde concentrámo-nos no Largo Camões à espera da rendição da DGS.
Entretanto a chuva começou, mas mesmo assim ninguém saiu do seu lugar, ninguém se incomodava…
Resolvi integrar-me numa manifestação que foi para o Cais de Sodré. Entrámos na estação da CP e exigimos um comboio para Caxias onde se iam libertar todos os presos políticos.
Quando chegámos perto do Forte já lá estavam milhares de pessoas.
Como o tempo ia passando (sem os presos serem libertados), resolvi voltar para Lisboa.
[Já em Lisboa] a DGS continuava a mostrar resistência, isto perto das sete e meia (da tarde).
Fomos jantar com os meus pais a um restaurante da Baixa, eu não aguentava os sapatos.
A alegria continuava em Lisboa, manifestações, carros enfeitados, buzinas, flores.
Carros militares aclamados entusiasticamente!
27 de abril, sábado – Os presos foram libertos às duas da matina.
A felicidade e a alegria de todos nós cresciam cada vez mais. Sentíamos desejos de abraçar e felicitar todos. Era o princípio de um país novo, onde havia Liberdade!
À tarde numa manifestação foram descobertos dois pides. Como eles iam armados e se voltaram contra a malta, os militares tiveram de disparar rajadas de metralhadora.
Meteu respeito…
A censura já não existia, agora já podíamos ler escrever, ouvir e ver as verdades, a realidade boa ou má, mas pura.
Os órgãos [de informação] fascistas e todas as suas dependências eram assaltados, o povo pedia vingança [justiça] …
Os soldados continuavam a receber mostras de carinho da população.
1º de Maio – Ao fim de tantos anos vividos na escuridão, na amargura, o povo soube demonstrar que é merecedor da liberdade e do poder que hoje tem.
Se visses os milhares de pessoas que acorreram à Alameda e ao Estádio da ex-FNAT, poderias ver e saber que eu tenho razão. Todos os sindicatos, partidos, concelhos, províncias estiveram e contribuíram com a sua presença neste grande Dia do Trabalhador.
O povo uniu-se, mostrou a sua euforia, a sua loucura por esse símbolo da felicidade humana: a liberdade!
O sol iluminava tudo e todos, também o astro rei se quis associar a esta grande festa humana.
A euforia do 1º de Maio não se manifestou só na Alameda, nem no estádio, mas sim durante todo o dia, até às 3 horas da madrugada do dia 2 de Maio.
Durante todo o trajeto do estádio até à baixa havia marchas de carros a buzinar intensamente, floridos, enfeitados, manifestações de montes de gente, a cidade tinha vindo para a rua.
Na baixa, às três horas da matina ainda a festa não tinha parado. Camiões com malta civil e militar a cantar, a gritar percorriam Lisboa.
As pessoas em cima dos carros a cantarem e a fazerem o sinal da Vitória há tanto desejada.
A alegria de saber que posso agora viver num Portugal livre, bem longe da opressão fascista dá-me coragem para continuar a luta começada com fervor pelo meu pai e avô.»
Já no final, em nota de rodapé, a jovem informa:
«Na minha escola também já tomámos posições. A direção foi destituída, agora vamos formar uma comissão diretiva, feita por 5 alunos e 5 professores.»
Mais breve, mas também fortemente emotivo, foi o relato feito pelo jovem militar algarvio que, no Regimento de Engenharia 1, naqueles dias, tinha sido um dos responsáveis pela segurança do pavilhão onde estivera instalado o Posto de Comando do MFA:
4-5-74
«Não imaginas a alegria, a malta a chorar, o Spínola a chorar, os capitães a chorar, todos abraçados uns aos outros. Quando o Marcelo chegou ao RE 1, no Chaimite, (…) chovia a cântaros e a malta [continuava], toda à chuva, a abraçar os capitães (…)
Passei quatro noites e quatro dias sem dormir, mas valeu a pena. Vencemos, vencemos.
No domingo, fui fazer uma patrulha por dentro de Lisboa, as moças beijavam-nos (…) davam-nos flores, o povo dava-nos tudo e mais alguma coisa, tabaco, dinheiro, comida, bebida, tudo, não tenho palavras para te dizer como vi isto. Valeram a pena as quatro noites e os quatro dias [que passei] a manter a segurança [do Posto de Comando].»(15)
Escrita também por esta altura, a carta de outro militar algarvio, colocado também em Lisboa, não destoa das restantes:
«Isto aqui tem sido uma festa, todo o mundo está contente com a queda do regime fascista e a prova disso foram as manifestações que se têm feito nestes últimos dias, onde todo o contentamento e o sentimento de liberdade se exprime no rosto das pessoas. Pois é, (…), quem é que esperava uma reviravolta destas! O primeiro grande passo está dado. Agora é preciso dar os outros com acerto, não dando tréguas aos fascistas (…)
Nos dias que se seguiram ao 25 de Abril, toda a gente ia para a rua e aglomerava-se no Rossio, no Camões, onde estava a sede da PIDE, e no Carmo, onde é a GNR. Quando alguém reconhecia um pide, todos caíam em cima dele, só lhe valendo a tropa, que o prendia e o defendia dos punhos e pés das pessoas mais excitadas. Muita gente oferecia prendas aos soldados que andavam nas ruas ou que guardavam certos edifícios.»(16)
Mais à frente, referindo-se à questão que, na altura, mais preocupava todos – o fim da guerra e a solução do problema colonial – a sua opinião não podia ser mais conclusiva:
«Eu penso que a guerra colonial está prestes a acabar, quase toda a gente não a deseja, e se o Spínola não pensa em entrar em negociações com os movimentos de libertação faz um erro porque joga a vida de muitos e aquilo mais tarde ou mais cedo torna-se independente, prova-o o processo histórico.»
NOTAS:
(1) Raquel Varela e Luísa Barbosa Pereira (2017) – A História do Povo de Loulé na Revolução Portuguesa 1974-75, Loulé, Câmara Municipal de Loulé
(2) A Voz de Loulé, 15/5/1974
(3) António M. J. Rosado Luz, O Meu 25 de Abril in Almada Contreiras (coordenação) (2017) Operação Viragem Histórica: 25 de Abril de 1974, Lisboa, Edições Colibri
(4) Ibidem
(5) Almoços com História, Entrevista ao Coronel Rosado Luz in O Referencial janeiro-março 2018
(6) Entrevista ao Almirante Martins Guerreiro in O Sambrasense, 20/4/2021
(7) Ibidem
(8) Ibidem
(9) M. Martins Guerreiro, Ministério da Marinha – Direção das Construções Navais, in Almada Contreiras (coordenação) (2017), Operação Viragem Histórica: 25 de Abril de 1974, Lisboa, Edições Colibri
(10) J. Costa Neves, O Capitão Costa Martins e a ocupação do Aeroporto de Lisboa in Almada Contreiras (coordenação) (2017), Operação Viragem Histórica: 25 de Abril de 1974, Lisboa, Edições Colibri
(11) Entrevista ao Coronel Costa Martins in Terra Ruiva nº 34, abril de 2003
(12) Costa Martins, Aeroporto Internacional de Lisboa – Escola Prática de Infantaria in Joana Pontes, Rodrigo de Sousa e Castro e Aniceto Afonso (coordenação) (2012) A Hora da Liberdade – 25 de Abril, Pelos Protagonistas, Lisboa, Editorial Bizâncio
(13) Américo Caetano, carta endereçada ao autor
(14) Vera Timóteo, carta endereçada ao autor
(15) Primeiro militar, carta endereçada ao autor
(16) Segundo militar, carta endereçada ao autor
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