Quando se fala no Algarve, as pessoas associam de imediato vários fatores: sol, praia, temperaturas amenas, paisagens idílicas, boa comida, férias de sonho. Mas há algo que caracteriza a parte da paisagem a sul do país há muitos anos e que se encontra espalhada um pouco por todo o mundo, e que é, de forma indiscutível, uma das maiores imagens de marca de região: a laranja. Enchem de colorido as prateleiras dos supermercados em todo o país, adoçam as bocas de quem as come, seja em casa ou no restaurante, e até podem ser encontradas à venda nas extensas bermas da EN125, que atravessa o Algarve de uma ponta à outra.
“A laranja do Algarve é a melhor do mundo. É nisso que acreditamos, pois temos um produto de qualidade e de excelência”, adianta Diana Tereso Ferreira ao Postal do Algarve, acrescentando que “a laranja que vem de fora é mais barata, mas temos de proteger o que é nosso”.
A vice-presidente da AlgarOrange – Associação de Operadores de Citrinos do Algarve – diz que isso se deve a vários fatores: a um clima único, ao tipo de solo, aos ventos oceânicos, aos níveis de humidade, mas também a uma maior preparação do setor.
“Há cerca de 10 a 15 anos houve grandes avanços na profissionalização do setor dos citrinos, com apostas nas novas tecnologias, com uma alteração para a rega gota-a-gota na maior parte dos pomares do Algarve, com a formação dos trabalhadores e uma aposta na contratação de recursos humanos qualificados. Isto faz com que o setor esteja mais preparado, apesar de estar a enfrentar diversos desafios. A capacidade de resposta é agora superior e mais rápida”.
Num setor onde a laranja é rainha – mas não esquecendo as tangerinas, os limões, as clementinas, as toranjas, as limas, e outros – o Algarve domina a produção. Há um total de 21.765 hectares cultivados, dos quais 16.191 hectares (corresponde a 74,4 %) ficam na região mais a sul do continente. Em números absolutos, estamos a falar de 452 mil toneladas de citrinos, dos quais 399 mil foram produzidas e colhidas no Algarve. Uma região responsável por 88 % da produção. “As pessoas têm de perceber que este é basicamente um produto que não tem qualquer desperdício, pode ser usado na indústria dos sumos. Além de que a produção seja durante todo o ano e o produto é sempre fresco”, conta Diana Tereso Ferreira, que atribui a excelência dos números e a qualidade do produto a uma gestão mais eficiente ao longo dos vários períodos de produção.
Mas porquê importar laranja?
Mas se temos o melhor produto e em quantidades suficientes, então porque existem nos supermercados laranjas e citrinos vindos de outros pontos do globo? “Essa é uma excelente pergunta”, começa por dizer a dirigente.
“Recentemente surgiu uma notícia que dizia que a produção de citrinos estava em baixa e que as grandes superfícies estavam a comprar fora. Nós não percebemos essa informação, até porque neste primeiro semestre a quantidade de citrinos vendidos é quase 5 % acima da campanha do ano passado”, explica, adiantando a ‘vice’ da AlgarOrange que neste momento “a previsão é que haja fruta até final de setembro ou outubro. Por isso não percebemos este cenário”.
E quem chegar a um supermercado ou a um restaurante e comprar uma laranja portuguesa, tem uma garantia. “Ao consumir o que é português está a consumir qualidade. Houve um aumento dos custos de produção, mas ao comprar uma laranja era bom que os portugueses soubessem o que distingue a laranja portuguesa das outras”.
Produto falsificado
Cerca de 35 a 40 % da produção de laranja destina-se à exportação, com grande força nos mercados europeus. E como tudo o que é bom costuma ser ‘copiado’, a laranja do Algarve também se torna num alvo apetecível.
“Tem de haver controlo da certificação da fruta. Em França houve um grande aumento de produto português, mas existe a suspeita de que está a ser comercializado produto como sendo português, mas que não é”.
“Não queremos apoios para a água, mas sim soluções”
A Covid não foi uma barreira no consumo da laranja – “até houve um pequeno aumento no consumo, pois muito se falou dos benefícios da vitamina D” –, mas o setor cítrico enfrenta alguns desafios. E o maior é, inquestionavelmente, o problema que tem afetado toda a região: a falta de água. “Não queremos apoios para a água, mas sim soluções”.
“É sem dúvida o nosso maior problema”, adianta a dirigente da AlgarOrange, associação que conta com 12 associados.
“Se estivermos junto aos perímetros das barragens utilizamos essa água, mas se não estivermos temos de recorrer à captação de água subterrânea. Relativamente a este último cenário, no ano passado já houve cortes na ordem dos 15 %, e para este ano os cortes serão iguais”, conta Diana Tereso Ferreira. “No perímetro de rega da barragem da Bravura, estamos desde maio de 2022 impedidos de usar água, por isso tivemos de reativar furos de quem os tinha, ou então de pagar água”.
Os cortes são extensíveis a todo o Algarve. “No que diz respeito à garagem do Arade, também já houve cortes no ano passado, e por decisão de Conselho de Ministros de 8 de fevereiro os cortes previstos são de 40 %. No caso do Sotavento, os cortes vão ser na ordem dos 50 %. Existe a possibilidade de ativação de furos, porque os aquíferos não têm estado a ser utilizados e estão disponíveis para serem usados”.
Pragas afetam produção de laranja
Estima-se que o setor dos citrinos represente um volume de negócios anual de cerca de 388 milhões de euros, valor que poderia ser mais elevado se parte da produção dos citrinos não fosse afetada pelas pragas.
“É necessário elaborar um cadastro viral, fazer um mapeamento de toda a região, dos pomares, das culturas, para que possa haver uma gestão regional e integrada em resposta a algumas das pragas mais importantes”, defende Diana Tereso Ferreira. Uma luta que não tem um fim à vista.
“Temos pragas novas que resultam da globalização e da entrada no nosso país de produtos de outras regiões, mas também temos pragas que existiram no passado e que eram controladas com alguns produtos que agora saíram do mercado por questões de segurança”, explica a responsável do setor. “Isso fez com que tivéssemos necessidade de procurar novas substâncias ativas que combatam essas pragas”.
- Por João Tavares
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