Faleceu este sábado provavelmente um dos maiores algarvios de sempre, Aníbal Sousa Guerreiro. O POSTAL republica a entrevista que ele deu a José Carlos da ACD FARO, publicada em 2012. Segundo José Carlos, fica “para a posteridade” a entrevista que fez “a este grande homem e columbófilo farense”:
Aníbal Sousa Guerreiro é talvez, na actualidade, um dos columbófilos mais antigos a concursar, não só na região algarvia, como em Portugal.
Já com 80 anos de idade, a sua longevidade desportiva pauta-se pelas quase sete décadas de columbófilia activa, fruto da sua extrema dedicação e empenho nesta modalidade, que define como um desporto de paixão, e que continuará a praticá-lo com muito entusiasmo e certamente que levará até ao final da sua vida a chama viva da paixão pelo desporto columbófilo, pois entende que a alegria que uma pessoa possa ter a ver chegar o seu pombo ao pombal, é uma emoção e uma satisfação indescritível, que não há palavras que possam descrever!!!
Empresário de sucesso, homem de princípios e de grande verticalidade, autêntico “mecenas” e grande benemérito da columbófilia farense, está intimamente ligado a todo o envolvimento social, cultural, desportivo e histórico da columbófilia farense e algarvia … nas suas empresas trabalham ou trabalharam muitos columbófilos, que colaboraram mutuamente em várias fases distintas da história da columbófilia farense, em muitas funções directivas desempenhadas nas três colectividades que existiram até aos dias de hoje na cidade de Faro.
Entrou pela primeira vez em contacto com a columbófilia e o desporto columbófilo (um mundo fascinante que desde logo o cativou, aos 13 anos de idade, algo que perdura até aos dias de hoje, volvidos quase 70 anos na prática da modalidade…), quando um amigo seu (colega do liceu) que tinha pombos-correio (José Alexandre da Fonseca), o convidou para ir visitar os seus pombos e os seus pombais.
Esse amigo e colega seu, tinha já na altura (1944), instalações grandiosas e muito bonitas, tendo Aníbal Guerreiro ficado de imediato apaixonado por este desporto e pelos pombos-correio.
José Alexandre da Fonseca ofereceu-lhe uma pomba, e Aníbal e o seu irmão Gilberto, rapidamente fizeram um pequeno pombal. Depois disso começou a adquirir pombos a várias pessoas e assim começou a sua aventura na columbófilia !!!
Passados dois anos de ter os pombos em casa, o seu pai não queria que continuasse com os pombos, porque entendia de que o filho perdia tempo de estudo, e teve que retirar os pombos de casa e foi colocá-los numa varanda de uma tia, na Rua Bocage, em Faro, e teve de novamente de fazer um novo pombal conjuntamente com o seu irmão.
Uma vez mais, rapidamente arranjou um número razoável de pombos e foi aí que começou a actividade columbófila, a enviar aos concursos. Em relação a este início algo atribulado, Aníbal Guerreiro disse-nos que… “a columbófilia tem sido para mim uma paixão muito grande, e um indivíduo quando é novo e gosta, faz os sacrifícios que são necessários para levar aquilo que gosta para a frente”.
Concursou na Sociedade Columbófila do Algarve (fundada em 1932 – 1ª colectividade columbófila de Faro, resultado da boa vontade e a coragem dum pequeno número de “carolas”, tornando-se realidade um sonho de longa data), onde mais tarde foi Presidente da Direcção.
Mais tarde, em 1954, quando a columbófilia farense conhecia já um grande desenvolvimento, dado o elevado número de praticantes, uma cisão inesperada culminou com a fundação de outra colectividade – a Sociedade Columbófila Sul de Portugal, onde também se tornou sócio-concorrente. Nessa altura, considerava-se um columbófilo médio, não de grande relevo ou algo que se assemelhasse a um Grande Campeão !!!
Existia na altura uma grande rivalidade entre estas duas colectividades, tendo-se chegado à conclusão que era uma asneira existirem duas colectividades columbófilas, e tentou-se fazer uma fusão entre ambas , o que levou muitos anos para se conseguir em Faro, mantendo-se estas duas colectividades em actividade até 1964, data em que a imperiosa fusão fez surgir a actual Sociedade Columbófila de Faro (na antiga Rua do Chiado – hoje Rua Conselheiro Bívar).
Renascia, então com um novo fulgor e pujança, uma nova colectividade columbófila, sob a presidência de Aníbal Guerreiro, um dos grandes apaixonados pela columbófilia, e cujo saber e dedicação muito tem contribuído para o desenvolvimento e engrandecimento do desporto columbófilo na capital algarvia !!!
Com uma nova sede, e postas de lado as rivalidades, convivia-se muito, havia um café em que os columbófilos gostavam de se reunir, para conversar sobre os pombos e os seus feitos.
Marcando razoavelmente nos diversos concursos, foi a partir dos finais da década de 50, que a sua carreira de columbófilo conheceu um grande salto qualificativo. Na procura de melhorar cada vez mais as performances dos seus atletas, foi à Bélgica, onde conheceu os “Fabrys” – pai e filho (columbófilos que na altura davam “cartas” em pombos-correio, conhecidos mundialmente – por três vezes visitou os “Fabrys”) onde adquiriu um casal muitíssimo bom, no qual estava uma fêmea que era filha da “Heroíne” – pomba de destaque da colónia Fabry.
Nessa altura teve a oportunidade e a felicidade de conhecer José Beleza Moreira, de Barcelos (“era um poço de sabedoria e um columbófilo de destaque”), tendo sido através dele que aprendeu muito sobre os métodos de jogo dos pombos (a forma de alimentar, os tempos de treino, como devia de concursar e que lhe ensinou uma série de sistemas de voo, entre eles a viuvez, que naquela altura na região algarvia ainda não se fazia). Muitos anos (em Janeiro) e através de uma grande amizade pessoal, Aníbal Guerreiro era visita frequente em casa de José Beleza Moreira, onde trocavam impressões indo depois visitar alguns columbófilos de destaque no norte do país.
Com esses pombos e mais alguns que adquiriu a José Ferreira Maia, da Trofa (industrial e columbófilo, José Ferreira Maia, foi o grande impulsionador do desporto columbófilo na Trofa, ainda hoje os seus pombos são recordados como do melhor que existia em Portugal, sendo conhecidos como os pombos do “Maia da Trofa”, ou simplesmente os “Trofas”, conforme nos refere Aníbal Guerreiro), conseguiu formar uma colónia de grande destaque.
Voltando ainda mais ao passado, recorda-se de um columbófilo de Faro (Francisco Pedro), que tinha bons pombos e que lhe ofereceu alguns bons exemplares, entre os quais uma fêmea que era muitíssimo boa e que ganhou um concurso de Beja em contra-relógio, algo que o entusiasmou muito, tendo sido no ano seguinte a melhor fêmea da sociedade que existia na Rua de Santo António, em Faro.
Nos finais da década de 50, tinha uma colónia de 20 machos viúvos e chegou ao final da campanha com 19 pombos, apenas perdeu 1 pombo. Pombos muitíssimo seleccionados, pombos que não se classificassem pelo menos duas vezes até décimo, eram eliminados. Era uma selecção muito rigorosa, teve pombos que fizeram seguidos quase todos os concursos da campanha. Recorda-se vivamente (excelente memória) de um excelente pombo lilás com o nº 741262/59, que ganhou três concursos seguidos : Braga, 575 Kms – (isolado), Torres Novas, 278 Kms e finalmente Burgos na distância de 700 Kms. Esse pombo nunca se perdeu e ganhou diversas anilhas de ouro, tendo inclusivé sido posta na sua pata uma anilha de ouro, e o pombo voava e ia aos concursos com a respectiva anilha de ouro. Morreu de velho no pombal… “bons tempos… que saudades…” confidencia-nos Aníbal Guerreiro, visivelmente emocionado, espelhando o seu amor e carinho por estas inteligentes aves que nos marcam para sempre na vivência columbófila…
Sempre na procura incessante da melhor qualidade em pombos-correio, encetou uma viagem de automóvel à Bélgica, acompanhado pelos seus amigos columbófilos : Dr. João Barros Madeira (Loulé), Jorge Correia Martins (Faro) e o saudoso António Felício Nunes (Olhão), onde foram à casa do Colson (que era uma pessoa extremamente simpática e amiga), que os levou a conhecer os principais columbófilos belgas, travaram amizade com o Van Neste (que tinha bons pombos – vermelhos e lilases), tendo na ocasião adquirido vários pombos que se tornaram a base da colónia em 1980, tendo sido os primeiros pombos Van Neste a virem para Portugal !!!
Numa determinada fase em que se destacou na competição columbófila, apercebeu-se que a maioria dos columbófilos em Faro, não estavam tão informados sobre os métodos de voo e qualidade dos pombos. Ofereceu muitos pombos convencido de que oferecendo borrachos aos seus colegas columbófilos, que eles poderiam competir em melhores condições e terem melhores resultados.
Tem mantido ao longo de todos estes anos sempre um grande entusiasmo pela columbófilia, e conforme nos refere… “é uma coisa que se gosta naturalmente, e o grande problema é quando uma pessoa se chega realmente aos pombos, quando chega aos pombos é difícil abandonar. Todo aquele conjunto de criação (que é uma fase bonita) em que nós podemos desde logo seleccionar, e depois a columbófilia tem uma coisa muito interessante, que é o facto de no mesmo pombal, nem todos nascem craques, uns são bons, outros não o são. A columbófilia não é uma ciência absoluta, sendo um desporto que se pratica sempre com muita incerteza, mas sempre um desporto apaixonante…”
Columbófilos Algarvios
Manteve sempre um nível de amizade com todos os columbófilos, mas destaca o seu amigo de infância (dos tempos do liceu) o Dr. João Barros Madeira (Loulé) que foi sempre uma figura destacada da columbófilia algarvia e nacional. Ainda hoje mantêm um nível de amizade que é invulgar, profusamente preenchida por uma grande consideração mútua, verdadeiros amigos na acepção da palavra, assim como o seu filho, Dr. David Barros Madeira, que considera um columbófilo brilhante… são duas pessoas exemplares na sua condução : o trato humano, aquilo que convivem com as pessoas, o que ensinam, a amizade que dedicam, são duas pessoas que destaca…
António Felício Nunes (Olhão) – “um fantástico columbófilo”
José Zacarias de Sousa (Faro) – “um columbófilo que marcou uma época”
António da Costa Rosa (Faro) – “indivíduo muito inteligente em columbófilia… tinha um jeito muito especial com os pombos”
Rui Emídio (Presidente ACD Faro) – “tem feito um bom trabalho, tem dado um determinado incremento à columbófilia algarvia e tem apresentado uma boa imagem de trabalho”
Columbófilos Nacionais
Destaca várias personalidades que pela sua postura, pela sua lealdade e pela sua inteligência mais se destacaram a nível nacional…
Engº Vaz Guedes – “um homem que fez muito pela columbófilia”
Álvaro Silva & José Maria da Silva
Alexandre Mendes Gordo
Dr. Eduardo Mansinho – “paixão pelo ciclismo e pela columbófilia”
Sargento Silva (Porto)
Dr. José Tereso – “uma pessoa que gosta imenso deste desporto, que se dedica com empenho e dedicação, e de uma correcção e educação exemplares”
Columbófilia Moderna e a Antiga
Considera que a columbófilia actual é absolutamente diferente da de outrora. Quando foi Presidente da Comissão Columbófila do Distrito de Faro, os pombos eram transportados de comboio, e só mais tarde é que apareceram os primeiros camiões, que foi em absoluto um passo em frente na evolução da columbófilia algarvia. Antigamente não existia tratamentos curativos nem vacinas, e as enfermidades eram muito comuns nos pombos, quando surgiam as doenças virais sem o devido tratamento adequado, as medidas higio-sanitárias eram as únicas e absolutamente imprescindíveis para a possível prevenção e controle da doença. À medida que o tempo foi passando e desde que se começou a vacinar os pombos, estes apresentavam-se em melhores condições físicas e saudáveis para a competição, alcançando melhores resultados desportivos.
A grande diferença é que dantes as médias dos pombos eram relativamente mais baixas do que as actuais. Os pombos de hoje em dia, são mais seleccionados e a qualidade está mais espalhada pelos vários pombais. A competição é mais aguerrida, a qualidade dos pombos melhorou bastante e estão melhor preparados para as provas desportivas.
Antigamente não havia hipótese de se saber o estado do tempo que ia fazer num determinado fim-de-semana, mas hoje com o advento das novas tecnologias, sabemos com vários dias de antecedência o estado do tempo, e preparam-se melhor os pombos, no sentido de eles darem o máximo mediante as condições atmosféricas previstas.
As entradas electrónicas também ajudaram muito a actividade columbófila, porque hoje para se ganhar numa prova normal (principalmente em velocidade e em meio-fundo), em que vários pombos lutam para discutir o primeiro lugar, ou temos uma entrada espectacular, se der uma volta à volta do pombal perde logo vários lugares. Antigamente podiam dar duas ou três voltas e mesmo assim ganhavam – está tudo diferente – mais competitivo !!!
Considera de que a columbófilia tem evoluído, embora o número de praticantes tenha diminuído, mormente pela força das circunstâncias actuais, em que é preciso ter muito espírito de sacrifício para se ser columbófilo !!!
Desportista Eclético
Desde a sua juventude sempre se interessou e participou activamente em vários desportos : futebol, automobilismo (em ralys – do tempo de Filipe Nogueira e do Fernando Mascarenhas, passando mais tarde a sua empresa – Fiaal – Ford – Algarve – a apoiar a famosa dupla, bem conhecida de todos – Carlos Fontainhas/Rogério Seromenho, na altura em que os Ford Escorts eram a referência no mundo dos ralys), motonáutica (onde chegou a concorrer com o campeoníssimo Gonzaga Ribeiro), e por último mas nem por isso menos importante, a sua amada e sempre acarinhada columbófilia (desde os 13 anos de idade até aos dias de hoje).
É ainda grande aficionado e entusiasta da pesca e da caça.
Dirigismo
Como dirigente desportivo, esteve vários anos ligado ao futebol (Sporting Clube Farense), trazendo o clube dos regionais até à 1ª divisão, onde na sua gerência procedeu à aplicação do relvado no Estádio de São Luís, assim como a construção das respectivas bancadas), onde na altura as receitas davam para pagar as despesas, não se ficando a dever a ninguém !!!
Como dirigente columbófilo, esteve também vários anos ligado à presidência da estrutura associativa algarvia, assim como nas várias colectividades que existiram em Faro (sendo na maioria dos casos, ou Presidente da Direcção ou da Assembleia-Geral)
Homenagens
Aníbal Sousa Guerreiro é o homem forte da Fiaal (concessionário Ford para a região do Algarve) e também o Patrocinador Oficial do Derby Internacional de Faro (em que o primeiro prémio era um automóvel).
Recentemente na entrega de prémios da Sociedade Columbófila de Faro, realizada no dia 16 de Outubro 2011, no restaurante “Rialgarve” – Monte da Ria – Montenegro, a Direcção da colectividade prestou homenagem ao grande patrocinador da SC Faro, ficando o seu nome a figurar em 2012 no Pombal do Derby de Faro com a designação de Derby Internacional de Faro – Aníbal de Sousa Guerreiro.
Posteriormente foi colocada a placa alusiva à respectiva homenagem no pombal do Derby de Faro, situado na Aldeia Columbófila de Faro.
Em 2008, nas Comemorações do Dia do Município de Faro (07 de Setembro), foi homenageado pela autarquia farense, recebendo a Medalha de Ouro da Cidade. Durante a cerimónia, o Presidente da Câmara (Dr. José Apolinário), agradeceu em particular o contributo prestado à sociedade por este ilustre munícipe, destacando o mérito à dedicação, ao saber e ao profissionalismo na área empresarial !!!
Em 2009, foi homenageado pela Associação Columbófila do Distrito de Faro (ACD Faro), pelos seus relevantes serviços em prol da columbófilia algarvia!!!