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Investigador em Experimentação
Arqueológica
Como todos sabemos a arqueologia é uma disciplina que lida com o passado de uma forma muito particular, procurando entender o comportamento humano através dos vestígios materiais que chegaram até aos dias de hoje. Quando nos referimos à Pré-História este processo de entendimento torna-se ainda mais complicado, devido à sua natureza extremamente fragmentada. A experimentação arqueológica, em especial na Pré-História, surge como uma ferramenta para a compreensão desse passado fragmentado, tendo sempre como principal objectivo tentar entender os gestos, as técnicas e a funcionalidade dos objectos e estruturas identificados nos sítios arqueológicos.
Apesar dos resultados provenientes desta atividade de pesquisa não poderem ser vistos como respostas taxativas às questões levantadas pelos arqueólogos, o cruzamento destes (resultados), com outros métodos e técnicas de análise, utilizados na pesquisa arqueológica, permitem levantar novas hipóteses sobre o comportamento do homem pré-histórico e as suas adaptações culturais e tecnológicas.
Por outro lado, este método de abordagem à realidade arqueológica surge num conjunto de vários resultados que podem ser convertidos em materiais e atividades didáticas. Da experimentação retiramos métodos e técnicas de reconstruir diversos objectos, habitats e modos de vida, que podem ser apresentados ao grande público de uma forma lúdica e interactiva, tornando este período mais perceptível aos olhos de todos.
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Neste sentido, o Museu de Portimão tem desenvolvido um trabalho bastante importante junto da comunidade, mostrando todos os anos em “Um dia na Pré-História”, como viviam os habitantes de Alcalar há cinco mil anos atrás. Tem sido também no âmbito deste projecto que desde 2014 temos apresentado, a todos os que visitam este monumento, no dia do Património a atividade de cozinha pré-histórica.
Esta atividade surgiu precisamente a partir da arqueologia experimental. No início tinha-se como objectivo analisar e observar os resultados da utilização de estruturas de combustão (lareiras) encontradas nos sítios arqueológicos, e dos restos faunísticos que poderiam ter sido cozinhados e consumidos. A partir destes trabalhos organizou-se uma atividade onde são demonstradas várias técnicas de cozinhar os alimentos, explicando os processos e enquadrando cronologicamente cada tipo de confecção.
Em Alcalar todos os anos propomos aos visitantes assistir ao esquartejamento de um animal, utilizando materiais pré-históricos, à confeção deste e outros alimentos sobre fogo direto, em estruturas de covete, com seixos aquecidos, ou em réplicas de recipientes cerâmicos. Os materiais e os alimentos utilizados no decorrer da atividade são sempre, tanto quanto possível, semelhantes aos que eram utilizados pelas comunidades pré-históricas, que habitaram aquele espaço desde há cinco mil anos, tornando a experiência mais realista.
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O objetivo é envolver públicos de todas as idades, sem treino específico em arqueologia e através da experimentação didáctica, nos problemas da investigação científica para criar uma ligação de reciprocidade. Esta é a razão principal pela qual não são só mostrados os resultados finais, mas antes as questões e métodos à nossa disposição para procurar respostas (e questões), assumindo que em Pré-História, tal como em qualquer outra disciplina, a comunicação com o público em geral é inseparável da promoção de um espírito crítico e interrogação reflexiva.
Sem dúvida alguma a Experimentação Didáctica tem inquestionáveis vantagens como meio interativo entre os monitores e o público em geral. Um reviver do passado de uma forma realista pode ser atingido por uma fusão natural entre os monitores e o público.
(Artigo publicado no Caderno de Artes Cultura.Sul)