O número volta a fixar um novo recorde, mas totais piores podem estar a caminho. O alerta é feito por Henrique Oliveira, matemático e professor do Instituto Superior Técnico (IST), para quem o aumento de casos de covid-19 contabilizado no boletim desta quinta-feira (7627) e no do dia anterior (6049) não será “ainda” atribuível ao período de natal.
“Ainda me parece cedo para a explicação ser essa”, adiantou ao Expresso, para explicar que, o mais provável é estas subidas refletirem o menor números de testes realizado junto à época festivas, “com feriados pelo meio e tudo”, bem como a comunicação mais lenta dos seus resultados.
O pneumologista e coordenador do gabinete de crise da covid-19 da Ordem dos Médicos, Filipe Froes acredita que o país poderá “já estar perante o reconhecimento de novos casos, fruto da festividade do Natal”. “No fundo, era aquilo que não se queria, mas, infelizmente, aconteceu”, disse à agência Lusa, considerando que os 7627 anunciados esta quinta-feira resultarão eventualmente de uma “altura em que muitas pessoas desvalorizaram as medidas de prevenção e controle, como o uso de máscara e o evitar ajuntamentos”.
O especialista também teme um acréscimo de números nos próximos dias. “As infeções que possam ter ocorrido no Natal, algumas ligeiras ou assintomáticas, podem dar nos dias subsequentes cadeias de transmissão”, alertou.
“Este aumento pode ser devido à não testagem na altura do Natal, o que eu duvido”, considera por sua vez o virologista Pedro Simas. “Se não tiver esse efeito, deve-se ao maior número de contactos, são as duas possíveis explicações”, defendeu também à Lusa. Portugal tem um “planalto na média diária dos 3.200 casos”, lembrou, o que, no seu entender, “é muito alto, é 10 vezes maior do que o planalto do verão, ou seja, nunca houve um risco tão grande de transmissão” do vírus.
“Os números de hoje ainda são pré-Natal, portanto, o efeito Natal e Ano Novo só se vai ver em janeiro”, acrescenta Pedro Simas.
A Henrique Oliveira, os cálculos matemáticos em que trabalha dão-lhe razões para temer um cenário agravado, com ainda mais infeções nos próximos dias, sendo certo que “mais infetados implicará sempre mais mortos”.
“É preciso olhar para os números com cautela”, sublinha, sem esconder aquilo que lhe parece mais preocupante: “o total de óbitos não está a baixar (foram 76 nas últimas 24 horas), pelo contrário, parece haver uma nova tendência de subida”.
SERVIÇOS DE SAÚDE NOVAMENTE EM RISCO DE RUTURA
Que média diária podemos então esperar? “Não sei ainda dizer”, avança o matemático, que arrisca podermos ter de lidar com um total de 11 mil mortos até ao final de fevereiro, “e isto sem contar com a eventual entrada em cena da nova estirpe do vírus, detetada no Reino Unido”. A verdade, sublinha o docente do IST, é que os serviços de saúde não têm margem para uma subida significativa de infetados, pelo que se o país chegar a totais diários iguais ou superiores aos piores dias de outubro e novembro – “o que é possível” – isso significará ficarem os hospitais novamente à beira da rutura.
Sempre que se aliviam as restrições, o resultado é a subida de casos, insiste Henrique Oliveira, que classifica as medidas que têm vindo a ser tomadas pelo Governo como “medidas iô iô”. “Acho que se pode usar a palavra imprevisível”, adianta: “Não sabemos bem o que esperar”. As medidas têm-se revelado ineficazes para controlar a pandemia, considera, estando muito mais a ser impostas de forma “reativa”, e não por antecipação, apesar dos alertas que deviam ter sido considerados dada “a situação em países europeus como Espanha, Alemanha e França”.
De resto, a matemática não tem falhado. “Apontei anteriormente para um total de 7 mil óbitos até 31 de dezembro e é para isso que os registos apontam”. O matemático sublinha, no entanto, que há dois novos dados cujos efeitos não foi ainda possível considerar. Além da eventual entrada no país da nova estirpe do vírus – “mesmo que tenham vindo menos emigrantes do Reino Unido neste Natal, por exemplo, basta que sete ou oito pessoas estivessem infetadas para a fazer chegar ao país” – há a questão das vacinas. Para já, “não sabemos sequer quantas pessoas vai ser possível vacinar até ao fim de janeiro”.
O Expresso procurou saber que leitura faz a Direção-Geral da Saúde (DGS) da subida de casos registada nos últimos boletins, questionando que medidas estão pensadas, acautelando a evolução dos próximos dias, e se o volume de testes efetuados foi mais reduzido no período de Natal. Até ao fecho do artigo, a DGS não respondeu.
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