Tavira tem vindo a sofrer nas últimas década profunda alteração da sua estrutura socioeconómica, navegando sem plano estratégico que acautele o seu futuro.
Reduzida às actividades ligadas à agricultura e pesca, Tavira alimenta-se do comércio e serviços (alojamento, cafés, restaurantes, bancos e agências imobiliárias) dependendo hoje determinantemente da actividade turística, por natureza flutuante e incerta.
A população nativa foi diminuindo progressivamente mercê da emigração dos jovens por falta de perspectivas ou da morte dos mais velhos pela passagem dos anos, sendo substituída em parte pela imigração daqueles que aqui procuram trabalho ou por lazer, disfarçando as causas do seu natural despovoamento.
Importa notar que nada nos move contra esta nova realidade social, agradecendo, pelo contrário, àqueles que têm o bom gosto de escolher Tavira para viver e contribuir para a sustentação da sua população, retardando o seu declínio. Sucede porém que a Cidade necessita de um rejuvenescimento, de gente que aqui viva com carácter permanente, tenha o seu emprego, ou seja, que não use Tavira apenas para férias ou como segunda habitação.
Temos consciência que não compete ao poder local substituir-se aos empresários, industriais e outros agentes, mas sabemos também que estes não dispõem de meios para produzir os estudos necessários para implementar políticas que alterem este decadente rumo.
Não podemos continuar a navegar à vista.
As poucas indústrias existentes, ligadas à pesca e à agricultura, foram-se extinguindo paulatinamente sem que outras tomassem o seu lugar. As fábricas de conservas Balsense e Tavirense, as moagens Pacheco e Martins e Filhos, a Adega Cooperativa dos Vinhos, as armações de pesca do atum Balsense e Ferreira Neto desapareceram, restando apenas alguns edifícios degradados, aguardando a sua reciclagem em equipamentos dependentes do turismo.
Além destas empresas importa lembrar a relevância do Quartel da Atalaia (QA), durante muitas décadas, para o desenvolvimento e sustentação da vida socioeconómica da Cidade. O QA garantia a presença permanente de muitas centenas de mancebos, quadros militares e suas famílias. Tal “população” era não só determinante para o equilíbrio demográfico e rejuvenescimento do concelho como um factor substancial para o aumento de consumo, gerador de riqueza e emprego, para além de importante sustento da vida sociocultural da Cidade.
A partir de 1939, o QA assumiu uma função determinante na formação dos militares de Infantaria com a instalação dos Cursos de Sargentos Milicianos, a que se seguiu em 1948 o Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria (CISMI) e em1975 o Curso de Instrução de Quadros (CMFT) até 1996, data do início do declínio do seu papel como Escola Militar ao ficar reduzido a mero Centro Militar de Férias (CMFT). É certo que ainda albergou entre 1 de Abril de 2008 e 31 de Julho de 2015 o Regimento de Infantaria I, porém, com a transferência desta Unidade para Beja foi na prática assinada a sua certidão de óbito, como aliás publicamente reconhecido por altos responsáveis militares.
Sejamos sérios, a realidade nua e crua em que o QA se encontra já há quase dois anos com uma vida militar artificial, “ligado à máquina”, é preocupante.
A necessidade de reconverter este importante património em algo de útil para Tavira não é uma questão académica, devendo ser olhada com coragem e ambição.
O QA é demasiado valioso para Tavira para ficarmos tranquilamente à espera de um REVIVER análogo ao que o Governo recentemente anunciou, entregando à iniciativa privada por 30 e 50 anos algumas dezenas de equipamentos públicos degradados.
Porquanto o QA pela sua imponente estrutura arquitectónica, ampla dimensão, bom estado de conservação e passado histórico poderá voltar a desempenhar um papel determinante na estratégia para o desenvolvimento da Cidade.
O raro património histórico-cultural de Tavira tem sido um dos mais notáveis factores constitutivos da sua identidade, afirmando-a como única em toda a Região.
Acreditamos que é altura de reafirmar Tavira como um destino cultural diferente, assumindo de uma forma estratégica e organizada um projecto no domínio das Artes e da Cultura, que utilize o QA como seu eixo fundamental, tornando-a competitiva e qualificada a quem a visita e garanta o sustento a quem aqui vive.
Chegamos a 2017. Um bom ano para se proceder à discussão aberta e sem preconceitos de um plano estratégico estruturante que dê um rumo certo à Cidade e evite o seu ameaçador declínio.
Aguardemos confiadamente.
* Presidente da Direcção da Casa das Artes de Tavira