O mais recente relatório de habitação sobre o mercado imobiliário de resorts em Portugal (Portuguese Resorts Market Report) expõe uma realidade preocupante para os algarvios: o boom de vendas de casas de luxo para estrangeiros contrasta com a estagnação no acesso à habitação para os residentes. Num Algarve que se torna cada vez mais exclusivo para as elites internacionais, onde estão as prioridades em relação às necessidades habitacionais dos habitantes locais?
A revelação de que 47% das casas em resorts no eixo Albufeira-Loulé são compradas por britânicos exemplifica uma tendência que, embora favorável ao setor de turismo residencial, está empurrando os algarvios para a margem. Com preços de venda que podem ultrapassar os 12.000 euros por metro quadrado em algumas áreas de resorts, a questão é: além dos investidores estrangeiros, quem pode pagar por essas propriedades? Certamente não os residentes, cujos rendimentos são drasticamente desproporcionais ao custo da habitação local.
Enquanto o Algarve é apresentado ao mundo como um destino de eleição para os investidores, quem cuida das necessidades habitacionais dos seus próprios cidadãos?
Essa dinâmica não é nova. Ao longo dos últimos anos, o Algarve foi sendo transformado em um paraíso para investidores e turistas abastados, relegando as necessidades dos algarvios a um segundo plano. O aumento contínuo dos preços, impulsionado pela especulação e pelo investimento internacional, priva os residentes das oportunidades de adquirir uma casa a preços justos.
O relatório indica que, embora os britânicos ainda dominem o mercado, sua participação diminuiu, o que pode sugerir um possível abrandamento. No entanto, eles continuam sendo o grupo mais representativo nas compras. Para os algarvios, a questão é outra: como competir em um mercado onde os preços são inflacionados por uma demanda estrangeira sem precedentes?
A recente estabilização de preços em alguns municípios, como Albufeira, Lagos e Loulé, com mínimas variações trimestrais, pode parecer uma boa notícia. No entanto, essa estabilização está longe de representar acessibilidade. Pelo contrário, as casas continuam fora do alcance da maioria dos trabalhadores e famílias locais.
Para aqueles que nasceram e cresceram no Algarve, a realidade é outra: a escassez de opções de habitação acessível está se tornando cada vez mais crítica. O mercado imobiliário orientado para o turismo residencial tem contribuído para o êxodo de jovens e trabalhadores, que já não conseguem suportar o custo de vida na região. Enquanto o Algarve é apresentado ao mundo como um destino de eleição para os investidores, quem cuida das necessidades habitacionais dos seus próprios cidadãos?
É tempo de questionar para quem está realmente a ser planeado o futuro do Algarve. Não basta dizer que é a Lei da Oferta e da Procura a funcionar. Os poderes públicos e políticos precisam urgentemente de repensar as suas estratégias. A prioridade não pode ser apenas a maximização dos lucros com a venda de imóveis de luxo a estrangeiros. É imperativo criar políticas que garantam habitação acessível para quem aqui vive e trabalha, para que o Algarve continue a ser uma terra de oportunidades para os seus residentes, e não apenas para aqueles que podem pagar os preços exorbitantes dos resorts.
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