Estávamos em pleno século XXI e o tempo devorava-nos de maduros. Vendo nele o inevitável, o incontrolável da nossa existência, parecia ser a altura certa para vivermos um desassombrado tempo vivencial, o tempo humano ao qual estávamos todos submetidos a partir das relações familiares e culturais, não importando de que configurações se tratasse.
Já tínhamos resignado a imaginação de uma Terra em que não haveria países, como na singular prescrição utópica de Lennon, mas parecia-nos legítimo esperar um mundo onde cada país tivesse leis que protegessem e respeitassem todas as pessoas, no quadro de uma cidadania universal, mundial ou cosmopolita.
Os Estados-Nação tinham-se encarregue da empreitada de compreender o estrangeiro, o estranho que vivia “entre, por meio de, e, em nós”, vale dizer alguém correlacionado e identificado ao imigrante.
Todavia, com a previsão de chegada, ao pequeno écran, a partir do final do ano, do argumento televisivo “Mãos à Parede”, produzido pela PSP, a coberto do poder político e em rodagem na Mouraria, é por demais evidente que, não obstante, bem mais de um século ter já se passado, poucas alterações tiverem lugar nessa realidade. Aliás, bem pelo contrário! Ao que parece, temos cada vez mais dificuldade de conviver e de aceitar os que “são de fora”, dando alento ao poderoso conceito do eterno retorno de Nietzsche, talvez uma das suas ideias mais intrigantes e provocadoras, bem sugestivas de que tudo o que acontece já aconteceu antes e acontecerá novamente, ad aeternum.
A ser assim, as responsabilidades cívicas serão inquietação de tolos, que perdem tempo a pensar no legado que querem deixar às gerações futuras, almas piedosas, condenadas a ver a ruína de todas as utopias, se utopia for ver no Outro os valores de semelhante dignidade àquela que nos concedemos.
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