A água engarrafada da marca Perrier, há décadas associada à frescura e pureza, está no centro de uma polémica sanitária em França que está a abalar a confiança dos consumidores. O caso tornou-se particularmente grave quando as autoridades de saúde detetaram bactérias perigosas nas garrafas produzidas numa fábrica no sul do país. A imagem de excelência da marca está agora seriamente comprometida.
Contaminação detetada nas garrafas
As autoridades sanitárias francesas encontraram enterobactérias patogénicas em várias garrafas de Perrier produzidas na unidade industrial situada em Gard, próximo de Vergèze. Esta descoberta deu origem a uma recolha de 300 mil garrafas de 75 cl e à suspensão da distribuição de muitas outras de meio litro, refere a Marketeer. Este tipo de bactérias é considerado perigoso para a saúde humana, e a sua presença em água supostamente pura levantou imediatamente alarmes junto das entidades reguladoras e da população.
Nestlé debaixo de fogo
A Nestlé Waters, responsável pela marca Perrier, foi forçada a agir rapidamente. Para além da recolha massiva, a empresa viu-se obrigada a interromper parte da produção e a lidar com uma onda crescente de desconfiança por parte dos consumidores e das autoridades. As críticas dirigidas à empresa intensificaram-se quando se confirmou que a água não cumpria os critérios necessários para ser considerada “mineral natural”.
Face à gravidade da situação, as autoridades francesas retiraram à Perrier o rótulo de “água mineral natural”. Segundo a legislação, este selo só pode ser usado quando a água provém de uma fonte pura e não passa por tratamentos que alterem a sua composição original. Neste caso, não só foram encontrados microrganismos nocivos como também se verificou o uso de técnicas proibidas de purificação, o que viola diretamente os regulamentos em vigor.
Fecho de linha de produção
Como medida adicional, uma das linhas de produção da fábrica foi encerrada por ordem das autoridades. A decisão foi fundamentada por um parecer técnico que apontava para a degradação das fontes utilizadas. O parecer foi elaborado por hidrogeólogos contratados pelo Ministério da Saúde francês, que confirmaram a perda da qualidade exigida para manter o estatuto de água mineral.
De acordo com os especialistas, os poços utilizados pela Perrier já não cumprem os critérios para serem considerados fontes minerais. Esta conclusão abalou o posicionamento de mercado da marca, que se apoiava fortemente nessa reputação de naturalidade. As autoridades classificaram o parecer como “desfavorável à saúde”, levantando sérias preocupações sobre a continuidade da produção naquela região.
Problemas detetados desde 2024
A crise não surgiu de um momento para o outro. Segundo a agência regional de saúde ARS Occitanie, os problemas com a qualidade da água já estavam identificados desde o final de 2024. Nessa altura, a Nestlé foi aconselhada a interromper temporariamente a produção devido ao agravamento das condições da água e ao risco crescente de contaminações virais.
Métodos de tratamento ilegais
Um dos aspetos mais polémicos do caso é o uso de métodos de tratamento não permitidos pela legislação para manter artificialmente a classificação de “água mineral”. A própria Nestlé admitiu essa prática no início de 2024. Na sequência dessa admissão, a empresa destruiu cerca de dois milhões de garrafas, reconhecendo que estavam contaminadas e não podiam ser comercializadas em segurança.
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Para agravar ainda mais a situação, a Autoridade Francesa de Segurança Alimentar (ANSES) divulgou que praticamente todas as nascentes utilizadas pela Perrier estavam contaminadas com compostos químicos. Estes elementos podem ter efeitos a longo prazo na saúde dos consumidores, mesmo em pequenas quantidades, o que fez soar ainda mais os alarmes junto das autoridades.
Falhas graves na comunicação
Outro ponto crítico neste escândalo tem a ver com os prazos de notificação. A presença de bactérias foi detetada a 11 de março, mas só foi comunicada à ARS no dia 21. Situação semelhante ocorreu com uma não conformidade registada a 22 de março, mas só comunicada a 4 de abril. A Nestlé justificou os atrasos com “procedimentos internos”, mas as autoridades classificaram a atuação como “intempestiva” e pouco transparente.
O impacto deste escândalo na imagem da Perrier é profundo. Durante décadas, a marca construiu uma reputação sólida baseada na confiança, na pureza da água e na sua origem mineral. Este incidente veio abalar esses pilares. Consumidores e distribuidores estão agora mais cautelosos, e muitos questionam se poderão voltar a confiar na marca.
Medidas futuras
As autoridades francesas estão a reforçar os controlos sobre todas as marcas de água mineral, e será exigido maior rigor na monitorização da qualidade das fontes. Este caso poderá levar a alterações na legislação para prevenir novas ocorrências semelhantes. Por seu lado, a Nestlé prometeu rever os seus procedimentos internos e garantir que este tipo de falhas não volte a acontecer.
Um alerta para o setor
Este episódio serve de alerta para todo o setor da água engarrafada. A confiança do público é um bem precioso, mas pode ser perdida rapidamente quando a transparência e a segurança não são garantidas. A água, que muitos consideram um produto simples e seguro, pode afinal esconder riscos graves quando não há um controlo rigoroso.
E os consumidores?
Para os consumidores, este caso é também um aviso. Nem sempre o rótulo corresponde à realidade. É fundamental estar atento às informações prestadas pelas marcas e às atualizações das autoridades de saúde. Com o tempo, a Perrier poderá recuperar parte da sua imagem, mas o estrago está feito — e a confiança, uma vez abalada, é difícil de restaurar.
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