Comprou a casa para a reforma, confiou as obras a um pedreiro local e duas décadas depois ainda não conseguiu entrar. O homem vive lá há anos, sem pagar, e até tentou vender o imóvel com documentos falsos.
O que deveria ter sido o sonho de uma vida tranquila tornou-se um pesadelo para uma reformada francesa de 78 anos. Em 1999, comprou uma casa para passar a velhice perto da irmã, mas acabou impedida de viver nela. O motivo: o pedreiro a quem confiou a remodelação ficou a morar na propriedade e recusa-se a sair.
Segundo o Le Figaro Immobilier, a mulher, que residia em Paris, contratou um empreiteiro da zona para reformar o imóvel e acordou com ele que também gerisse o arrendamento enquanto não se reformava. Durante dois anos recebeu 350 euros mensais, até que os inquilinos deixaram de pagar e o caso se complicou.
A casa arrendada acabou nas mãos erradas
Depois de várias tentativas de arrendamento, foi o próprio pedreiro que acabou por se instalar na casa. Alegou existir um acordo verbal com a proprietária para ficar no imóvel, mas a mulher nega ter assinado qualquer contrato que lhe desse esse direito. Ainda assim, a lei francesa não exigia, na altura, contratos escritos para este tipo de arrendamento.
Esse vazio legal acabou por jogar a favor do ocupante. Apesar de o casal proprietário ter deixado de receber rendas desde 2019, os tribunais franceses ainda não autorizaram o despejo do pedreiro, que continua a viver lá sem pagar.
Nova lei muda as regras, mas não retroage
A 9 de abril de 2024 entrou em vigor em França uma nova lei que obriga a formalizar por escrito qualquer contrato de arrendamento. Quem não cumprir, arrisca até um ano de prisão e multas de 20 mil euros. No entanto, a norma não é retroativa, o que impede a aplicação desta regra ao caso da reformada.
Desesperada, a mulher avançou com uma queixa-crime por fraude, falsificação e abuso de pessoa vulnerável. Em setembro de 2022, um tribunal penal deu-lhe razão, condenando o ocupante a pagar 70 mil euros por rendas em atraso e danos causados, além de ordenar o seu despejo no prazo de dois meses.
Despejo suspenso pela moratória de inverno
Apesar da sentença, o pedreiro recorreu e, com a chegada do inverno, beneficiou da moratória de despejos em vigor em França entre novembro e março. Durante esse período, as autoridades não podem proceder a expulsões, mesmo em casos de ocupação ilegal.
Na prática, isso significa que a mulher, agora com 78 anos, não poderá recuperar a casa antes da primavera. Até lá, o ocupante continua a usufruir do imóvel e a impedir o acesso de potenciais compradores ou técnicos.
Tentou até vender a casa
O marido da reformada contou ao jornal Le Parisien que o homem “chegou a tentar vender a casa com documentos falsos” e que, além de viver sem pagar, “ameaça” o casal sempre que este tenta resolver a situação. O caso tornou-se um exemplo extremo das falhas legais que ainda permitem a ocupação de propriedades privadas em França.
Com o processo parado e sem alternativas, a mulher pondera vender o imóvel, embora reconheça que é quase impossível fazê-lo enquanto o pedreiro lá viver. Nenhum comprador pode visitar a casa e o técnico responsável pelo certificado energético foi impedido de entrar.
Um casal à espera de justiça
Atualmente, o casal vive num apartamento social, mas teme perdê-lo por ainda constar como proprietário de outra habitação. A situação gera um impasse: não podem usar a casa que compraram, nem garantir o direito à morada onde vivem agora.
O caso despertou atenção mediática em França, reabrindo o debate sobre os direitos dos proprietários e a proteção excessiva concedida aos ocupantes ilegais durante o inverno.
A história que divide opiniões
Enquanto uns veem no caso um exemplo claro de injustiça, outros lembram que as moratórias foram criadas para proteger famílias em risco de exclusão. No entanto, quando a ocupação é feita por quem abusa da confiança, a lei parece falhar na sua missão principal: garantir o equilíbrio entre direitos e deveres.
Mais de duas décadas depois, esta reformada continua à espera de ver reconhecido o direito mais básico: o de viver na sua própria casa.
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