É hoje consensual na vida e sociedade portuguesa que a pouca eficácia da máquina administrativa do Estado resulta, em boa medida, da relação vertical de cada ministério, sem qualquer lógica de organização territorial horizontal, coordenação, interligação e respeito pelas dinâmicas políticas, económicas e sociais das diferentes realidades regionais.
A falta de coerência política das várias forças partidárias em torno da regionalização, tem provocado a falta de uma visão clara, integrada e esclarecedora sobre o desenvolvimento económico e social do país, uma consequência natural de um Estado centralista e, por conseguinte, cada vez mais agregador de poder, ausente e distante das populações.
Neste sentido, a regionalização apresenta-se como o instrumento mais adequado para aumentar a eficácia administrativa do Estado, através da transferência de competências, atribuições e meios para as futuras regiões, aproximando os centros de decisão das populações e garantindo, simultaneamente, os direitos participativos dos cidadãos na eleição dos órgãos responsáveis pela sua gestão e implementação.
O nosso sistema administrativo é excessivamente burocrático, velho e desactualizado, ineficaz e lesivo. A regionalização é a solução mais credível para conduzir a necessária e indispensável reforma do Estado
O que está em causa na regionalização é a coragem para mudar, uma vez que o centralismo já provou representar um desperdício de recursos e enormes atrasos nas decisões, consubstanciado na falta de concepções integradas e potenciadoras de desenvolvimento económico e social sustentável, cuja face mais visível são as grandes assimetrias e desigualdades que se verificam ao nível do nosso país, designadamente entre o litoral e o interior.
A falta de rigor na delimitação das grandes regiões, seis já no século XIII (D. Dinis), e os abusos dos responsáveis pelas comarcas medievais, bem como as confrontações e choques entre as autonomias municipais e o centralismo do Estado, designadamente nos séculos XIV e XV, foram as razões apontadas para justificar a necessidade de agregar cada vez mais o poder.
No século XIV, o mapa de Portugal definia 6 áreas naturais, entre as quais o Algarve, e que se mantiveram mesmo depois das reformas liberais que instituíram os distritos no século XIX, à semelhança do modelo francês.
Este modelo vigorou até ao regime anterior, quer como modelo militar, os chamados comandos territoriais, que muitos recordam do serviço nas forças armadas, quer como circunscrições administrativas englobando várias comarcas.
A ideia instalada nos meios políticos e partidários, consubstanciada na afirmação segundo a qual a regionalização promove o caciquismo é absurda, assim como a acusação de não termos políticos à altura de governar as regiões. O Algarve, por exemplo, sempre deu ao país muitos e bons governantes, e saberá encontrar os melhores entre os melhores para administrar e gerir os seus recursos e resolver os seus problemas.
O centralismo administrativo vem condicionando o centralismo económico, com efeitos ao nível do investimento e do emprego, eles próprios centralizados. A deslocação dos centros de decisão para a região, não tenho dúvidas, fixará o essencial do tecido empresarial que opera no Algarve, e que hoje joga as suas influências junto dos centros de decisão em Lisboa. O turismo constitui um bom exemplo desta realidade.
Neste contexto, e também por estes motivos, o centralismo revelou-se incapaz de promover um desenvolvimento equilibrado do país, tornando-se indispensável opor a esta estratégia de verticalidade uma outra capaz de conduzir o poder e a autoridade das decisões do topo para as bases.
O nosso sistema administrativo é excessivamente burocrático, velho e desactualizado, ineficaz e lesivo dos interesses do país e dos seus cidadãos. A regionalização é a solução mais credível para conduzir a necessária e indispensável reforma do Estado.
A regionalização deve, pois, ser entendida como um processo gradual, evolutivo e moderno, cujo sucesso dependerá da dinâmica e capacidade colectiva de todos, incluindo, naturalmente, a qualidade política e técnica dos nossos dirigentes.
Nestes termos, é preciso contrapor àqueles que acusam a regionalização de dividir o país, que o divisionismo resulta antes da incapacidade demonstrada pelo poder central no aproveitamento das potencialidades regionais e na resolução das assimetrias derivadas do vazio administrativo existente e da dependência das diversas delegações regionais de um órgão central – o seu ministério.
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia