O Olho do Mundo, primeiro volume de «A Roda do Tempo», série épica de Robert Jordan, foi reeditado em 2019, com tradução de Catarina Rocha Lima. O nome de Robert Jordan destacou-se sobretudo como autor desta série de fantasia épica, cujos vários volumes são bestsellers mundiais, e constitui uma das séries mais importantes na história da fantasia, com mais de 14 milhões de exemplares vendidos só nos Estados Unidos da América. Todos os livros da série atingiram o top de vendas do New York Times.
A saga reparte-se num total de 14 volumes, e tem 80 milhões de exemplares vendidos em todo o mundo. A Bertrand Editora já adquiriu os direitos para os primeiros seis dos 14 volumes que perfazem a série A Roda do Tempo.
A Grande Caçada constitui o segundo volume, publicado apenas meses depois do primeiro. O terceiro volume, O Dragão Renascido, foi publicado em 2020, e o quarto, A Sombra Alastra, publicado em 2021. Os Fogos do Céu, quinto volume, foi lançado em Julho de 2022, e O Senhor do Caos, o sexto volume desta fantasia épica, foi publicado em Março de 2023.
«A Roda do Tempo gira e as eras vêm e vão e deixam recordações que se transformam em lenda. A lenda dissipa-se, torna-se mito, e até o mito é esquecido, muito antes que a era que o fez nascer regresse novamente. Numa era que alguns chamaram a Terceira, uma era que há de vir, uma era que passou há muito, começou a levantar-se um vento nas montanhas da Bruma. Esse vento não foi o início pois não existem princípios nem fins no eterno girar da Roda do Tempo. Mas foi um início.» (p. 19)
A Roda do Tempo representa a segunda série de fantasia de culto mais vendida de sempre (O Senhor dos Anéis continua por destronar), com mais de 80 milhões de exemplares vendidos em todo o mundo, o que talvez se possa alterar nos próximos tempos, com a estreia da segunda temporada de uma série co-produzida pela Amazon Studios e a Sony Pictures. A adaptação da saga, inicialmente prevista para cinema, estreou em exclusivo na Amazon Prime Video, no dia 19 de novembro de 2021. A segunda temporada estreou no dia um de setembro deste ano, e já transmitiu o quarto episódio – são normalmente temporadas com oito episódios, de uma hora cada. O elenco é composto maioritariamente por jovens atores, destacando-se Rosamund Pike no papel da feiticeira Moiraine.
O ano de 2021 é assinalado pela estreia de diversas adaptações de grandes clássicos, não só de fantasia, mas também de ficção científica, como a série Fundação, baseada na trilogia de Isaac Asimov (autor cuja obra tem vindo a ser relançada pela Saída de Emergência), que vai já na segunda temporada, é ainda de assinalar a nova adaptação, agora à série televisiva, de O Senhor dos Anéis, de Tolkien (cuja obra tem igualmente vindo a ser relançada, pela Planeta Editora) – se bem que a ação desta nova desta adaptação remonte a um período muito anterior ao dos livros que deram origem aos filmes de Peter Jackson.
A série The Wheel of Time tinha tudo para ser um dos grandes acontecimentos do ano em que foi lançada, sobretudo para a legião de fãs deste universo. O problema quer desta série quer das outras aqui consideradas é o facto de estas adaptações apostarem, muitas vezes, numa reescrita profunda dos “guiões” originais, isto é, são baseadas nas obras, sem constituir uma reprodução fiel. Não quero com isto afirmar que o facto de estas obras serem livremente adaptadas tire valor às séries, mas penso que é seguro dizer que um leitor espera ver projetado na tela aquilo que lê, aquilo que recorda. E se pensarmos em filmes como A Casa dos Espíritos (que saltava toda uma geração, e suprimia personagens) ou As Brumas de Avalon é certamente consensual afirmar que estas longas metragens deixaram muito a desejar. Por outro lado, também houve filmes como O Senhor dos Anéis ou As Horas, que resultaram em adaptações belíssimas e que quase suplantam a mestria narrativa dos livros.
O Olho do Mundo, primeiro volume de «A Roda do Tempo»
O primeiro volume da saga, com 796 páginas, centra-se em Rand al’Thor, um jovem que vê o seu mundo ser virado do avesso, forçado a pôr em causa as crenças a que se agarrava na sua pacata existência de pastor, criado pelo pai, quando a sua aldeia é praticamente destruída por criaturas que só conhecia de histórias.
Com indícios sempre subtis, numa narrativa cuidada, ainda que sem lirismos, a intriga é trabalhada progressiva e compassadamente, revelando ao leitor como é bem possível que o ataque à pacata aldeia de Dois Rios tenha sido, na verdade, uma missão para matar Rand e os seus outros dois amigos, Matrim e Perrin, que têm partilhado sonhos inquietantes e idênticos. Com estes três jovens, seguem ainda duas jovens raparigas de Dois Rios, Egwene e Nynaeve, também elas prestes a descobrir a plena potencialidade dos seus poderes.
O mais notável neste livro é a forma como a narrativa, na terceira pessoa, acompanha sempre a perspetiva de Rand, o que significa que o próprio leitor vai desvendando este universo fantástico à medida que o próprio protagonista (que desconhece ser o herói) vivencia os eventos descritos e vai descobrindo um novo mundo, na sua viagem de sobrevivência até Rhuidean, guiado por uma feiticeira. Só no capítulo XX (pág. 306), portanto já bem a meio do livro, é que a perspetiva muda, justamente quando o grupo se separa, consoante acompanhamos os outros membros.
A Grande Caçada
A Grande Caçada, segundo volume de «A Roda do Tempo», com tradução de Catarina Rocha Lima e Joel Lima, retoma a ação exatamente no ponto em que encerrou o primeiro livro.
Rand al’Thor está agora ciente do fardo que lhe recai sobre os ombros. Embora se continue a sentir completamente incrédulo e os seus sonhos premonitórios continuem a ser prementes, são óbvios os olhares que as pessoas na cidadela de Fal Dara deitam ao jovem, quando por aí passa. Entretanto chega também à cidadela a Sede Amyrlin, a líder das mulheres-feiticeiras conhecidas como Aes Sedai, que, passado pouco tempo, convoca Rand al’Thor. A fuga de Rand a essa convocatória constitui, afinal, uma fuga à tomada de consciência daquilo que parece agora consumado: que é ele o Dragão Renascido. Segundo a profecia, o Dragão renascido pode ser o salvador do mundo. Mas pode igualmente ser o seu destruidor.
Neste universo ficcional em que a magia é exclusivamente dominada por mulheres, há quem não compreenda como deixam em liberdade o único homem capaz de canalizar o Poder; um homem que deve obviamente ser amansado pelas “feiticeiras”, pois continua a ser completamente imprevisível o que o poder pode fazer à mente de um homem – a sua progressão num indivíduo do sexo masculino nunca foi exatamente medida ou estudada. O que parece certo é que este poder, ao longo dos séculos, tem tomado sempre a forma de um mal que destrói a mente e o corpo do seu recetáculo, conduzindo-o gradual e irrevogavelmente à loucura.
As próprias Aes Sedai “não podiam exercer abertamente o seu poder desde a Rutura do Mundo, e muito menos o Poder Único”. No entanto, são peritas em intrigar e manipular os fios do tempo como bonecreiras, servindo-se “dos tronos e das nações como se fossem pedras num tabuleiro de jogo” (p. 165).
«Na Terceira Era, uma Era que ainda há de vir, uma Era há muito passada, o Mundo e o Tempo podem sucumbir, mas Rand, Mat e Perrin estão dispostos a sacrificar a sua própria vida para o evitar.»
O ambiente da saga evoca o medieval, pelo modo de vida descrito, numa realidade próxima da humana (sem anões ou elfos, em que as figuras inumanas são sobretudo as maléficas), onde a magia existe, ainda que vista com temor e desconfiança, circunscrita sobretudo às mulheres. Curiosamente, a magia nos homens pode ser tão poderosa como a das mulheres, mas é mais facilmente descontrolável, resultando em loucura e mortandade. O mal está aliás incorporado numa figura masculina: Ba’alzamon.
Robert Jordan entrelaça nesta saga épica vários universos distintos, dos contos de fadas aos mitos celtas, criando toda uma mitologia que bebe da cultura e filosofia da Europa e da Ásia, e muito especialmente da natureza cíclica do tempo do Budismo e do Hinduísmo, da destruição e renovação ao longo das eras.
Robert Jordan nasceu em 1948 em Charleston, Carolina do Sul. Aos quatro anos aprendeu a ler com a ajuda de um irmão mais velho, e aos cinco anos mergulhou nas aventuras de Mark Twain e de Júlio Verne. Com vinte anos, foi mobilizado para o exército dos Estados Unidos, cumprindo duas comissões no Vietname (de 1968 a 1970). Depois do seu regresso, licenciou-se em Física e, em 1977, iniciou o seu percurso como escritor.
Robert Jordan morreu a 16 de setembro de 2007, após uma corajosa batalha contra uma doença rara.
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