Nunca o tema da imigração foi tão debatido em Portugal. Em tempos muito se falou dos imigrantes oriundos das antigas colónias africanas, mais tarde houve uma vaga de cidadãos brasileiros, seguiram-se os do leste europeu, e agora são os indostânicos que são tema de conversa. Afinal, quantos são? Como se distribuem pelo país e pelo Algarve em particular, onde uma multiplicidade de línguas estrangeiras ecoa nas ruas dos 16 concelhos? Como estão inseridos na sociedade?
Se há números que são absolutos – os dos imigrantes legalizados e com estatuto de residentes em Portugal – existem outros que são uma verdadeira incógnita, nomeadamente os que se referem àqueles que lutam pela legalização, que são explorados em trabalhos agrícolas, de construção civil, que se amontoam em casas e dormem em beliches espalhados por todas as divisões.
O Algarve conta com quase 15 por cento do total de estrangeiros do país. Nos 16 concelhos do distrito de Faro vivem 109.636 estrangeiros, legais e com residência. Legalizados ou não, essa é uma distinção que não é feita por Paolo Funassi, de 46 anos, também ele imigrante, de nacionalidade italiana, e que escolheu Albufeira para viver há quase seis anos.
“Quero um Algarve focado nas pessoas e não num passaporte. Os estrangeiros não podem ser vistos como uma estatística. São pessoas”, conta ao Postal do Algarve Paolo Funassi, que já foi gestor e empresário em Itália, bem como assessor no Parlamento italiano, e que está determinado em transformar a política social no sul do país. “Os imigrantes não vêm para o Algarve apanhar sol e fazer praia, vêm para trabalhar. Os mais desfavorecidos querem sair da pobreza, não querem depender de um subsídio da Segurança Social”.
Paolo Funassi instalou-se em Albufeira e tornou-se mesmo no primeiro deputado estrangeiro numa assembleia municipal – a de Albufeira. Agora sonha com uma boa integração dos imigrantes na sociedade portuguesa. “Eles agrupam-se por nacionalidades, não convivem uns com os outros, e isso tem de mudar. Têm de estar mais integrados, de ter representatividade nas instituições, na política, nas assembleias municipais. São precisas ideias novas”.
Para que tal aconteça, Funassi diz que é necessária uma “mudança de mentalidades. O poder político não está muito recetivo a mudanças. Existem muitos poderes instituídos. Houve uma altura em que me ofereci para ser presidente dos bombeiros quando houve um problema de liderança e tive milhares de metralhadoras apontadas. Disseram-me para não chatear muito”.
“Portugal não é um país racista”
A imigração tem sido um tema polémico em alguns debates, com setas apontadas à entrada de imigrantes em território nacional. Mas Paolo Funassi rejeita a ideia de que Portugal seja um país racista. “Pode sim haver casos individuais de intolerância, ou de pequenos grupos, que têm vindo a aumentar devido à crise económica. Após a pandemia o estado social do país piorou e isso criou um ambiente negativo em torno da imigração”.
A vontade em ajudar na integração daqueles que escolhem Portugal para viver já causou ao italiano alguns cenários de preocupação.
“Fiz uma publicação nas redes sociais a pedir um campo de críquete para a comunidade indiana e recebi logo ameaças de morte, disseram que me iam esfaquear ou matar. Acusaram-me de querer fazer uma substituição demográfica, quando a única coisa que eu quero é ajudar os imigrantes a integrarem-se na sociedade portuguesa”, disse ao POSTAL.
Ingleses ainda ‘dominam’ Algarve
Os últimos números oficiais do ‘site’ PorData são de 2022 e apontam que Portugal é a casa de 781.247 imigrantes, devidamente legalizados e com estatuto de residentes. Um valor que representa o dobro de há 10 anos. E há uma nacionalidade que se destaca, uma vez que a comunidade brasileira representa 30 por cento do total (quase 240.000 imigrantes legalizados).
Mas no Algarve ainda são os ingleses que dominam o ranking. O sul do país sempre foi um dos cenários preferidos dos cidadãos britânicos para passar férias e até para viver. No distrito de Faro residiam em 2022 quase 22.000 ingleses, contra os 19.450 brasileiros. Bem longe na tabela ficam os franceses (6.191), italianos (5.727) ou indianos (5.492).
Mas se algumas nacionalidades têm ganho espaço, outras têm perdido influência a sul do país. Em 2008 residiam no Algarve 10.500 ucranianos, que agora são pouco mais de 5.000. O mesmo se passa com os romenos (7.000 em 2008 contra os 5.000 atuais) e moldavos (o número desceu de 6.500 em 2008 para pouco mais de 1.800).
- Por João Tavares
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