O presidente da Federação Portuguesa de Atletismo (FPA), Jorge Vieira, reiterou esta segunda-feira que o organismo que lidera não compra atletas, em resposta à insinuação de Nelson Évora sobre o também campeão olímpico no triplo salto Pedro Pablo Pichardo.
“Tem sido o meu propósito, ao longo de todos os anos ligados à modalidade e à FPA, em primeiro lugar, proteger a imagem dos nossos atletas, mas também tenho de proteger a imagem da própria instituição. Naturalmente, não vou discutir com os atletas, neste conflito verbal entre os dois, mas tenho de vir a terreiro quando aquilo que o Nelson diz afeta claramente a imagem da FPA”, respondeu, de pronto, Jorge Vieira.
Nelson Évora, campeão olímpico no triplo em Pequim2008, referiu, em entrevista à rádio Observador, que Pichardo, medalha de ouro na mesma especialidade em Tóquio2020, tinha sido comprado, contestando ainda a rapidez no seu processo de naturalização, em contraponto com o seu.
“Pensei ficar em silêncio, mas, naturalmente, quando conheci os pormenores da intervenção do Nelson, obviamente que me compete esclarecer o público e esclarecer também o Nelson. Esta situação, estas palavras utilizadas de dizer que a FPA compra atletas ou comprou, neste caso concreto, Pedro Pichardo, isso não aconteceu, de maneira nenhuma. Nós não compramos atletas, nós descobrimos atletas e ajudamos a preparar esses atletas para chegarem ao mais alto nível”, afirmou o líder federativo.
Na sequência da entrevista de Évora, de 38 anos, também campeão do mundo em Osaka2007 e da Europa em Berlim2018 e ‘indoor’ em Praga2015 e Belgrado2017, Pichardo, que já lhe reeditou o historial, ao juntar ao título olímpico ao mundial e europeu ao ar livre, em Oregon2022 e Munique2022, e aos dois europeus em pista coberta, em Torun2021 e Istambul2023, acusou-o, através da sua página oficial no Instagram, de lhe faltar ao respeito.
“Quando dizes que fui comprado estás a faltar-me ao respeito. Não sou uma prostituta nem sou como tu que saíste mal do clube, porque te ofereceram mais”, escreveu Pichardo.
Pichardo foi contratado pelo Benfica em abril de 2017, na sequência da transferência de Évora para o Sporting, depois de ter desertado da concentração da seleção cubana, em Estugarda, na Alemanha.
“Nós não falámos, eu nunca falei com o Pedro Pichardo antes do processo de naturalização dele, não o convidei para ser português, não o contactei antes de vir para Portugal. A mim, disseram-me ‘o Pedro Pichardo está em Portugal’ e, passado algum tempo, semanas, meses, que estava a avançar com a naturalização”, recordou.
Jorge Vieira, depois, detalhou o processo, ao qual a FPA juntou “uma carta de conforto”, esclarecendo que, com o currículo desportivo de Pichardo, poderia integrar o artigo 24.º da nacionalidade portuguesa, sobre casos especiais, nos quais se inserem estrangeiros que querem ser portugueses e já prestaram serviços ao país ou poderão prestar serviços de elevado nível ao país, disse o dirigente, quase citando a legislação.
“Foi isso que nós fizemos, apenas. Como fizemos, por exemplo, com a Auriol Dongmo. Não mais do que isso. Não oferecemos dinheiro, não comprámos, não prometemos pagamentos do que quer que seja, portanto, a compra, para mim, vista de uma forma absoluta, implica alguma troca de serviço por dinheiro. Aqui não houve. Zero pagamento do que quer que seja, até me choca um pouco falar neste termo”, vincou Jorge Vieira.
Por ter ficado desgastado com esta insinuação relativamente à FPA, Jorge Vieira justifica a sua intervenção.
“Não poderia, obviamente, deixar passar. E espero que os atletas em causa e o Nelson Évora, em particular, continuem a preservar a imagem que tem. Uma imagem de campeão, um atleta que está no coração da modalidade, que está no coração da FPA, sem qualquer dúvida. Apesar de todas estas mágoas que eu possa ter, nós consideramos o Nelson Évora, obviamente, alguém que ainda não é passado, ainda está no ativo e ainda há poucos meses financiámos um estágio dele, no Algarve”, referiu.
O líder federativo disse esperar que “tudo isto fique esclarecido”, em relação aos casos de naturalizações e também às opiniões de Nelson Évora – “um dos cinco campeões olímpicos, que merece uma enorme estima, consideração e amizade” -, escusando-se, para já, a intermediar o conflito.
“Não falei com os atletas. Irei falar, com certeza, num futuro próximo. Neste momento, as emoções estão à flor da pele e julgo que as redes sociais tomam logo conta destes assuntos, estimulando a que as pessoas emitam opiniões. Se não soubermos cultivar também o silêncio, vamos subindo degraus que não permitem resolver este problema”, salientou.
E, por isso, alimenta a esperança de promover o atletismo com a ajuda de ambos.
“Eu espero, no futuro, entender-me com os dois atletas e, sobretudo, conquistar os dois para os dois fazerem muito ainda pelo atletismo português, dando o seu exemplo, sendo referências, ajudando a que outros jovens sejam bons atletas. Julgo que é algo que o país espera de atletas em quem todos nós investimos. Espero vir a convencê-los a serem úteis para o atletismo português, para que o atletismo português também usufrua do seu papel de modelos de referência e que possam ser úteis para a juventude portuguesa, sobretudo”, concluiu.