Sustentabilidade dos Sistemas Alimentares Locais no centro do debate da atualidade
A vivermos uma segunda vaga da pandemia causada pela Covid 19 mostrou-se oportuno relacionar esta situação da saúde mundial com a sustentabilidade dos sistemas alimentares locais. Esta correlação foi um dos motes para a conversa tida no passado dia 19 de novembro a partir de São Brás de Alportel. A decorrer desde o mês de Outubro e com término em Dezembro, este ciclo de debates online sob o mote «O que a Europa faz por mim», é uma iniciativa conjunta do centro de informação Europe Direct Algarve, Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve (CCDR Algarve), de resto a entidade hospedeira do centro, e das Associações de Desenvolvimento Local do Algarve, envolvendo outros parceiros locais, com o objetivo de celebrar os resultados da política de coesão na região, mostrando o que a Europa tem feito nos territórios, constituindo, igualmente, uma oportunidade para ouvir os cidadãos sobre o futuro destes territórios em cada um dos temas escolhidos.
Artur Gregório, presidente da Associação In Loco, na abertura do evento, destacou a importância nesta fase da discussão em torno da sustentabilidade dos sistemas alimentares locais, e lembrou que “cada vez que há uma crise ou uma convulsão este tema é colocado em cima da mesa”, e defendendo que “os sistemas locais e globais devem ser analisados”. Este responsável recordou que “a nova PAC [Política Agrícola Comum] tem um caminho bastante diferente da antiga que nos leva a pensar que algo irá mudar a esse nível”, realçando a importância dos oradores para poderem esclarecer acerca do que está por vir.
Por seu lado, Catarina Cruz, diretora do Centro Europe Direct, realçou a importância da parceria para a realização deste diálogo, afirmando que “este também é o papel dos Centro Europe Direct”. Catarina Cruz, salientou a Dieta Mediterrânica como um estilo de vida e contou que “tem havido um grande empenho da CCDR para a valorização deste património onde cabem também os sistemas de produção locais”.
Sistemas alimentares em discussão há duas décadas
O primeiro orador convidado a deixar a sua reflexão foi Artur Cristóvão, vice-reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, que lembrou que têm sido vários os debates em torno deste tema e muito se tem produzido mais recentemente, sem deixar de salientar a análise feita nas últimas duas décadas sobre do regime alimentar global; desde a existência de uma soberania de poder, assimetrias e desequilíbrios nas cadeias alimentares. Segundo Artur C. as críticas aos sistemas alimentares têm dado origem a inúmeros movimentos de diversa dimensão, citando o movimento slow food. São movimentos centrados na agricultura e alimentação que debatem a democracia alimentar, a agricultura cívica, o comércio justo, consumo ético. O vice-reitor defende a necessidade de reequilíbrio crescente entre o global e o local, bem como entre consumidores e produtores. Colocando o dedo na ferida, Artur Cristóvão refere as evidentes desconexões entre a alimentação e a natureza, e entre os produtores e os consumidores.
Pandemia Covid19 despertou cidadãos para a importância do acesso à alimentação de qualidade
Luís Chaves, coordenador da federação «Minha Terra» considerou que a pandemia covid-19, despertou os cidadãos “para uma atenção renovada para o acesso a uma alimentação de qualidade como um desafio societal”. Na sua ótica “a transição para sistemas alimentares mais sustentáveis deve ter por base opções individuais de cidadãs e cidadãos mais informados quando escolhem e adquirem os seus produtos alimentares, mas também um contexto legal e institucional mais favorável, onde as políticas públicas – tanto as que regulam a produção, transformação, comercialização e consumo, como os sistemas de incentivos – podem ter um papel central”. Em linha de definição Luís Chaves relembra que “os sistemas alimentares locais são complexos, ancorados em territórios, nos seus recursos e redes de atores”.
Comité das Regiões: recessão económica e o agravamento do impacto na segurança alimentar e nutricional
Vítor Guerreiro, presidente da câmara municipal de São Brás de Alportel falou enquanto representante do Comité das Regiões, lembrando que a “a pandemia expôs as fragilidades dos nossos sistemas alimentares”, tendo reiterado a importância da segurança alimentar. O autarca considera que este momento de crise deve ser aproveitado para “reduzir o impacto ambiental da nossa produção alimentar, redefinir as nossas cadeias de abastecimento alimentar, orientar os nossos hábitos para escolhas mais saudáveis e sustentáveis e apoiar, ao mesmo tempo, os agricultores para que façam a transição no terreno”.
Estratégia do Prado ao Prato
“O Comité das Regiões Europeu (CR) apoia firmemente a Estratégia do Prado ao Prato. Muitos dos pontos defendidos na estratégia convergem com as recomendações que o Comité fez nos últimos anos”, garantiu Vítor Guerreiro, mostrando-se satisfeito “com o facto de a estratégia se referir a metas e medidas concretas, como as relativas à redução da utilização de pesticidas químicos, fertilizantes e agentes antimicrobianos nos animais de criação e na aquicultura, bem como metas para o aumento da agricultura biológica e a redução das perdas alimentares e do desperdício alimentar e a imposição de medidas destinadas a melhorar o bem-estar dos animais”. E alertou que no entanto, para que a estratégia funcione, é necessário financiamento e instrumentos para concretizar a transição no terreno.
Sustentabilidade dos Sistemas alimentares locais no centro das preocupações europeias
O Diretor Regional da Agricultura e Pescas do Algarve marcou presença neste diálogo, tendo sublinhado o trabalho que considera ser de extrema importância quando falamos nos circuitos curtos, bem como na promoção e proteção dos sistemas alimentares locais. Segundo Pedro Valadas Monteiro esta temática é “algo que está também no centro das preocupações das políticas que estão a ser preparadas em Bruxelas no âmbito do novo Quadro de Apoio, bem como a nível nacional”. Segundo este responsável é primordial que “os europeus disponham de alimentos saudáveis, acessíveis e sustentáveis. Bem como é premente combater as alterações climáticas, protegendo o ambiente e a biodiversidade”. Pedro V. Monteiro foi ainda perentório ao afirmar que é determinante haver um rendimento económico justo na cadeia alimentar, bem como é determinante expandir a agricultura biológica”. Na sua apresentação referiu ainda a meta de redução de utilização de 50% dos pesticidas até 2030. A «Agenda de Inovação» foi também focada por este responsável que referiu que os documentos estratégicos criados neste âmbito são diversos, tanto de índole comunitário como nacional.
Setor agroalimentar foi identificado como domínio de especialização inteligente
Para Aquiles Marreiros, do Órgão de Acompanhamento das Dinâmicas Regionais, “as Estratégias de Especialização Inteligente (RIS3) são abordagens baseadas nas especificidades dos territórios que pressupõem que o investimento se baseia no conhecimento, concentrando esforços na identificação de prioridades, selecionadas com base nos pontos fortes e ativos estratégicos de base regional”. Este responsável explicou que “no caso da RIS3 Algarve, o setor agroalimentar foi identificado como domínio de especialização inteligente, com potencial de gerar valor, no quadro da promoção do conceito de variedade relacionada com os diferentes setores, nomeadamente a saúde e o turismo.
Câmara de Faro e o investimento nos produtores locais
Carlos Baía, vereador do município de Faro, marcou presença neste encontro e reiterou que o município considera que o tema da sustentabilidade dos sistemas alimentares locais “ganha particular relevância num período como aqueles que atravessamos, marcado pela pandemia Covid 19, que nos veio, uma vez mais, relembrar da fragilidade dos sistemas de distribuição em períodos de crise, bem como da importância de assegurarmos a sustentabilidade dos sistemas de produção locais”. O autarca explicou que “em contexto de crise, o município, em parceria com diversas instituições do concelho, trabalhou por forma a assegurar que não faltariam alimentos a todos aqueles que deles necessitassem, procurando incentivar a aquisição de bens alimentares a produtores locais, para distribuição”.
Mértola avança em várias frentes com o envolvimento da comunidade
Marta Cortegano, coordenadora da ESDIME – Agência para o Desenvolvimento Local no Alentejo Sudoeste, mas também representante de diversas entidades de Mértola, contou como este concelho está a desenvolver diversas respostas na ótica da sustentabilidade dos sistemas alimentares locais. Revelou que houve uma evolução do projeto da agricultura sintrópica instalado em Mértola, bem como criada uma associação para o efeito. Marta Cortegano deu conta que está a decorrer no seio da comunidade uma transição agroecológica e soberania alimentar.
O papel do Estado é determinante , defende jovem agricultora
A agricultora Ângela Rosa, da Orgânica Shanti, em Tavira, alertou que “o reforço dos sistemas alimentares locais, desde a produção de alimentos, da transformação de produtos até à distribuição local dos mesmos revela-se essencial, senão determinante, para garantir a segurança alimentar das populações, especialmente, mas não só, em tempos de crise económica, social, ambiental, cultural e humanitária, como é o momento atual que atravessamos”.Sublinhou também a necessidade de ser garantido “o direito a uma alimentação saudável e adequada por via do food empowerment/capacitando as pessoas a produzir os seus próprios alimentos ou a consumir alimentos produzidos/transformados localmente é potenciar a fluidez básica da economia local e assegurar o combate à fome”. E rematou, defendendo que “o reforço às cadeias curtas de comercialização é fortificar a base económica local e um dos pilares para uma economia circular, criadora de emprego, ambientalmente sustentável e socialmente saudável”.
Prato Certo luta pelo direito universal a uma alimentação adequada
Vânia Martins e Ana Poeta, técnicas da Associação In Loco marcaram presença para explicar a pertinência da criação do projeto «Prato Certo» que ao nascer no seio da associação vai ao encontro do direito universal a uma alimentação adequada, que representa a missão do Observatório da Segurança Alimentar e o objetivo fundador do projeto.
“É comum em todo o mundo que em situações de crise a insegurança alimentar cresça, ou seja, que aumente a dificuldade em aceder a uma alimentação adequada, tanto do ponto de vista nutricional como das quantidades mínimas, 2008 foi prova deste fato”. As técnicas explicaram que “perante a enorme mobilização e o impacto das intervenções junto da comunidade, o Observatório de Segurança Alimentar, deu início a uma segunda etapa de aprofundamento do trabalho de educação alimentar – «O Prato Certo», apoiado pelas “Parcerias para o Impacto”, do Programa Portugal Inovação Social, com o objetivo de combater a insegurança alimentar, na defesa do direito a uma alimentação adequada, promovendo para esse fim uma campanha massiva de educação alimentar na comunidade, com uma atenção redobrada nos grupos de menor literacia alimentar, bem como dos seus cuidadores e técnicos de apoio social”.
Carlos Reis Reefood
Carlos Reis, voluntário da Reefood marcou presença, salientando a importância da incrementação das cadeias curtas como instrumento, também, de combate do desperdício alimentar [a nível mundial ascende aos 30%]. “A reefood faz a ponte entre o excesso e a carência”, contextualizou este voluntário que contou que durante o primeiro confinamento houve um trabalho de reinvenção da Reefood para conseguir dar continuidade ao seu papel, havendo uma aproximação aos supermercados para além dos restaurantes. “Cabe à reefood transformar o desperdício em recurso”, sublinhou Carlos Reis.
O próximo Diálogo deste ciclo acontece no dia 17 de dezembro em Monchique sob o tópico Desenvolvimento local e qualidade de vida co-organizado com a Associação Vicentina e com a colaboração da CCDR Algarve.
O Centro Europe Direct Algarve é um serviço público que tem como principal missão difundir e disponibilizar uma informação generalista sobre a União Europeia, as suas políticas e os seus programas, aos cidadãos, instituições, comunidade escolar, entre outros. Está hospedado na CCDR Algarve e faz parte de uma Rede de Informação da Direcção-Geral da Comunicação da Comissão Europeia, constituída por cerca de 500 centros espalhados pelos 28 Estados Membro da União Europeia.
A Rede de Centros Europe Direct em Portugal inclui 15 centros e é apoiada pela Comissão Europeia através da sua Representação em Portugal.
Os Centros de Informação Europe Direct atuam como intermediários entre os cidadãos e a União Europeia ao nível local. O seu lema é «A Europa perto de mim»!