O português falado no Brasil, a maior ex-colónia de Portugal, encontra-se em constante evolução e, dentro de algumas décadas, poderá ser reconhecido como “Brasileiro”, em vez de “Português”. Esta é a tese defendida por Fernando Venâncio, um linguista português, na sua obra recente ‘Assim Nasceu uma Língua’ (editora Tinta da China), onde explora as origens e a trajetória da língua portuguesa. Neste artigo, explicar-lhe-emos as razões que levam o linguísta a pensar assim, com a colaboração da Executive Digest.
Venâncio sustenta, com base em diversos estudos académicos e documentos históricos, que o Português não surgiu, na verdade, em Portugal, mas no Reino da Galiza, uma região que integrava o que hoje conhecemos como Galiza, em Espanha, e que foi fundado no século V, após a queda do Império Romano. “A simples ideia de que, algum dia, um idioma estrangeiro possa ter sido a língua de Portugal é-nos insuportável”, escreve o linguista, questionando o ‘orgulho lusitano’.
Contudo, Venâncio não se limita a analisar as raízes históricas da língua. O linguista vislumbra também um futuro em que a variante falada no Brasil se distanciará de tal forma do Português europeu que acabará por ser considerada um idioma autónomo. “Não há maneira de retroceder, não há maneira de travar esse processo de afastamento entre o Português e o Brasileiro”, prevê Venâncio, antecipando que, num futuro não muito distante, o mundo poderá referir-se ao idioma falado no Brasil como “brasileiro”.
Esta previsão assenta na constatação de que, apesar das influências recíprocas entre as variantes brasileira e portuguesa, as diferenças linguísticas estão a tornar-se cada vez mais pronunciadas. Venâncio exemplifica esta divergência com a adoção de termos brasileiros por crianças portuguesas, como o uso de “geladeira” em vez de “frigorífico”. “A criança não está a falar brasileiro, está a falar um pouco à brasileira e, na vida real, isso não tem importância”, comenta Venâncio, minimizando o impacto imediato destas diferenças, mas reconhecendo a sua importância a longo prazo.
Por outro lado, muitos linguistas e gramáticos, tanto no Brasil como em Portugal, argumentam que ainda persiste uma unidade significativa entre as duas variantes. Sustentam que os morfemas (artigos, preposições, pronomes, entre outros) permanecem idênticos e que o Português culto no Brasil é praticamente indistinguível do Português culto em Portugal. Estes elementos, segundo eles, impediriam a cristalização de uma “língua brasileira” distinta.
Venâncio não se detém, no entanto, nestas questões técnicas. Para o linguísta, a linguagem “espontânea” utilizada no Brasil, que se afasta da norma culta tradicional, está a criar uma cisão crescente entre as duas variantes. “Vai dar-se um afastamento do Português europeu. Não sabemos quando é que será. Só sabemos dizer que isso é inevitável”, conclui.
No fecho de ‘Assim Nasceu uma Língua’, sublinha a BBC, Venâncio reflete sobre o futuro da Língua Portuguesa e sugere que esta poderá fragmentar-se em outras línguas, tal como sucedeu com o latim, a língua dos romanos. “Sabermos isso faz-nos, a nós, mais felizes? É o mais certo”, escreve, deixando em aberto a inevitabilidade da evolução linguística e cultural que acompanha a história das nações.
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