A Diocese do Algarve informou esta quinta-feira que, seguindo indicações da Santa Sé, arquivou um dos dois casos de alegados abusadores indicados pela Comissão Independente, enquanto o outro “não corresponde a nenhum sacerdote incardinado” na região.
Em comunicado, a Diocese adianta que a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja em Portugal entregou ao bispo do Algarve, na passada sexta-feira, uma lista com dois nomes de sacerdotes, alegados abusadores.
“Um dos nomes refere-se a um caso que a Diocese do Algarve teve conhecimento em outubro de 2021 e que desencadeou imediatamente a investigação prévia, com informação ao Ministério Público, cujo resultado foi enviado para a Santa Sé, a qual, após a análise do processo, indicou que o mesmo devia ser arquivado”, refere.
O segundo nome indicado “não corresponde a nenhum sacerdote incardinado na Diocese do Algarve, nem se encontra nos arquivos diocesanos alguma referência a seu respeito”, assegura, acrescentando que o bispo do Algarve, D. Manuel Quintas, já informou a Comissão Independente desta ocorrência, “ficando a aguardar uma informação adicional sobre este assunto”.
Por outro lado, o bispo do Algarve convocou, em data que não foi anunciada, todo o clero da Diocese para uma assembleia geral “destinada a estudar medidas para prevenir a possibilidade de ocorrência de abusos no futuro, quer envolvendo menores, quer adultos vulneráveis, a partir da legislação civil e canónica em vigor”.
O comunicado recorda que na sua mensagem quaresmal, D. Manuel Quintas considerou a publicação do relatório para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa pela Comissão Independente como “um veemente apelo à conversão” que exige “coragem e decisão em conhecer a verdade”.
“Ninguém pode abafar ou ignorar este grito”
“Ninguém pode abafar ou ignorar este grito”, sublinhou nessa ocasião o bispo do Algarve, considerando que o relatório remete para “uma realidade inqualificável”.
Para o clérigo, a Igreja é chamada a “assumir a responsabilidade que essa verdade reclama”, garantindo que a Diocese do Algarve tudo fará para que sacerdotes e demais agentes de pastoral “recebam informação e formação sobre este assunto, com o objetivo de criar uma ‘cultura do cuidado e da transparência’ em todas as instituições diocesanas”.
E acrescenta: todas as comunidades devem desenvolver uma “nova sensibilidade de modo a prevenir e a denunciar situações que possam ocorrer na proteção e defesa das crianças, adolescentes e adultos vulneráveis”.
Na mesma nota, D. Manuel Quintas apela “a todos, no sentido de manterem a esperança e de cultivarem um sentido cristão de acolhimento total às vítimas, bem como de caridade e acompanhamento em relação aos abusadores, chamados a assumir as consequências canónicas e civis dos seus atos”.
Comissão Independente validou, a nível nacional, 512 dos 564 testemunhos recebidos
A Comissão Independente validou, a nível nacional, 512 dos 564 testemunhos recebidos – entre janeiro e outubro de 2022 -, apontando, por extrapolação, para um número mínimo de vítimas da ordem das 4.815.
Foram reportados ao Ministério Público 25 casos, que deram origem à abertura de 15 inquéritos, dos quais nove foram já arquivados, permanecendo seis em investigação.
Estes testemunhos referem-se a casos ocorridos no período compreendido entre 1950 e 2022, o espaço temporal que abrangeu o trabalho da comissão.
O sumário do relatório, contudo, revela que “os dados apurados nos arquivos eclesiásticos relativamente à incidência dos abusos sexuais devem ser entendidos como a ‘ponta do iceberg’”.
Na manhã da última sexta-feira, esta comissão liderada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, entregou aos responsáveis pelas diferentes dioceses a lista dos alegados abusadores.
Nesse mesmo dia, após analisar o relatório final da comissão independente, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, José Ornelas, disse que o afastamento de alegados padres abusadores de menores está nas mãos de cada bispo, admitindo que “se houver uma plausibilidade de pôr em perigo o contacto com outras pessoas e a persistência de eventuais delitos” essas pessoas podem ser objeto de uma suspensão cautelar.
No entanto, sublinhou, é importante que “sejam dados os nomes e descrições plausíveis”, para investigar. “Eu não posso tirar uma pessoa do ministério só porque chegou alguém que disse ‘este senhor abusou de alguém’. Mas quem foi que disse, em que lugar, onde? Tirar do ministério é uma coisa grave”, realçou.