A presença do gato Zé Albino aligeirou a campanha. As críticas fizeram-se soar: enquanto se fala de gatinhos, pouco se fala do resto que importa. Houve quem alinhasse na bicharada e quem a ignorasse, mas o tweet de Rio com o seu gato, aproveitando para uma crítica a António Costa, foi apenas um dos exemplos em que a campanha das redes saltou para as ruas. E não, não era apenas uma foto de gatinhos.
Rui Rio tem uma estratégia global de moldar a sua imagem junto do eleitorado, aliviando o ar sério e até austero com que era muitas vezes visto. E a sua participação nas redes sociais, sobretudo no Twitter, é mais um tijolo – e importante – nessa construção de uma imagem mais leve, mais confiável. Em contraponto, António Costa quer aparecer como estadista, mais formal e por isso a aposta do PS nas redes sociais foi a de partilhar vídeos do seu líder, em tom quase professoral, a explicar alguns temas. A campanha nas redes sociais diz muito sobre o que os partidos estão a fazer e ajuda também muitas vezes a dar a volta ao texto e à campanha. Foi o que aconteceu esta quarta-feira.
Quem entrar esta quarta-feira no Facebook ou no Twitter dificilmente escapará à onda de críticas que têm assolado o líder do PSD pelo seu comportamento com jornalistas. Tudo começou com um texto, na rede social Facebook, do antigo jornalista do Público Paulo Moura, a contar um episódio que teve com Rui Rio em 2007, quando este era autarca do Porto. No texto, o jornalista conta como o social-democrata tentou alterar e impedir que uma entrevista fosse publicada, incluindo recorrer a uma providência cautelar.
E este foi um episódio que tocou em Rui Rio ou, como diria o próprio, que o picou. O colunista do Expresso Daniel Oliveira partilhou esta história de Paulo Moura nas suas redes sociais e foi Rui Rio quem respondeu. Num primeiro ato, escreveu que a história do antigo jornalista do Público era “um testemunho feito à medida que interessa a quem o fez e com o grau de veracidade que convém aos seus objetivos políticos. É este o nível para que, à esquerda, se está a querer empurrar a parte final desta campanha eleitoral”.
Poucos minutos depois, partiria ao ataque falando no geral, mas virando-se para o PS, acusando o partido de António Costa por, de forma “vergonhosa” e com uma “campanha negra”, “deturpar” as propostas do PSD e “truncar” afirmações”. “O seu nível é muito baixo”, escreveu.
Rui Rio escrevia no geral, colando a denúncia do jornalista a socialistas. Mas fê-lo no dia em que outros jornalistas o fizeram. Nomeadamente o diretor do Público, Manuel Carvalho, que no editorial do jornal lembrava alguns episódios sobre Rui Rio e escrevia que “o Rui Rio sorridente e com gatinhos acabará na primeira contrariedade. Com ele no governo, o ‘rigor’ vai apertar a liberdade de crítica e de expressão, vai colidir com a separação de poderes, vai, enfim, tornar a vida pública do país mais tensa e áspera”.
Estas histórias tiveram o condão de dar uma manhã difícil ao presidente do PSD, que se viu quase sozinho a defender-se nas redes. Contudo, além daqueles episódios, Rio referia-se também ao que António Costa tem dito sobre o que defende o PSD em relação ao salário mínimo. Além dos discursos de Costa e dos cabeças de lista, partilhados pelas redes oficiais dos candidatos e do partido, os socialistas fazem pequenos vídeos, alguns que se tornam virais. O último, que andou a circular por mensagens de WhatsApp e partilhado também nas redes sociais, como o Facebook ou o Twitter, foi um vídeo com declarações de Rui Rio contra o aumento do salário mínimo, para fazer passar a ideia de que o social-democrata tem uma agenda escondida que não revela no seu programa.
As sondagens mostram que o PSD está a ter mais dificuldades em entrar no eleitorado com menores rendimentos e o PS carrega onde dói ao PSD: no salário mínimo e na saúde, a reboque da intenção do PSD de rever a Constituição e alterar a expressão “tendencialmente gratuito” referindo-se ao SNS. Sobre esse assunto, os socialistas fizeram rodar outro vídeo com declarações de Rui Rio à Antena 1 sobre o tema. Um deles foi o deputado João Galamba, candidato por Lisboa, que tem estado bastante ativo nesta campanha eleitoral.
Rio tenta contrariar o discurso, acusando António Costa de “faltar à verdade” ou de “mentir”. Mas nas redes sociais passa pouco a sua defesa. Aliás, nas respostas aos seus tweets há vários pedidos de esclarecimento. Ou seja, como Rio não desmente, apenas se defende, há quem vá apenas perguntar afinal o que é mentira. E Rio não responde.
É este o modo como o líder social-democrata se move, sobretudo no Twitter. Responde pouco a quem lhe coloca perguntas, mas faz bastantes tweets a lançar farpas, quase todas com um “emoji” no fim. Procura o sarcasmo em muitos dos textos ou a crítica direta, tentando ridicularizar o lado de lá.
Recorrer ao humor, a começar pelo uso de emojis na sua rede preferida ou a um tom menos formal, tem sido a estratégia de Rui Rio para se fazer ouvir nas redes sociais. A de António Costa e dos socialistas faz-se quase em oposto: criam-se vídeos com o objetivo de se tornarem virais, em que António Costa aparece com tom quase professoral a explicar alguns temas. Contudo, todos os partidos acionaram os seus soldados para se defenderem e atacarem o adversário, um campeonato ganho pela Iniciativa Liberal, que tem um esquadrão em desfilada bastante ativo nas redes. A campanha nas redes sociais pode ter tanta ou mais influência que a da rua e nem todos os partidos a gerem da mesma maneira.
A maior parte dos líderes tem usado as redes sociais para publicar os seus discursos, declarações ou vídeos e apresentações de propostas. Raros são os que têm uma presença mais fluida, de resposta aos internautas. O PS, por exemplo, preparou uma campanha com presença nas redes sociais, com os cabeças de lista a terem equipas de vídeo e fotografia – e não só o líder – para passar a mensagem nas várias plataformas. Um desses exemplos é Pedro Nuno Santos, cabeça de lista por Aveiro. O vídeo que partilhou esta quarta-feira tinha mais de 15 mil visualizações em menos de duas horas.
Além disso, os socialistas têm uma conta de WhatsApp por onde vão passando informações. A última foi a partilha de uma notícia do jornal Eco a dar conta de que as tabelas de retenção na fonte foram corrigidas para que os aumentos de salários e pensões não fossem absorvidos pelas tabelas de IRS.
Esse tem sido um dos temas que tem dado mais trabalho aos socialistas nas redes sociais. Várias pessoas acusaram o PS de não defender os aumentos salariais e de pensões, uma vez que o IRS iria “comer” esses aumentos. Por isso, a mensagem via WhatsApp serviu o propósito de alimentar as massas de soldados nas redes com a resposta a essa crítica.
Um esquadrão à desfilada nas redes
Poucos partidos serão, no entanto, mais eficazes do que a Iniciativa Liberal nas redes sociais. Os liberais têm um verdadeiro exército que se faz ouvir, muito mais no Twitter do que no Facebook. É também ali que está muito do eleitorado alvo do partido, que não tem desperdiçado as várias ocasiões para fazer uma montagem, passar uma mensagem ou uma contradição de outros.
Contudo, muitos dos internautas liberais passaram os últimos dias a explicar as suas propostas, numa guerrilha com a esquerda, sobretudo com membros do Bloco de Esquerda. Primeiro sobre o facto de o programa da IL não mencionar as deduções fiscais para pessoas com deficiência e, nos últimos dias, sobre o uso do indicador “carga fiscal” para criticar as políticas de Costa.
Aliás, um dos alvos dos bloquistas nas redes tem sido a Iniciativa Liberal. Não é de somenos, algum do eleitorado poderá cruzar-se e até foi nesse sentido que Catarina Martins, no debate contra Cotrim de Figueiredo, levou para cima da mesa uma proposta antiga da IL de que os estudantes do ensino superior deveriam pagar, através de empréstimo, os seus estudos. A proposta caiu, foi o próprio líder a explicar que ela não tinha pés para avançar, mas a batalha das propostas estava nas ruas digitais.
O BE tem vários elementos muito ativos nas redes e com muito lastro, como as duas deputadas Mortágua, Joana e Mariana, Fabian Figueiredo, da Comissão Política bloquista, e Maria Escaja ou Leonor Rosas, deputadas municipais e candidatas pelo círculo de Lisboa.
Nos últimos anos, o PCP modernizou a linguagem nas redes sociais e passou a fazer vários vídeos, muitos que se tornaram virais. Há também uma leva de novos deputados que são bastante ativos, como é o caso de Duarte Alves ou Alma Rivera. O Twitter serve mais de campo de batalha político enquanto no Facebook partilham as informações e vídeos mais formais e institucionais.
Os líderes têm uma presença mais formal nas redes sociais. Um dos mais ativos é mesmo Rui Tavares, do Livre, que mesmo antes de ser candidato às legislativas já tinha uma presença bastante assídua. Nesta campanha, tem usado as redes sociais para passar a sua mensagem. Um pouco à semelhança dos debates, pouco critica outros.
De todos os líderes, André Ventura é o mais frenético nas redes sociais. Além do Twitter e do Facebook, com muitas publicações por dia, o líder do Chega tem mais lastro no YouTube, com a partilha de vários vídeos com as suas intervenções. É a rede onde acaba por ser mais forte.
Por outro lado, o CDS e o PAN têm mais dificuldade em entrar na linguagem das redes sociais. Tanto Inês de Sousa Real como Francisco Rodrigues dos Santos têm presença online, são ativos, mas mais discretos. Contudo, a líder do PAN entrou na conversa dos bichos.
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL