Numa vaga inédita, mais de 50 membros do Governo de Boris Johnson demitiram-se — quatro ministros, dezenas de secretários de Estado e deputados que asseguravam a articulação entre Executivo e Parlamento. Hoje deu-se o extremo de uma ministra da Educação nomeada terça-feira à tarde, Michelle Donelan, ter renunciado ao cargo.
O primeiro-ministro não queria demitir-se e prometeu até substituir todos os demissionários, mas rapidamente se percebeu que era aritmeticamente difícil encontrar ocupantes para os cargos. As saídas do Governo e os posicionamentos públicos de muitos outros deputados a exigir a demissão do líder implicavam que não houvesse onde ir buscar novos ministros.
Também ficou claro que havia quórum para encurtar os prazos entre moções de censura internas (presentemente de um ano, pelo que Johnson estaria a salvo desse procedimento até junho de 2023, uma vez que venceu uma moção de censura interna a 5 de junho último por 211 votos contra 159), e que o resultado de uma putativa votação seria largamente desfavorável ao chefe.
“O primeiro-ministro fará uma comunicação ao país hoje”, anunciou um porta-voz de Johnson após este ter falado com o deputado Graham Brady, presidente do Comité 1922, que gere os procedimentos de destituição e eleição do líder conservador, noticiou a BBC. Fonte tory citada pela emissora britânica afirma que o primeiro-ministro “aceitou sair a tempo de se empossar um novo líder antes da conferência [do partido], em outubro”.
Johnson já falou com Isabel II, avança a BBC
A rainha já foi informada da intenção de Boris Johnson de sair do país, informa a emissora pública britânica. Embora o palácio de Buckingham não confirme oficialmente a informação, fontes do Governo têm-na transmitido aos correspondentes políticos.
A chefe de Estado não terá intervenção no processo de transição até que haja alguém em condições de suceder a Johnson, isto é, que garanta o apoio de uma maioria parlamentar. É previsível que só aconteça após a eleição do futuro líder do Partido Conservador.
Será Dominic Raab o próximo primeiro-ministro?
O atual Governo britânico tem um vice-primeiro-ministro, Dominic Raab, que pode assumir interinamente a chefia caso Boris Johnson se afaste imediatamente, como muitos conservadores (e toda a oposição) defendem. Ficaria até o partido eleger novo líder.
Ministro da Justiça, Raab foi candidato à chefia do partido em 2019, quando Johnson foi o vencedor. Já esteve na pasta dos Negócios Estrangeiros com o atual primeiro-ministro e foi ministro do Brexit nos tempos de Theresa May. É deputado desde 2010.
A dúvida é se alguém que se manteve com Johnson durante todo o processo dos últimos dois dias dará ao partido as garantias de que precisa. Os conservadores temem os danos à imagem que a obstinação do agora demissionário Johnson possa causar-lhes.
Ex-chefe de gabinete Dominic Cummings pede expulsão imediata de Johnson
Já foram aliados, da campanha do referendo pela saída da União Europeia até às legislativas que levaram Boris Johnson ao poder com maioria absoluta. Em 2020 zangaram-se e Dominic Cummings deixou de ser chefe de gabinete do primeiro-ministro. Desde então, tudo tem feito por minar o ex-amigo. O homem que fez várias das revelações sobre o escândalo Partygate (festas ilegais na residência oficial do primeiro-ministro e em instalações do Governo durante a pandemia) avisa agora o país: “Despejem-no HOJE ou ele causará CARNIFICINA. Mesmo agora está a tentar ganhar tempo e tentará ficar, nem ‘dignidade’, nem ‘interino durante a corrida à liderança’.” Cummings aconselha, pois que o vice-primeiro-ministro Dominic Raab seja nomeado chefe do Governo interino ainda esta noite.
* Em atualização
- Texto: Expresso, jornal parceiro do POSTAL