– Eu? Motas? Credo, nem pensar. É muito perigoso e além disso detesto levar com o vento. – diz uma das minhas amigas.
– É mesmo. – apoia outra – Há lá alguma coisa que se compare ao conforto de um carro de janelas fechadas e ar condicionado ligado?
Olho para as duas sem contestar. Comparo a amizade a uma daquelas poções mágicas que não sabemos bem como funcionam mas que funcionam na perfeição. Percebo que só me resta mesmo não refutar tais opiniões, até porque não saberia explicar-lhes uma bênção para a qual nem todos estão preparados.
Lembrei-me desta conversa hoje, enquanto saboreava as curvas e o ameno ar fresco do Inverno algarvio. Tinha deixado o almoço no prato e apanhado impulsivamente as luvas, o capacete e a chave. “Mas isto pode lá ser? Tanto tempo sem a montar? Será que estou a ficar parecida com elas e a valorizar mais o conforto estanque do que o tempero da vida?”
Fui acariciando sem pressas as curvas do sotavento interior, à espera que o apetite para o abandonado almoço chegasse; fui agradecendo o céu azul, a temperatura amena e as quase deslumbrantes paisagens. E quando voltei para casa, para dar seguimento ao meu dia, concluí que vinha, como sempre, muito mais rica, forte e inspirada, o que, ou muito me engano ou nunca um carro de janelas fechadas e ar condicionado ligado poderá vir a dar-me.