Bem sei que são questões controversas. Por um lado, o computador dá acesso a conteúdos de qualidade, atualizados em tempo real, mas por outro lado, também dá acesso a conteúdo pobres que só distraem o aluno durante a aula. No entanto, a ideia de conciliar as duas ferramentas de estudo, implementada por alguns professores, parece funcionar bem como recurso pedagógico: imagens, vídeos e programas interativos atraem a atenção dos alunos e motivam-nos a aprender. Softwares e aplicativos permitem que os professores façam uma avaliação quase instantânea. Mas a questão mantém-se: deverão os alunos trocar o caderno e o manual pelo computador?
O assunto divide opiniões. Alguns pais, alunos e professores são a favor da mudança, outros contra e outros ainda, por via das dúvidas, defendem a complementaridade de recursos. Quem ganhará o debate? O tempo o dirá. Mas, entretanto, nada nos impede de explorar alguns tópicos sobre o uso da tecnologia em sala de aula.
Boa relação custo-benefício?
É verdade que os equipamentos eletrónicos são mais caros que os livros, mas também é verdade que os alunos (atrevo-me a dizer todos os alunos do ensino secundário e universitário) já têm smartphone e computador. Por isso, a relação custo-benefício pode ser satisfatória, se considerarmos o facto de que os pais compram esses dispositivos aos filhos para outras finalidades e independentemente da despesa anual com material escolar (com cadernos e livros de atividades e retirando da equação os manuais adotados que são grátis até ao 12º ano). Porém, como não considerar os alunos mais desfavorecidos que recentemente foram alvo de atenção por não terem equipamentos ou rede de acesso à Internet, para acompanharem às aulas online durante os sucessivos confinamentos?
Inclusão de diferentes tipos de alunos?
Muito se defende a tecnologia como fator de inclusão, já que é possível utilizá-la na sala de aula (online e offline) para incluir todo o tipo de alunos com necessidades especiais. Mas isso remete-nos de novo ao tópico anterior: e os alunos mais desfavorecidos? Teriam apoios atempados por parte do Estado? Enquanto aguardamos pela resposta, continuamos a viver num mundo de diferenças sociais, com uma separação de classes que determina quem são os alunos que podem ter acesso a equipamentos mais caros.
Peso a menos na mochila?
Se alunos e encarregados de educação se queixam-se amiúde do peso das mochilas, porque é que este argumento não tem força na discussão sobre o uso da tecnologia na sala de aula? A adoção de livros digitais, aos quais os jovens podem aceder rápida e facilmente pelo smartphone, tablet ou PC, reduzia a carga (superior à recomendada pelos médicos) que trazem às costas, com cadernos, manuais, livros de atividades, estojos…
Aulas mais interessantes e dinâmicas?
Será que o dinamismo e interesse de uma aula depende única e exclusivamente do professor e do perfil dos alunos? Ou será que também depende dos recursos de ensino? Efetivamente, como estão habituados a usar dispositivos tecnológicos, os alunos podem sentir-se mais desmotivados em aulas expositivas com recurso exclusivo a livros impressos. Mas será que o entusiasmo em usar o smartphone e computador na sala de aula seria sinónimo de atenção e resultaria numa melhoria dos resultados escolares?
Prevenção de problemas oculares?
Dentro da corrente contrária à utilização de computadores na sala de aula, ouve-se de tudo, inclusive que o computador faz mal à vista. Será verdade? Ou o computador em si não prejudica a visão das crianças e jovens e é a exposição prolongada a ecrãs que pode ter efeitos negativos? A maioria dos aparelhos eletrónicos emite uma luz azul, sim, mas só pode ser prejudicial para a saúde ocular se não existirem filtros protetores.
Maior conforto e comodidade?
Pais e professores podem não estar de acordo, mas a verdade é que os alunos são unanimes: sentem-se bastante confortáveis a ler através de ecrãs e não dão sinais de cansaço, ao contrário de pessoas mais velhas que preferem livros impressos, mesmo existindo e-books que simulam o papel branco dos livros e a diagramação dos textos.
Mais opções de escolha?
Se procurarmos na Internet, o que não faltam são e-books e áudio-books, mas quanto a manuais escolares digitais, pode haver alguma dificuldade em encontrá-los. Logo à partida porque as editoras (por questões económicas) não os disponibilizam em versão digital, mas existem outros motivos que fazem com que ainda seja mais fácil encontrar um manual escolar em papel. Ainda…
O manual convencional traz resultados mais eficazes?
Alguns estudos indicam que os métodos tradicionais, como a utilização do caderno e manual escolar, são mais eficientes. Por exemplo, Pam A. Mueller e Daniel M. Oppenheimer, pesquisadores das universidades de Princeton e da Califórnia, respetivamente, fizeram um estudo intitulado “The Pen Is Mightier Than the Keyboard: Advantages of Longhand Over Laptop Note Taking”. Nesse estudo, publicado pela primeira vez em 2014, chegaram à conclusão de que os alunos que tiravam apontamentos no computador conseguiam transcrever quase todo o conteúdo da aula, enquanto que os alunos que tiravam apontamentos à mão, para o caderno, só escreviam os excertos mais relevantes. Porém, eram os segundos que tiravam melhores notas! Porquê? O uso dos computadores prejudica a memória? Tirar apontamentos à mão favorece a atenção? A verdade é esta: o mais importante não é o meio usado para tirar apontamentos, mas sim a atenção prestada e a forma como se tiram os apontamentos em sala de aula!
Os computadores podem substituir os cadernos e os manuais escolares?
Poder podem, mas o ideal é que se complementem. Já dizia Bill Gates, fundador da Microsoft, a respeito da questão “computadores ou livros”, que os primeiros não substituem os segundos: “É claro que os meus filhos terão computadores, mas antes terão livros”. Os livros em geral e os manuais e cadernos escolares, em particular, continuam a potenciar a aprendizagem. O seu uso continua a ser didático e eficaz, mas as novas tecnologias também têm e terão cada vez mais, um papel dinâmico na aprendizagem.
Sobre o autor:
• Luís Horta, professor de Informática no Agrupamento de Escolas João de Deus
• Autor do website institucional www.aejdfaro.pt e responsável pela comunicação externa do Agrupamento.
• 27 anos de experiência como docente no Ensino Secundário
• 5 anos de experiência como docente no Ensino Superior
• Mais de 1000 horas de formação de adultos
• Sócio-gerente da Webfarus Marketing Digital (www.webfarus.com)
• Ex-aluno da UAlg (Licenciatura e Mestrado).