O isolamento social dos jovens continua a ser um fenómeno crescente que merece atenção, pois passam longos períodos nos seus quartos e preocupa pais e cuidadores. Se um tempo de privacidade e introspecção é saudável e até mesmo necessário para o desenvolvimento pessoal, o comportamento persistente de isolamento pode ser indicativo de características próprias ou de problemas subjacentes que necessitam de cuidado.
Os acontecimentos dos últimos anos e os novos hábitos de convivência, com a proliferação das redes sociais e dispositivos eletrónicos, têm alterado significativamente os relacionamentos e acentuado a solidão em muitas populações. Embora as ligações virtuais tenham os seus benefícios, também podem levar ao isolamento físico. A procura da validação online muitas vezes substitui as interações pessoais, estando a sociedade preocupada com os riscos para a saúde mental e física associados a esses novos movimentos.
Ambientes familiares disfuncionais, mudanças escolares ou eventos traumáticos podem contribuir para o isolamento
Estar só não significa, necessariamente, que a pessoa é solitária ou que está a enfrentar um problema de solidão. Muitas pessoas ficam muito bem com a sua própria companhia. Quando o jovem se isola, pode ser um sinal expectável de alguém que está a crescer e que necessita de estar consigo próprio, ou poderá ser um sinal de alerta, um sinal de que algo não está bem.
Neste “estar sozinho” a pessoa poderá manter conexões, estar ligada ao que está a acontecer em seu redor e interagir de forma saudável com os outros. Estar só é diferente de estar solitário. Há uma linha ténue que separa entre o estar só saudável, para crescer, para pensar e o estar só não saudável, que leva a um isolamento preocupante.
O estar só poderá estar relacionado com novos interesses e preferências mais solitárias, como jogos, leitura, escrita, ou outras formas de entretenimento que possam ser facilmente realizadas no conforto do seu quarto.
A música de Rui Veloso “Não há Estrelas no Céu” transmite o sentir do jovem: “…por mais amigos que tenha, sinto-me sempre sozinho”. E neste sentir-se sozinho, o jovem poderá estar bem, mas há que estar atento, pois pode também refletir problemas significativos com efeitos sérios na sua saúde mental.
Os jovens sentem pressões sociais intensas, com grande necessidade de se encaixarem, de obter sucesso académico e de construir relacionamentos. As expectativas criadas podem ser avassaladoras, levando alguns a afastarem-se de pessoas para evitar julgamentos.
Ambientes familiares disfuncionais, mudanças escolares ou eventos traumáticos podem contribuir para o isolamento. Quando se sentem deslocados ou incompreendidos, poderão retrair-se para proteger as suas emoções, sendo o isolamento social uma resposta para lidar com sentimentos novos com os quais o jovem não sabe lidar, e poderão gerar situações preocupantes associadas à saúde mental, como ansiedade, depressão e baixa autoestima. Frequentemente, ao sentir que não consegue lidar com determinados acontecimentos a opção é o evitamento social, tentando escapar às pressões externas e evitando conflitos interpessoais que o façam sentir ainda mais desconfortável. Na realidade, estes tornam-se comportamentos de sobrevivência pois são a fórmula encontrada para ir à procura das suas estrelas no céu.
Se sente falta de apoio social, qualquer um desses problemas será vivido com maior intensidade, criando um ciclo negativo de comportamentos menos desejáveis.
O dilema na família é decidir quando e como pode ajudar, intrometendo-se sem se intrometer.
Em geral, a família quer que o jovem se sinta conectado com os seus pares, que tenha uma rede de apoio social, que se sinta bem consigo próprio. Como lidar com um filho que sente que está em sofrimento interno?
Converse, abra o diálogo, sem julgamentos, mostre interesse genuíno pelos seus gostos, preocupações e sentimentos. Tente entender o que ele sente e evite termos como o “tens …, deverias… faz isto...”. O diálogo aberto nem sempre é simples pois, no sentido de proteccionismo, o pai, a mãe ou outro gostam de “opinar” a experiência pessoal, o conhecimento, o que nem sempre é o que o jovem precisa ou quer ouvir.
Nesta comunicação empática é importante estabelecer limites saudáveis e claros em relação ao tempo passado no quarto. É importante incentivar à participação em atividades familiares e sociais, como o jantar, o jogar ou o ver um programa televisivo em família.
Incentive o seu filho a participar em atividades extracurriculares, clubes ou grupos de interesse que possam ajudá-lo a conectar-se com os seus pares e desenvolver competências sociais.
Se suspeitar que está perante um problema de saúde mental, como depressão ou ansiedade, consulte um profissional. Um psicólogo, com certeza, irá indicar-lhe se se trata de uma situação preocupante ou de apenas um comportamento expectável. Uma conversa com o psicólogo da escola ou o seu médico de família poderá ajudar a tomar uma boa decisão. Se necessário, avance para acompanhamento, individual ou familiar, para ajudar o seu filho a desenvolver estratégias saudáveis para lidar com as suas emoções e com os seus conflitos internos.
Na família, é importante promover um ambiente de compreensão e de apoio mútuo. Os filhos têm de saber que a família está lá, para os ajudar a enfrentar desafios e dificuldades.
Lidar com o comportamento de isolamento de um filho é um desafio complexo, que exige esforços coordenados e uma abordagem com empatia, compreensão e muita paciência. Ao reconhecer as causas subjacentes e proporcionando o apoio adequado, com certeza que ajudará o seu filho a encontrar um equilíbrio saudável entre o tempo de privacidade e a participação social, promovendo o seu bem-estar emocional e o seu desenvolvimento pessoal. Um filho que não sai do quarto, tendo 5, 14 ou 24 anos, é sempre uma grande preocupação e um grande desafio. Todos juntos podem superar o isolamento e construir comunidades mais solidárias e saudáveis. Recorde “…ser jovem não é um posto, ter de encarar o futuro… porque é que tudo é incerto…” (Rui Veloso).
Se tem dúvidas relativamente à qualidade e quantidade deste isolamento, não hesite em procurar ajuda, pergunte a quem sabe e consulte alguns dos links da Ordem dos Psicólogos Portugueses:
https://www.ordemdospsicologos.pt/ficheiros/documentos/doc_covid_19_como_lidar_com_a_tristeza.pdf
https://escolasaudavelmente.pt/pais/problemas-de-saude-psicologica/ansieda
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