A coleção Pela Sua Saúde – Ciência Alimentar, recém-criada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, põe-nos uma série de perguntas bem pesadas: o que devemos comer em cada etapa da vida, como controlar e equilibrar o peso e a carteira? Como favorecer a economia doméstica e reduzir a pegada ambiental? O móbil da coleção é o de contribuir para um melhor conhecimento alimentar e nutricional, assente em dados objetivos, credíveis e cientificamente robustos. Falemos então da grávida, da sua alimentação e até ao segundo ano da vida da criança, quem escreve o ensaio é Maria Ana Kadosh, investigadora na área da alimentação e nutrição maternoinfantil. Explica logo a importância deste período: “A nutrição e o estilo de vida e durante a gravidez, a lactação e a infância estão associados a efeitos a longo-prazo na saúde da criança, incluindo o risco de desenvolver doença não transmissíveis, como as doenças cardiovasculares, a diabetes e a obesidade.
As crianças, em particular, são vulneráveis aos fatores de risco que contribuem para as doenças não transmissíveis, nomeadamente hábitos alimentares pouco saudáveis, sedentarismo, exposição ao tabaco e ao álcool.” A autora é uma clara defensora da amamentação, como explica: “Duas revisões sistemáticas da literatura desenvolvidas pela Organização Mundial da Saúde em 2007 e 2013 examinaram os efeitos a longo-prazo da amamentação e verificaram que a sua prática estava associada a menores níveis de pressão arterial, bem como a um efeito protetor ao nível do colesterol sérico, do excesso de peso, da obesidade e da diabetes mellitus tipo 2. A amamentação foi ainda associada a uma melhor performance intelectual. A obesidade, em particular, é um problema de saúde pública e as crianças com excesso de peso ou obesidade são as mais propensas a tornarem-se adultos obesos.”
Descreve sumariamente o período da gravidez e as necessidades nutricionais que se justapõem, uma informação seguramente muito útil para a grávida que encontra para os sucessivos trimestres uma tabela sobre as necessidades energéticas, percorrem-se proteínas, hidratos de carbono, gorduras, micronutrientes, releva-se a importância de suplementar a mulher grávida com ácido fólico, ferro e iodo, sem esquecer os suplementos alimentares com vitaminas e minerais, não deixando de alertar para as regras de segurança alimentar, já que durante este período da vida aumentam as suscetibilidades a determinados microrganismos patogénicos.
Dá enorme destaque ao papel da alimentação, recorda que a OMS a recomenda em exclusividade nos primeiros 6 meses de vida e em complemento até aos 2 anos de idade, para que haja um crescimento e um desenvolvimento saudável. Invoca os múltiplos benefícios tanto para a mãe como para o bebé: “Para a mãe, o aleitamento materno promove uma involução uterina mais precoce, associa-se a um menor índice de massa corporal, menor incidência de cancro da mama, menor risco de endometriose, podendo ainda ajudar a atrasar uma nova gravidez; para o bebé, está associado a um menor risco de infeções respiratórias e gastrointestinais, de otite média aguda, um menor risco de hospitalização e um maior quociente de inteligência.
As crianças que são amamentadas exclusivamente durante os primeiros 6 meses de vida são menos propensas a ter excesso de peso mais tarde.” E dá-nos um quadro dos benefícios do leite humano: “É um alimento vivo, completo e natural, adaptado a quase todos os recém-nascidos, salvo raras exceções. Tem compostos bioativos que lhe conferem características únicas e inimitáveis, bem como benefícios imunológicos, endocrinológicos, neuronais e psicológicos para a criança.” Detalha em termos nutricionais toda esta gama de vantagens e, igualmente, procede a um quadro esclarecedor sobre os problemas da mamada e, por último, em que deve constituir a alimentação da mãe.
Explicada esta evolução de comportamentos e a tabela de benefícios, põe em questão a diversificação alimentar da criança, quando e como iniciar, é assunto de peso pois remete-nos para o regime alimentar da família. “Aos 12 meses de idade, chegou finalmente a altura de integrar a criança na dieta familiar. É fundamental que os pais e cuidadores tenham consciência de que as crianças aprendem a comer por imitação, vendo o que o seu agregado familiar come em casa, bem como o que os amigos e educadores comem na creche”; a matéria é cuidadosamente tratada.
Em termos de conclusão, a autora recorda: “Os fatores ambientais a que somos expostos em períodos críticos do nosso desenvolvimento, como a alimentação e a nutrição, programam o desenvolvimento, o metabolismo e a saúde e têm efeito a longo prazo, mais concretamente no risco de desenvolvimento de doenças não transmissíveis. Durante a fase da gestação, a grávida deve manter um ganho de peso adequado ao seu índica de massa corporal pré-gestacional e, para isso, é fundamental que adote uma alimentação completa, variada e equilibrada, que vá ao encontro das suas necessidades energéticas e nutricionais, bem como das suas preferências e hábitos alimentares. O leite materno é a melhor forma de alimentar as crianças nos primeiros meses de vida.
A partir dos 6 meses de idade, o leite materno (ou a fórmula infantil) não é suficiente para suprir as necessidades do lactente em energia e alguns nutrientes, como o ferro. A diversificação alimentar não deve ser começada nunca antes dos 4 meses e 1 semana, deve ser adaptada às necessidades energéticas e nutricionais de cada criança, bem como aos aspetos relacionados com a tradição e a cultura da família. O treino de novos sabores e novas texturas, progressivamente menos homogéneas, até à inserção na dieta familiar aos 12 meses, é fundamental e determinante para o estabelecimento de hábitos alimentares saudáveis.” E em jeito de despedida: “Ensinar hábitos alimentares saudáveis e sustentáveis para a vida é um desafio constante, repleto de muitas alegrias, mas também de muitas angústias. O caminho nem sempre é fácil e linear. Faz-se com paciência e com amor, dois ingredientes que, a par da evidência científica, acredito ser o segredo para um crescimento saudável e feliz.”